domingo, 9 de setembro de 2012

In dubio pro reo

A vida apareceu - Janio de Freitas

Superada a excitação em torno do que seria o voto de despedida de Cezar Peluso -se abrangente, ou não, de todos os réus do mensalão- já está em campo outra charada.

Talvez um artifício involuntário dos que precisam acompanhar a insipidez do julgamento, mas não aguentam, sem algum desvio inocente, o tédio de tanto "voto eminente" e "brilho de Vossa Excelência".

"E se houver empate, agora que a aposentadoria de Peluso reduziu o time dos julgadores a dez?"

O condutor do julgamento e presidente do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto, dá uma resposta original: "É uma pergunta sem resposta".

Poderia dizer que uma das respostas cabíveis é o desempate com o chamado voto de minerva, dado por ele mesmo. Solução que ficaria muito bem na maneira como o julgamento transcorreu até ontem, aceitas várias práticas inesperadas.

Pela primeira vez, ontem, as circunstâncias vividas por um réu, na conduta de que é acusado, foram consideradas com a devida importância na apreciação dos fatos e no voto de um ministro, para condenação ou absolvição.

Embora composto por magistrados sempre prontos a expor seu lado humano (nem sempre de modo apreciável), se sensibilizada a sua vaidade, o julgamento mais parece ocupar-se de réus mecânicos, todos robôs da patifaria.

O risco resultante dessa característica do julgamento não recai apenas sobre os réus, na eventualidade de menor compreensão dos fatos e das culpas ou inocências.

A variação dos discursos jurídicos não isenta também os magistrados de se mecanizarem eles próprios, de se robotizarem, no seu poder de ignorar a vida e conceber seres-objetos.

No primeiro dos votos pela absolvição de Ayanna Tenório, (ex-)funcionária do Banco Rural, o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, valorizou tanto os fatos quanto as circunstâncias que a acusada viveu neles. Não o fez por acaso, mas com intenção declarada. A vida se imiscuiu no julgamento.

Um ser-objeto virou uma pessoa, assim reconhecida também, pouco depois, pela ministra Rosa Weber. Ainda que a absolvição carregasse uma ressalva, cuja oportunidade excedeu o voto: "In dubio pro reo", lembrou a ministra para justificar-se de não encontrar motivos seguros de condenação.

Na justificativa de Rosa Weber estava a resposta adequada para o desempate de votos, em um tribunal não robotizado em sentido algum. O empate retrata um tribunal posto em dúvida, e um princípio de Justiça que os milênios não negaram é este: "In dubio pro reo".

O empate tem resposta, sim, pelos juízes que não a receiem.

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