*Por Gregory Elich
As relações entre os
Estados Unidos e a Coreia do Norte chegaram a um nadir e na maioria dos
noticiários ocidentais é a aparente irracionalidade da dura retórica emanando
de Coreia do Norte a culpada de tudo. Inexplicavelmente, assim somos
informados, a Coreia do Norte escolheu elevar a tensão.
O que está faltando
nessa imagem de comportamento norte-coreano hostil e de vítima inocente
estadunidense é o contexto. Como é
frequente, a mídia apresenta os fatos de maneira isolada como se estes
surgissem do nada e sem causa.
Não é preciso
retroceder muito no tempo para discernir o que está preocupando a Coreia do
Norte. Nos últimos meses, o governo Obama tomou uma série de medidas que a RDPC
(República Popular Democrática da Coreia, o nome oficial da Coreia do Norte),
tem percebido como ameaças.
A primeira medida na
direção de uma piora das relações veio em outubro de 2012, quando os Estados
Unidos concederam uma isenção à Coreia do Sul no âmbito do Regime de Controle
de Tecnologia de Mísseis, permitindo a esta estender o alcance de seus mísseis
balísticos, que passariam assim a cobrir todo o território da Coreia do
Norte. i Em decorrência dessa isenção
passou a haver um conjunto de termos aplicáveis a todas as nações signatárias
do tratado e outro conjunto diferente, aplicável apenas à Coreia do Sul, cujo
claro propósito é manter sob mira alvos no país vizinho.
No mesmo mês, oficiais
militares dos Estados Unidos e da Coreia do Sul encontraram-se para sua Reunião
Consultiva de Segurança anual, onde acordaram amplas mudanças em sua aliança. A
mais importante destas diz respeito ao plano denominado de “dissuasão sob
medida” (tailored deterrence), que preconiza operações militares conjuntas
entre os Estados Unidos e a Coreia do Sul contra a Coreia do Norte em um
sem-número de cenários, incluindo incidentes menores. Qualquer “provocação” da
Coreia do Norte deve ser respondida com força desproporcional e, de acordo com
um oficial militar sul-coreano, “essa estratégia será aplicada tanto em tempos
de paz quanto de guerra”.
Um componente essencial
da dissuasão sob medida é a “cadeia de destruição” (kill chain) usada para
detectar e atacar bases de mísseis norte-coreanos, em que satélites e aviões
não tripulados estadunidenses detectam alvos para que mísseis sul-coreanos e
aviões de guerra os destruam. O plano prevê um ataque preventivo baseado na
percepção de um lançamento iminente de mísseis norte-coreanos. O Subcomandante
do Comando das Nações Unidas para a Coreia, General Jan-Marc Jouas, explica que
os mísseis norte-coreanos podem rapidamente tornar-se alvos “antes de estarem
prontos para lançamento”. Ou seja, objetivamente, poder-se-ia lançar um ataque
contra mísseis norte-coreanos com base apenas em suposições, mesmo quando tais
mísseis não estejam em posição de disparo.
No dia 12 de dezembro
de 2012 a RDPC lançou um satélite de observação terrestre em órbita, provocando
uma condenação do governo Obama que acusava o voo de ser um teste de míssil
balístico disfarçado. Resoluções das Nações Unidas proíbem a Coreia do Norte de
testar mísseis balísticos, mas Pyongyang argumenta que o envio de um satélite
ao espaço não é o mesmo que testar mísseis balísticos. Especialistas em
tecnologia de mísseis tendem a concordar com isso, apontando para o fato de que
o míssil lançado pela RDPC não apresentava um desempenho que o permitisse
servir como MBIC (míssil balístico intercontinental) e que seu curso fez uma
mudança brusca de direção para evitar um sobrevoo sobre Taiwan e as Filipinas,
uma ação contraproducente para um teste de míssil balístico.
