Ex-presidente defendeu
em São Paulo as ações de parceria iniciadas por seu governo com o continente:
'Não é o empresário chegar e comprar empresas deles e pronto'
por Nicolau Soares,
especial para a RBA
VANESSA CARVALHO/BRAZIL
PHOTO PRESS/FOLHAPRESS
Lula lamenta que a
primeira imagem que se tenha em mente sobre a África seja a da miséria
São Paulo – O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu hoje (27) as ações
diplomáticas iniciadas por seu governo em direção à África, com parcerias
inéditas de transferência de tecnologia. Ele falou durante evento realizado
pela Prefeitura de São Paulo para celebrar o Dia da África. A data marcou a
criação do Grupo de Trabalho Intersetorial "Educação das Relações
Etnicorraciais" para elaborar proposta de implementação, acompanhamento e
monitoramento da Lei 10.639, de 2003, que institui o ensino da História da
África nas escolas públicas e privadas.
Lula começou criticando
a visão equivocada sobre a África, que relaciona o continente somente à
miséria. “O continente africano está passando por um processo democrático como
em poucos lugares do mundo. No último ano e meio, tivemos 26 eleições
executivas e legislativas no continente. Dos dez países que mais crescem no
mundo, sete são africanos. Os países do continente crescem a 5% ao ano em média
e, dos mais de 1 bilhão habitantes, 300 milhões de pessoas atingiram um padrão
de classe média”, afirmou.
O ex-presidente
ressaltou o carinho que os países africanos nutrem pelo Brasil, que já tem 40
embaixadas no continente e recebeu 17 novas em seu território nos últimos anos.
“O Brasil pode ter uma relação diferenciada com a África. Não temos o direito
de permitir que a estupidez da colonização retorne ao continente africano. Não
é o empresário chegar e comprar empresas deles e pronto. Precisamos construir
uma política de parcerias para eles construírem suas empresas. Eu falei na CNI
(Confederação nacional das Indústrias) outro dia que é preciso ter diretores
negros e africanos, não podemos fazer como a Volkswagen fazia no Brasil na
década de 1960 quando todos os diretores eram alemães”, afirma.
Lula destacou a criação
da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira
(UNILAB), criada pelo governo brasileiro para promover o intercâmbio acadêmico
entre o Brasil e os países africanos de língua portuguesa. Outro ponto lembrado
foi a instalação de escritórios da Embrapa em Gana e outros países para
desenvolver tecnologias agrícolas que possam transformar a savana africana em
terra produtiva, como foi feito no cerrado brasileiro. “Hoje 60% das terras
agricultáveis do mundo está na África. Precisamos levar tecnologia para eles se
tornarem grandes produtores de alimentos”, disse Lula, ressaltando a
necessidade de políticas que levem o Brasil e os países da África a “crescer em
igualdade de condições”. “O Brasil não deve ver esses recursos como gasto, mas
como investimentos em nós mesmos”, afirma.
São
Paulo
O prefeito Fernando Haddad
(PT) afirmou a importância da implementação da Lei 10.639, de 2003, que inclui
o ensino de história e cultura africana no currículo básico. “Na prefeitura,
temos função importante de desdobrar as políticas no território para dar
continuidade aos avanços”, afirmou, lembrando a coleção de oito volumes sobre
História Africana traduzida pelo Ministério da Educação de um original
produzido pela Unesco e agora resumida e adaptada como livro didático também
pelo ministério.
“Temos que caminhar muito para podermos olhar
para trás e dizer que resgatamos a história dos negros no Brasil e conquistamos
a igualdade não só de direitos, mas também material. Isso é uma tarefa da
política e os últimos dez anos são motivo de otimismo. São Paulo é a cidade
mais negra do Brasil em números absolutos e precisamos avançar”, disse o
prefeito.
O secretário de
Igualdade Racial, Netinho de Paula, saudou a criação da sua secretaria em São
Paulo como uma conquista do movimento negro brasileiro. “É o reconhecimento das
necessidade de construir efetivamente estratégias sobre o tema racial”, disse.
“Implementar a Lei 10.639 é um reconhecimento de que educar para os direitos
humanos é valorizar a diversidade étnico-racial”, afirmou.
Homenageado da noite
pelas contribuições de seu governo para a igualdade racial, o ex-presidente
Lula também destacou a importância da criação da Sepir em São Paulo. “Quando se
fala em São Paulo parece que esta tudo resolvido, mas a periferia da cidade é
uma grande Recife, uma grande Salvador. Todos os problemas do Brasil estão lá,
e com mais sofrimento porque nas cidades pequenas as pessoas não moram em
barracos, não convivem com a violência”, avaliou.
Referindo-se a Netinho,
Lula cobrou que coloque “coração na ponta da chuteira” e tenha disposição em
ouvir a população. “Não pense que suas reuniões serão sempre festivas. Você vem
com esse papo de 'mano do gueto', mas vai ver como os manos vão reagir se você
não fizer o que eles querem”, brincou.
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