Por Najla Passos e Vinicius Mansur, no sítio Carta Maior:
A alegada inconstitucionalidade da lei 12.232/2010, que
regulamenta a contratação de publicidade pelos órgãos públicos, é apenas um dos
aspectos que tem suscitado críticas à norma jurídica. Representantes dos
pequenos e médios veículos de comunicação alegam que a lei prejudica também a
pluralidade de vozes necessária à democracia, ao contribuir para a concentração
da verba publicitária nos grandes conglomerados de mídia. O bônus de volume,
que ela institucionaliza, é parte importante da polêmica.
O acórdão 2.062 do TCU já apontava, em 2006, a dificuldade de
controlar negociações envolvendo bonificações, uma vez que elas são de âmbito
privado. E observava também que o bônus “favorece a concentração das inserções
publicitárias em poucos veículos”. O diretor comercial da revista Caros Amigos,
Wagner Nabuco, concorda. “O BV só reforça o oligopólio da mídia”, afirma.
Segundo ele, no Brasil, a remuneração básica de uma agência
de publicidade decorre da comissão fixa de 20% (conhecida como desconto-padrão)
sobre o valor despendido na compra de espaços publicitário nos veículos de
comunicação; de comissão sobre serviços prestados por terceiros (produtoras de
vídeo, fotografia, eventos, etc); e do bônus de volume. “Somente as grandes
corporações tem capacidade de abrir mão de parcela expressiva das receitas de
publicidade e, em muitos casos, pagar o bônus às agências antes mesmo dos
anúncios serem veiculados”, acrescenta.
O diretor esclarece que existe também a possibilidade da
agência receber taxas fixas (fees) pelos serviços que presta. Caso, por
exemplo, das que atendem as Casas Bahia, cujo investimento em publicidade, em
2011, foi de R$ 3,37 bilhões, o maior do Brasil. Grandes anunciantes como as
Casas Bahia tem deixado de pagar o desconto-padrão de 20% para remunerar os
serviços por fees mensais ou anuais, em geral, muito abaixo dos valores obtidos
com o desconto-padrão. Na prática, estão impedindo que as agências faturem por
comissão duas vezes em cima do dinheiro do anunciante. Como consequência,
cresce a importância do BV no lucro do setor publicitário.
É difícil saber qual o peso exato de cada uma dessas
modalidades na receita das agências, visto que se trata de dados privados das
empresas. Fontes do mercado consultadas pela reportagem estimaram que,
atualmente, cerca de 60% ou 70% do faturamento das agências provenham do BV. A
Rede Globo é a maior pagadora do bônus e especula-se que, em 2010, tenha
repassado cerca de R$ 700 milhões às agências por meio deste mecanismo. A
Editora Abril, que possui o maior faturamento na mídia impressa, teria
desembolsado aproximadamente R$ 75 milhões.
Critérios técnicos?
Presidente da Associação dos Diários do Interior (ADI),
Margareth Codraiz Freire acredita que, mais do que o bônus de volume, o que
ocasiona a concentração de verba pública nos grandes veículos são os critério
adotados para distribuição da publicidade. “As agências até podem preferir
anunciar em poucos veículos para terem mais controle sobre o recebimento dos
bônus, mas a escolha final é do cliente”, avalia.
Segundo ela, desde o governo Lula, a Secretaria de
Comunicação (Secom) da Presidência, responsável pelo maior aporte de verbas
públicas em publicidade, aumentou de forma expressiva o número de veículos
aptos a dividir o bolo. Em 2000, eles eram 500. No ano passado, somaram 8.519,
dos quais 4.281 foram contemplados com contratos. Entretanto, o percentual que
chega aos jornais de pequeno e médio porte varia de 1% a 1,5% das receitas
deles. “Melhorou muito porque não recebíamos nada, mas grosso da publicidade
ainda fica com os grandes”, afirma ela.
A Secom não divulga quanto destina a cada órgão. Toda a
prestação de contas é feita por valores dispensados por campanhas. Mas na
página 42 do Relatório de Gestão 2011, há uma informação que ajuda a dar a
dimensão da concentração da mídia: “25 veículos e grupos de comunicação recebem
72% da publicidade do governo”. O órgão destaca que a distribuição é feita
seguindo critérios técnicos, como índice de audiência, no caso das TVs, e preço
por centímetro quadrado de publicidade, no caso dos impressos.
A lei 12.232 estabelece a opção pelos critérios técnicos. Diz
que as agências devem conduzir a escolha dos veículos em que vão anunciar “de
acordo com pesquisas e dados técnicos comprovados”, que assegurem as melhores
condições para falar com seu público. Nabuco, entretanto, questiona o sistema,
dada a ampla subjetividade da atividade publicitária. “A audiência do Jornal
Nacional permanece imbatível e o governo pode alegar isso para comprar espaço
da Globo. Mas se o critério for só este, o que o Estado fará pelas garantias
constitucionais de pluralidade de vozes, diversidade, fortalecimento da cultura
regional?”, indaga.
Margareth endossa. Segundo ela, no interior, são fartos os
casos de jornais regionais que adquirem muito mais peso perante a opinião
pública e até tiragens superiores as dos nacionais. Entretanto, ainda assim, o
preço da publicidade costuma ser bem mais baixo.
O diretor da revista ainda questiona a legalidade de se obter
BV com dinheiro público. “A verba é para divulgar determinada ação ou campanha
e não para ir para o bolso da agência. Se o veículo retornou dinheiro, a
agência não deveria reter, deveria voltar aos cofres públicos”, aponta.
Postado por Miro
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