Navios de Guerra da
Coreia do Sul conseguiram resgatar destroços do míssil norte-coreano e as
análises mostraram que um pequeno motor com um empuxo de 13–14 toneladas
propelia o segundo estágio. Em seu
relatório, o engenheiro aeroespacial Marcus Schiller, de Munique, afirma que um
segundo estágio com baixo empuxo e longo tempo de queima, tal como usado pelos
norte-coreanos, é precisamente o projeto requerido para um lançador de satélite.
Esse projeto é necessário para permitir atingir altitude suficiente para
colocar um satélite em órbita. No
entanto, tal projeto é inapropriado para um teste de míssil balístico, já que
este teria um alcance de mais de mil quilômetros. Para testar um míssil
balístico, o segundo estágio deveria ter um projeto oposto, com alto empuxo e
baixo tempo de queima. Schiller conclui dizendo que as notícias da mídia
ocidental de que o lançamento do satélite norte-coreano serviu como teste de
míssil balístico “não são verdadeiras”.
Michael Elleman,
analista de segurança do Instituto Internacional para Estudos Estratégicos,
observa que os resultados de um lançamento de satélite “têm limitada aplicação
a mísseis balísticos”, uma vez que apenas uma fração dos procedimentos e itens
pode ser testada. “Outros requisitos, notadamente tecnologias de reentrada e
requisitos de flexibilidade operacional, não podem ser devidamente resolvidos
com lançamentos de satélites”. Elleman diz em seu relatório que, por essas e outras
razões, os lançamentos de satélites por mísseis da Coreia do Norte “não são um
substituto para um teste de míssil balístico”.
Curiosamente, no mesmo
dia em que a Coreia do Norte levou seu satélite ao espaço, a Índia, outra
potência nuclear, efetuou um teste de míssil balístico sem que autoridades
estadunidenses emitissem uma reclamação. Os Estados Unidos não têm carência de
engenheiros aeroespaciais e as autoridades estadunidenses estavam certamente
cientes de que o lançamento do satélite norte-coreano não poderia ser
tecnologicamente interpretado como um teste de míssil balístico disfarçado.
Parece que o governo Obama deliberadamente escolheu falsear a verdadeira
natureza do lançamento visando seus próprios interesses políticos.
O lançamento do
satélite proporcionou ao governo Obama a oportunidade de apertar o cerco em
torno da Coreia do Norte e, após extensas negociações, forçar uma resolução do
Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Como a porta-voz do Departamento de Estado dos EUA Victoria Nuland explicou,
a intenção do governo Obama era “continuar a aumentar a pressão contra o regime
norte-coreano. E estamos examinando como melhor fazê-lo, tanto bilateralmente
como com nossos parceiros tomando à dianteira. Até que eles entendam a
mensagem, teremos que continuar a isolar cada vez mais esse regime”.
Com a aprovação da
Resolução 2087 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, datada de 22 de
janeiro de 2013, novas sanções foram impostas à Coreia do Norte a despeito do
fato de que o tratado internacional do espaço exterior dá o direito de
exploração do espaço a “todos os estados sem qualquer tipo de discriminação”.
A Coreia do Norte
reagiu com raiva ao ser eleita como a única nação na terra a ter o direito de
lançar um satélite negado. A RDPC não se sentiu inclinada a aquiescer ante a
imposição de sanções adicionais em um momento em que sua economia já se
recuperava das sanções existentes. Um porta-voz do Ministério do Exterior da
RDPC salientou que ao forçarem a aprovação da resolução pelo Conselho de
Segurança os Estados Unidos violaram a Carta das Nações Unidas, que declara que
“a Organização está baseada no princípio da igualdade soberana de todos os seus
Membros”.
