domingo, 9 de setembro de 2012

Ao censurar os magistrados a im­prensa busca o efeito desejado por ela.


Nilo Batista lembra a “atitude pública” que a imprensa se atribui, muitas vezes camuflando “afinidades políticas”, como é o caso de agora, ou “interesses econômicos”. Ele cita um julga­mento, de 1951, nos Estados Unidos, que levou o juiz Jackson, da Corte Suprema (na qual os in­tegrantes se identificam orgulhosamente como juizes), a afirmar: certos julgamentos não passam “de uma cerimônia legal para averbar um veredicto já ditado pela imprensa e pela opinião pública que ela gerou”.

 “Mensalão”, julgamento justo? -  Por Mauricio Dias, da CartaCapital

Sob controle rígido, concentrado, de apenas quatro grupos empresariais, a mídia brasileira conservadora acre­dita ter força para erguer e destruir o que bem pretende. Esse núcleo res­trito, que sustenta um pensamento único, for­ma o que se chama de barões da mídia. Eles, no entanto, nem sempre conseguem impor os ob­jetivos que perseguem. Estas situações cabem direitinho dentro do princípio de que as regras comportam exceções.

Exceção, por exemplo, é a eleição e reeleição de Lula. E a regra? Ela está posta agora diante dos nossos olhos: a Ação Penal 470, chamada de “mensalão” para efeitos políticos, em julgamen­to no Supremo Tribunal Federal (STF).

Regra e exceção. Esta contraposição emer­giu em declaração do ministro Ricardo Lewandowski. Diante da reação negativa às revisões feitas no relatório do ministro Joaquim Barbo­sa, aplaudido pela mídia, ele desabafou:

 “Um juiz não pode ceder à opinião pública e nem à opinião publicada”.

O voto “dissidente” de Lewandowski surpre­endeu, para repetir o verbo usado na manche­te do jornal O Globo. O revisor absolveu alguns réus. Por não ter condenado todos entrou na li­nha de fogo. Foi intimidado por um comentaris­ta político, para o qual telefonou de boa-fé com a finalidade de explicar o que considerou distor­ções na análise feita em torno do voto dele. Dias Toffoli, que acompanhou o revisor, também re­cebeu reprimenda de um colunista social.

A mídia, a exemplo do ministro Joaquim Barbosa, reage às divergências com a linha editorial que adota com a mesma ferocidade dos reis diante de crimes de “lesa-majestade”. Essa reação não é nova, nem é invenção bra­sileira. Por aqui, no entanto, às vezes a coisa torna-se grotesca.

Em parecer para processo em curso na Jus­tiça mineira, tirado da costela da Ação Penal 470, o advogado Nilo Batista, do primeiro time de criminalistas brasileiros, tocou nessa feri­da. Entre outros pontos, atacou o “linchamen­to moral” quando a acusação de suposto crime, amplificado pela mídia, provoca “devastadores efeitos sobre a imparcialidade do julgamento”.

Nilo Batista lembra a “atitude pública” que a imprensa se atribui, muitas vezes camuflando “afinidades políticas”, como é o caso de agora, ou “interesses econômicos”. Ele cita um julga­mento, de 1951, nos Estados Unidos, que levou o juiz Jackson, da Corte Suprema (na qual os in­tegrantes se identificam orgulhosamente como juizes), a afirmar: certos julgamentos não passam “de uma cerimônia legal para averbar um veredicto já ditado pela imprensa e pela opinião pública que ela gerou”.

O criminalista, professor-titular de Direito Penal da Universidade Fe­deral do Rio de Janeiro (UFRJ), ci­ta outro processo. Este anulado pela Corte Suprema em razão da campa­nha da mídia quando foi afirmado: “A publicidade do julgamento é uma garantia constitucional do acusado e não um direito do público”.

Ao censurar os magistrados a im­prensa busca o efeito desejado por ela.

A absolvição ou a condenação dos réus, entretanto, deve nascer de um julgamento justo, sem pressão ou interferência na liberdade de de­cisão dos juizes.

Paulo Cavalcanti

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