Há crise, mas indústria não está indo embora
Paul Singer
Quem, como a maioria dos adultos, viveu a maior parte de sua
vida no século 20 aprendeu que industrialização significava progresso.
Éramos um país atrasado porque vivíamos da exportação de
produtos da agricultura tropical. Com a receita dessa exportação, pagávamos
produtos industriais importados.
Desenvolvimento era sinônimo de industrialização, pois os
países que a lograram eram mais ricos, melhor educados e modelos culturais para
os outros, que se desenvolviam mediante a substituição das manufaturas
importadas por produtos nacionais.
A grande virada se deu a partir dos anos 1980 com a
liberalização do comércio e da movimentação internacional de capitais à caça de
superlucros em países dotados de mão-de-obra escolarizada, mas
inacreditavelmente barata quando comparada com a força de trabalho nos países
do Primeiro Mundo.
Começou então a transferência maciça de plantas industriais
dos Estados Unidos e da Europa para os países "emergentes" da Ásia e
da América Latina. O transplante industrial levou progresso para os países em
industrialização acelerada, mas os grandes ganhadores foram os capitalistas do
Primeiro Mundo e seus sócios nos países "emergentes", que passaram a
crescer aceleradamente. As grandes vítimas dessa desindustrialização nos países
desenvolvidos foram os trabalhadores que perderam empregos e empobreceram nos
cinturões da ferrugem. Seus sindicatos perderam membros e foram obrigados a
abrir mão de conquistas para evitar o translado das fábricas restantes.
Como é óbvio, nada disso acontece no Brasil.
A grande dificuldade da indústria está na contração dos
mercados mundiais em função da recessão nos países da periferia europeia, que
estão sendo obrigados a se autoarruinar com políticas de austeridade que punem
exclusivamente os pobres, mediante cortes de salários e postos de trabalho no
Estado.
Embora o centro da crise esteja na Europa, suas repercussões
estão agora atingindo os emergentes até há pouco poupados.
Nada disso acontece no Brasil: a indústria não está se
mudando para outros países, pelo que se sabe. A nossa economia cresce pouco por
causa da recessão que se aprofunda na Europa e que faz com que a economia
mundial se contraia. Recentemente, o "The New York Times" noticiou
que "após três décadas de crescimento intensivo, a China está diante de um
problema com o qual não está acostumada em sua economia: um acúmulo enorme de
mercadorias não vendidas. O excedente de tudo, desde aço e eletrodomésticos até
carros e apartamentos, está dificultando os esforços da China para emergir duma
desaceleração econômica aguda".
Sendo a China nosso maior parceiro comercial, é inevitável
que sua crise também nos atinja. O mesmo aconteceu à Argentina, cujas exportações
caíram, o que afeta o Mercosul como um todo, onde a indústria brasileira vendia
parte de sua produção.
Ainda bem que nossa indústria conta com um farto mercado
interno, que está sendo estimulado por diversas políticas do governo.
A queda dos juros e em breve também do custo da energia
elétrica eleva o poder competitivo das empresas. O recente aumento das taxas
aduaneiras de cem produtos importados, cuja concorrência ameaçava a existência
de importantes ramos da indústria, e um aumento da proteção contra a importação
de outra centena de produtos industriais já está programada para outubro.
Em suma, a indústria se encontra em crise contra a qual o
governo toma medidas que devem levar a sua superação.
PAUL SINGER, 80, é economista e secretário nacional de Economia
Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego
Nenhum comentário:
Postar um comentário