Falando nas Nações
Unidas, o delegado da RDPC So Se Pyong declarou que “Não havia menos de dois
mil testes nucleares e ao menos nove mil lançamentos de satélites no mundo
desde que a ONU passara a existir, mas jamais houvera uma única resolução de
seu Conselho de Segurança que banisse os testes nucleares e o lançamento de
satélites”. Acrescentando que os Estados Unidos haviam conduzido mais testes
nucleares e lançamentos de satélites do que qualquer outra nação, o delegado
disse que os Estados Unidos não deveriam ter permissão para impedir que a
Coreia do Norte exercitasse seu direito “de usar o espaço para fins pacíficos”,
nem para usar as Nações Unidas “como instrumento para executar sua política de
hostilidade contra a RDPC”.
Para surpresa de
ninguém, a Coreia do Norte optou por expressar sua resistência à agressividade
da política estadunidense dos Estados Unidos conduzindo seu terceiro teste
nuclear em 12 de fevereiro de 2013. Vários dias mais tarde, em aparente
referência ao Iraque e à Líbia, a mídia norte-coreana relembrou os destinos que
se abateram sobre aquelas nações que haviam abandonado sues programas nucleares
em resposta a pressões dos Estados Unidos. Esses exemplos, continuou, “ensinam
a verdade que a chantagem nuclear dos Estados Unidos deveria ser combatida com
contramedidas substanciais, não pelo compromisso ou retirada”.
Um dia depois de o
teste nuclear, o Ministro da Defesa da Coreia do Sul anunciou que o país
dispunha de mísseis de longo alcance (cruise) capazes de atingir qualquer ponto
da Coreia do Norte e que seria acelerado o desenvolvimento de mísseis
balísticos de alcance semelhante. E, ainda, que a implementação da cadeia de
destruição seria agilizada. Com conclusão originalmente prevista para 2015, a
cadeia de destruição foi antecipada e está para ser implantada até o final
deste ano.
Enquanto as discussões
transcorriam no Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a imposição de
sanções adicionais à Coreia do Norte, a União Europeia avançava com seu próprio
conjunto de medidas, entre elas a proibição de comerciar com entidades públicas
norte-coreanas e de negociar títulos públicos da RDPC. Além disso, a UE também
proibiu a abertura de bancos europeus na RDPC e o estabelecimento de filiais de
bancos norte-coreanos na União Europeia.
As negociações sobre
uma resolução do Conselho de Segurança da ONU em resposta ao teste nuclear da
Coreia do Norte levaram mais de três semanas. O maior contencioso foi quanto à
inclusão ou não do Artigo 42 do Capítulo 7, que teria autorizado o uso de força
militar para fazer cumprir as sanções. Tanto os Estados Unidos quanto a Coreia
do Sul argumentaram com veemência a favor de sua inclusão. Outra questão
difícil foi a inspeção de navios cargueiros norte-coreanos, com longas
discussões se seguindo antes que os Estados Unidos e a China chegassem a um
acordo sobre a amplitude das inspeções.
Os chineses
recusavam-se a concordar com o uso de força militar para fazer cumprir as
sanções, acertadamente temendo que isso pudesse aumentar o risco de uma guerra.
Nem tampouco aceitavam respaldar as medidas mais duras que os Estados Unidos
haviam incluído em sua lista de exigências na versão preliminar do documento.
O uso de força militar
para fazer cumprir as sanções teria sido particularmente perigoso, devido à
história de como o Artigo 42 tinha servido de pretexto para os Estados Unidos
declararem guerra.
Embora os Estados
Unidos não tenham conseguido tudo o que queriam, a aprovação da Resolução 2094
do Conselho de Segurança da ONU, em 7 de março de 2013, viu a consecução de
muitos dos objetivos por eles defendidos. A resolução requer de todas as nações
que inspecionem navios e aviões norte-coreanos suspeitos de estarem carregando
produtos proibidos. Fortes restrições foram aplicadas às operações bancárias
norte-coreanas. As nações receberam ordem de impedir que indivíduos
norte-coreanos transfiram dinheiro em espécie, inclusive o corpo diplomático,
que está sujeito a “vigilância redobrada”, em violação à Convenção de Viena
sobre Relações Diplomáticas. Ao eleger diplomatas norte-coreanos como alvo de
vigilância, buscas e detenção, os Estados Unidos visam cortar um dos poucos
meios de que a RDPC ainda dispõe para participar de transações monetárias
internacionais. Sanções bancárias da ONU e dos Estados Unidos têm feito com que
a maioria dos bancos internacionais se mostre avessa a transacionar com a
Coreia do Norte, forçando a RDPC a realizar o grosso de seu comércio exterior
em dinheiro.
