Nilo Batista lembra a “atitude pública” que a imprensa se atribui, muitas vezes camuflando “afinidades políticas”, como é o caso de agora, ou “interesses econômicos”. Ele cita um julgamento, de 1951, nos Estados Unidos, que levou o juiz Jackson, da Corte Suprema (na qual os integrantes se identificam orgulhosamente como juizes), a afirmar: certos julgamentos não passam “de uma cerimônia legal para averbar um veredicto já ditado pela imprensa e pela opinião pública que ela gerou”.
“Mensalão”, julgamento
justo? - Por Mauricio Dias, da
CartaCapital
Sob controle rígido, concentrado, de apenas quatro grupos
empresariais, a mídia brasileira conservadora acredita ter força para erguer e
destruir o que bem pretende. Esse núcleo restrito, que sustenta um pensamento
único, forma o que se chama de barões da mídia. Eles, no entanto, nem sempre
conseguem impor os objetivos que perseguem. Estas situações cabem direitinho
dentro do princípio de que as regras comportam exceções.
Exceção, por exemplo, é a eleição e reeleição de Lula. E a
regra? Ela está posta agora diante dos nossos olhos: a Ação Penal 470, chamada
de “mensalão” para efeitos políticos, em julgamento no Supremo Tribunal
Federal (STF).
Regra e exceção. Esta contraposição emergiu em declaração do
ministro Ricardo Lewandowski. Diante da reação negativa às revisões feitas no
relatório do ministro Joaquim Barbosa, aplaudido pela mídia, ele desabafou:
“Um juiz não pode
ceder à opinião pública e nem à opinião publicada”.
O voto “dissidente” de Lewandowski surpreendeu, para repetir
o verbo usado na manchete do jornal O Globo. O revisor absolveu alguns réus.
Por não ter condenado todos entrou na linha de fogo. Foi intimidado por um comentarista
político, para o qual telefonou de boa-fé com a finalidade de explicar o que
considerou distorções na análise feita em torno do voto dele. Dias Toffoli,
que acompanhou o revisor, também recebeu reprimenda de um colunista social.
A mídia, a exemplo do ministro Joaquim Barbosa, reage às
divergências com a linha editorial que adota com a mesma ferocidade dos reis
diante de crimes de “lesa-majestade”. Essa reação não é nova, nem é invenção
brasileira. Por aqui, no entanto, às vezes a coisa torna-se grotesca.
Em parecer para processo em curso na Justiça mineira, tirado
da costela da Ação Penal 470, o advogado Nilo Batista, do primeiro time de
criminalistas brasileiros, tocou nessa ferida. Entre outros pontos, atacou o
“linchamento moral” quando a acusação de suposto crime, amplificado pela
mídia, provoca “devastadores efeitos sobre a imparcialidade do julgamento”.
Nilo Batista lembra a
“atitude pública” que a imprensa se atribui, muitas vezes camuflando
“afinidades políticas”, como é o caso de agora, ou “interesses econômicos”. Ele
cita um julgamento, de 1951, nos Estados Unidos, que levou o juiz Jackson, da
Corte Suprema (na qual os integrantes se identificam orgulhosamente como
juizes), a afirmar: certos julgamentos não passam “de uma cerimônia legal para
averbar um veredicto já ditado pela imprensa e pela opinião pública que ela
gerou”.
O criminalista, professor-titular de Direito Penal da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), cita outro processo. Este
anulado pela Corte Suprema em razão da campanha da mídia quando foi afirmado:
“A publicidade do julgamento é uma garantia constitucional do acusado e não um
direito do público”.
Ao censurar os magistrados a imprensa busca o efeito
desejado por ela.
A absolvição ou a condenação dos réus, entretanto, deve
nascer de um julgamento justo, sem pressão ou interferência na liberdade de
decisão dos juizes.
Paulo Cavalcanti
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