A medida que promete
infligir o maior dano à economia da Coreia do Norte é a que restringe o
comércio com os bancos norte-coreanos. “Perseguir o sistema bancário de maneira
a mais ampla é sem dúvida o ponto mais forte da pauta,” observa o
ex-funcionário do Departamento de Estado estadunidense Evans J. R. Revere. “Aos
poucos isso começa a corroer a capacidade da Coreia do Norte de financiar
muitas coisas.” Primordialmente o comércio regular, é forçoso notar.
Poucos dias depois o
Departamento do Tesouro dos Estados Unidos adicionava suas próprias sanções,
proibindo transações entre o Banco de Comércio Exterior da Coreia do Norte e
indivíduos e empresas dos Estados Unidos, e aplicando um congelamento aos ativos
mantidos sob jurisdição dos EUA. ’O Banco de Comércio Exterior, assinala o
Departamento do Tesouro é “o principal banco de câmbio da Coreia do Norte”. A
proibição, com efeito, impede bancos e empresas em outras nações de comerciar
com o Banco de Comércio Exterior sob pena de serem excluídos do sistema
financeiro estadunidense. “Quando há um banco estrangeiro com o qual os bancos
estadunidenses não estão fazendo negócios, os bancos de outros países começam a
evitar transações com ele,” observa um especialista financeiro. “Eles ficam
preocupados de eles mesmos sofrerem as consequências.” Tipicamente, o comércio
internacional está baseado no dólar, requerendo que as transações sejam
processadas através do sistema financeiro dos Estados Unidos. Por essa razão os
“bancos chineses não poderão ajudar a Coreia do Norte”, acrescenta o analista
financeiro.
A Coreia do Sul, por
sua vez, adotou políticas que aumentam o perigo de uma guerra. De acordo com um
militar sul-coreano, “Foi dada autoridade e poder discricionário aos
Comandantes para que tomem a iniciativa na eventualidade de uma provocação
norte-coreana e inflijam uma retaliação dez vezes mais forte do que o nível de
provocação.” O Diretor de Operações dos
Chefes de Estado Maior Conjunto Kim Yong-hyon diz que em resposta a um
incidente as forças armadas sul-coreanas “punirão com determinação não apenas a
origem da provocação, mas também suas forças de comando.” Não requer muita
imaginação para reconhecer o potencial que tal política tem de transformar uma
escaramuça menor em uma guerra.
Os Estados Unidos e a
Coreia do Sul assinaram recentemente um plano antiprovocação, em que as forças
estadunidenses se comprometem a dar apoio às forças sul-coreanas quando estas
ataquem um alvo na Coreia do Norte. O plano detalha as ações a serem tomadas em
resposta a vários cenários. De acordo com um militar sul-coreano, o plano leva
em conta a política sul-coreana “que prevê o lançamento de contra-ataques não
apenas contra a origem da provocação, mas também contra forças que a estejam
apoiando e contra seus comandantes”. Em alguns cenários “armas estadunidenses
podem ser mobilizadas para contra-atacar as águas e solo territoriais da Coreia
do Norte”. O plano antiprovocação exige
que a Coreia do Sul consulte os Estados Unidos antes de entrar em ação, mas se
Seul requisitar assistência dos Estados Unidos estes não poderão recusar tomar
parte em operações militares.
Em uma poderosa
demonstração visando intimidar a Coreia do Norte, os Estados Unidos e a Coreia
do Sul iniciaram o Determinação Crítica (Key Resolve), seu exercício militar
anual no dia 11 de março, sobrepondo-o ao exercício militar Foal Eagle (Pequena
Águia), com duração de dois meses, que começou em 1º de março. Durante o
exercício, bombardeiros B-52 com capacidade nuclear decolaram de Guam e
despejaram munição de treino na Coreia do Sul. Os comandantes estadunidenses
sabiam que essa ação inflamaria a sensibilidade da Coreia do Norte, dada a
memória dolorosa que os norte-coreanos têm da Guerra da Coreia, quando os bombardeiros
dos Estados Unidos levaram a cabo uma política de terra arrasada e destruíram
todas as cidades norte-coreanas.
Os Estados Unidos foram
gradualmente aumentando a pressão sobre a RDPC, enviando o submarino nuclear
USS Cheyenne, equipado com mísseis Tomahawk, para participar no Foal Eagle.
Logo depois, bombardeiros B-2 Stealth (Furtivo) cruzaram os céus da Coreia do
Sul em exercícios militares. “Como o B-2 tem uma função que o torna invisível
ao radar, ele pode penetrar defesas antiaéreas e lançar armamento nuclear e
convencional,” comentou um oficial militar. “É a arma estratégica mais temida
pela Coreia do Norte.” Note-se que o B-2 é o único avião capaz de despejar uma
bomba de 15 toneladas, a Massive Ordnance Penetrator, que pode perfurar 80
metros de concreto antes de ser detonada. Esse avião pode carregar ainda
múltiplas armas nucleares. Continuando a escalada de demonstração de força, em
seguida os Estados Unidos enviaram avançados aviões de combate F-22 Stealth
para a Coreia do Sul. O governo sul-coreano
pediu aos Estados Unidos que não mostrassem esses aviões em público porque isso
seria uma provocação desnecessária à Coreia do Norte, solicitação ignorada
pelos Estados Unidos.
Para fortalecer o
arsenal da Coreia do Sul os Estados Unidos aprovaram a venda de 200 bombas de
destruição de casamatas, apropriadas para atingir instalações subterrâneas
norte-coreanas. Há planos prevendo o emprego dessas armas até o final do ano. A
Coreia do Sul também tem planos de comprar 200 mísseis ar-solo Taurus de longo
alcance da Europa, capazes de penetrar até seis metros de concreto armado.
Como parte de seu
planejamento para futuras contingências, os Estados Unidos formaram uma
organização militar encarregada de entrar na Coreia do Norte e tomar
instalações nucleares e armas na eventualidade de uma crise na RDPC. Nesse
cenário, forças dos EUA também prenderiam “figuras-chave” e coletariam
informações classificadas. Quais indivíduos norte-coreanos estariam sujeitos à
prisão por forças estadunidenses não foi informado. Essa força compreenderia as
forças armadas, agentes de inteligência e pessoal antiterrorismo
estadunidenses. Um exercício implementando o plano fez parte das recém-concluídas
manobras Key Resolve.
Tendo feito tudo para
provocar os norte-coreanos, o governo Obama aproveitou a oportunidade para
apontar a reação daquele país como justificativa para instalar uma pauta de
hardware antimíssil. O Pentágono anunciou que estacionaria mais 14 mísseis
interceptores em Fort Greely, no Alaska, e prosseguiria com seu plano de
colocar um segundo radar antimíssil no Japão.
Uma bateria de Defesa de Área de Alta Altitude Terminal (Terminal
High-Altitude Area Defense – THAAD) está programada para sair de Guam para sua
primeira utilização e o radar sobre a
plataforma marítima SBX-1 X-Band Radar está aproximando-se do Pacífico
ocidental, no que a Marinha diz poder ser a primeira de outras instalações
navais.
O jornal Wall Street
Journal relata que a demonstração de força foi planejada antecipadamente,
naquilo que o governo Obama denominou de “a cartilha.” Os Estados Unidos agiram
com a deliberada intenção de ameaçar a Coreia do Norte. De acordo com o artigo,
o governo só decidiu dar uma pausa na cartilha quando a mídia revelou o
deslocamento de dois destróieres com mísseis guiados para o Pacífico ocidental
e essa notícia foi percebida como ensejando um risco potencial de forçar a mão
dos norte-coreanos. O deslocamento dos destróieres, dizia-se, não era para ser
publicado. Os passos seguintes da cartilha foram paralisados por ora. Também
foi noticiado que os Estados Unidos postergarão um voo de teste do MBIC
Minuteman em um mês a fim de não aumentar a tensão.
A percepção que o
governo Obama deseja transmitir ao público dos Estados Unidos e do mundo,
portanto, é a de que os Estados Unidos estão agindo com responsabilidade e
buscando tranquilizar a situação. No entanto, um alto funcionário da defesa diz
que “Não houve ordem da Casa Branca para que fosse mantido segredo” com relação
ao emprego dos destróieres. Além disso, hardware militar recém-incorporado não
está sendo recolhido, enquanto o exercício militar combinado
estadunidense-sul-coreano Foal Eagle, de larga escala, às portas da Coreia do
Norte segue sem dar trégua.
A despeito das
alegações de que está baixando o tom de suas ações, o governo Obama está
fazendo o contrário. Autoridades dos EUA dizem que o país não pretende entrar
em conflito de novo com a RDPC. A dissuasão sob medida e a cadeia de destruição
estão com os cronogramas acelerados, lançando a Península da Coreia no fio da
navalha da guerra. Entrementes, os Estados Unidos estão trabalhando duro para
persuadirem outras nações a adotar sanções contra o Banco de Comércio Exterior
da Coreia do Norte e estão considerando outras maneiras de provocar o colapso
econômico da Coreia do Norte. Um funcionário do Departamento de Estado dos EUA,
cujo nome não foi revelado, fez notar que ainda havia espaço para aumentar as
sanções. “Eu não sei o que vai suceder, mas nós não atingimos o máximo; há
espaço para avançar e temos que tentar.”
Autoridades
estadunidenses solicitaram à União Europeia que aplique sanções ao Banco de
Comércio Exterior e esperam-se outras discussões nessa linha. O Japão e a Austrália já concordaram em se
juntar aos Estados Unidos nas sanções ao banco e ambos o funcionário do
Departamento do Tesouro David Cohen e o Secretário do Tesouro Jack Lew pediriam
à China que faça o mesmo. O presidente
Obama fez uma ligação pessoal ao presidente chinês Xi Jinping, instando-o a aplicar
sanções contra o Banco de Comércio Exterior, ao mesmo tempo em que funcionários
dos EUA continuam a pressionar a China, insistindo em que se a China não
“reprimir” a Coreia do Norte, os EUA aumentarão suas forças militares na Ásia.
Esse desdobramento,
certamente reconhecido pelos chineses, visaria à própria China além da Coreia
do Norte. A escolha que os Estados Unidos estão dando à China é que os chineses
podem ou olhar os Estados Unidos expandirem sua militarização da região e
apertar o cerco em torno da China ou aceitar a pressão estadunidense e cooperar
para causar a ruína econômica da Coreia do Norte. É provável que, ao escolherem
esta última opção, os chineses venham a descobrir que os Estados Unidos não têm
nenhuma intenção de reduzir a velocidade de seu pivô asiático e que sua presença
militar na região cresceria de qualquer maneira.
Uma fonte diplomática
revela que quer a China concorde em apoiar os EUA em suas exigências ou não, o
efeito sobre a economia da Coreia do Norte poderá ser o mesmo. “O que o governo
dos EUA está buscando é colocar pressão psicológica nos bancos chineses. Se os
bancos estadunidenses evitarem transacionar com bancos chineses que tenham
vínculos com bancos, ou outras entidades, da Coreia do Norte incluídos na lista
negra, isso poderia acarretar efeitos semelhantes àqueles de sanções
secundárias.”
Não há dúvida de que as
autoridades e a mídia norte-coreanas têm feito declarações incendiárias e
tomado medidas como cortar a linha militar de comunicação emergência (hotline)
com a Coreia do Sul, anunciando sua intenção de reativar o reator nuclear de
Yongbyon e temporariamente fechando o Complexo Industrial Kaesong, medidas que
parecem irresponsáveis e só exacerbam as tensões. Porém, há lógica em seu
comportamento. O governo Obama nunca quis negociar com a Coreia do Norte e
claramente busca causar uma mudança de regime à medida que vai acumulando
sanções e desenvolve planos militares que ameaçam a existência da RDPC. Com
efeito, as ações estadunidenses motivaram a Coreia do Norte a desenvolver um
programa de armas nucleares como seu único dissuasor contra ataques, dada a
tecnologia ultrapassada de seu armamento convencional.
No entanto, as
autoridades norte-coreanas sabem que os Estados Unidos sabem que eles ainda não
têm uma arma nuclear em condições de uso, nem tampouco um veículo lançador
adequado. A RDPC tem poucas opções e, neste momento, o governo norte-coreano
aparentemente acha que tem apenas duas escolhas. Ou aceita submissamente uma
punição atrás de outra enquanto testemunha impotente o dano crescente à sua economia
e ameaças à sua nação ou pode elevar o tom de sua retórica como forma de mandar
uma mensagem aos Estados Unidos. A mensagem é que, se os Estados Unidos
atingirem a Coreia do Norte, eles terão uma resposta maior do que esperam e
deveriam pensar duas vezes antes de atacar; quanto mais os EUA fizerem pressão,
mais a RDPC resistirá.
Infelizmente isso gera
um ciclo de realimentação, em que quanto mais os Estados Unidos punem a RDPC,
maior será a força com que os norte-coreanos defender-se-ão, e quanto mais
resistirem, mais punidos serão. A única saída aparente para esse impasse é um
processo de paz, mas o governo Obama permanece intransigentemente contrário a
negociações.
O analista de questões
internacionais Chen Qi, da Universidade Tsinghua, destaca que os Estados Unidos
“não respeitaram as preocupações de segurança da RDPC e essa é a razão pela
qual a questão nuclear não foi resolvida na Península da Coreia”. Chen sugere
que “talvez Washington não queira que a questão nuclear de Pyongyang seja
resolvida porque isso fornece uma desculpa para os EUA lançar mão de sistemas
antimísseis e realizar exercícios militares na região, que são compatíveis com
seu reequilíbrio militar voltado para o Leste da Ásia”. Deve-se ter em mente
ainda que funcionários dos EUA jamais escondessem seu desejo de provocar uma
mudança de regime na Coreia do Norte, a despeito dos perigos de tal política.
Uma mudança na política
dos EUA talvez nunca se materialize a menos que a Coreia do Sul lidere o
caminho com firmeza, uma perspectiva pouco provável no presente momento. Tal
mudança talvez tenha que esperar cinco anos, quando a próxima eleição
presidencial for realizada na Coreia do Sul. Isso é muito tempo, dados os
planos estadunidenses de elevar a tensão.
Se a Coreia do Sul não mostrar liderança na busca por uma abordagem
alternativa antes disso, a questão é por quanto tempo as tensões podem cozinhar
em banho-maria sem ferver e descambar em uma crise perigosa.
*Gregory Elich é membro
do Conselho de Administração do Instituto de Pesquisa Jasenovac e dos Conselhos
Consultivos do Instituto de Política da Coreia e da Comissão da Verdade da
Coreia. Ele é autor do livro Strange Liberators: Militarism, Mayhem, and the
Pursuit of Profit [Estranhos Libertadores: Militarismo, Caos e a Busca do Lucro].
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