A manifestação do presidente da Associação dos Magistrados, secundado por outros desembargadores, presidentes e ex-presidentes de Tribunais de Justiça, afirmando que os acusados no chamado “mensalão” estão por trás das críticas ao comportamento de alguns integrantes do Judiciário é um desrespeito à própria ideia de independência e altivez que merece a Justiça.
Narra o “Estadão”: “O Supremo está emparedado por pessoas que querem abalar os alicerces do Judiciário”,brada Henrique Nélson Calandra, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)”.
Excelência, com a vênia que lhe pede um leigo, isso parece ser uma acusação, e a acusações, se bem me recordo, carecem de um mínimo de provas, se estão na esfera pública.
Do contrário, são apenas política.
E no campo da política, a discussão é livre.
Politicamente, o pronunciamento do presidente da AMB, feito num evento público, é de uma total irresponsabilidade:
“”Estamos vivendo no Brasil (…) um momento onde aqueles que deveriam zelar e velar pelas garantias constitucionais brasileiras muitas vezes assumem posição de afrontar. O Supremo tem sido sistematicamente afrontado”.
Opa! Quem é que está afrontando as garantias constitucionais, Excelência? Que decisão judicial não está sendo acatada? Que tribunal está sendo desrespeitado? Em que o Supremo tem sido afrontado?
É o caso de indagar: quem quer abalar o Judiciário são aqueles que chamam a atenção sobre possíveis desvios, que fazem com que alguns percebam do Estado – ou de terceiros – valores que precisam ser explicados ou os que trazem à luz estes fatos?
Juízes são cidadãos e servidores, como todos. É da essência da República.É próprio do Estado de Direito.
É curioso que esse discurso jamais tenha surgido quando acusações – até mesmo muito menos graves – pesam sobre Ministros de Estado ou parlamentares. Ninguém, e seria absurdo que o fizesse, disse que o Executivo ou o Legislativo estavam sendo afrontados ou emparedados.
Ninguém foi contra exigir que o ex-ministro Palloci, por exemplo, indicasse a origem de seus ganhos. E a chefe do Executivo, oferecida a possibilidade de explicação e defesa, sempre agiu com firme prudência.
Ninguém, até agora – salvo integrantes da mais alta cúpula do Judiciário – disse que há banditismo na Justiça. E o fez depois de chegarem às suas mãos, pelos meios legais, informações estarrecedoras sobre movimentações financeiras.
Não se tem notícia de ninguém que tenha se expresado com um décimo da virulência que faz hoje o ex-presidente do TJ do Rio de Janeiro, Marcus Faver, em entrevista a O Globo:
A imprensa tem denunciado gravações apontando venda de sentenças por juízes…
FAVER: Isso é muito grave, gravíssimo. Se há isso, é crime e o autor disso, me desculpe a expressão, se for um juiz deve ser enforcado em praça pública.
Quem vende sentença tem que ter essa punição?
FAVER: A punição maior. Um enforcamento em praça pública
Ninguém está procedendo com tais arroubos. Ninguém está propondo que se faça, mesmo aos maus juízes, nada que não a aplicação da lei, que não não enforca, nem literal nem figurativamente. A severidade que se quer é o cumprimento estrito da lei, o direito de defesa, a observância dos direitos da coletividade como maior que o mero interesse pessoal.
Ninguém mais do que os fracos precisam do Judiciário. Ninguém mais do que a multidão de pobres deste país, ajuda a remunerar, com dignidade, seus mais elevados servidores.
Ao Judiciário, mais do que a qualquer um, deve competir a tarefa de por-se acima de suspeitas, para que não o encaremos como parcial e hipócrita e não com o respeito que o vemos.
Mas, ainda no campo da política, o que se depreende de, sistematicamente, o “dura lex, sed lex” no Brasil ser o contrário do que o simplório capitão Rodrigo Cambará diz em “O Tempo e o Vento”:
- Buenas, e me espalho. Nos pequenos dou de prancha, e nos grandes dou de talho.
Não é hora de nossos magistrados verem que não é possível ir de talho nos humildes do Pinheirinho e nem de ir prancha nos grandes, ao aceitarem que se apure os eventuais abusos e comprometimentos nas estruturas da Justiça?
Certamente é muito mais lúcido e democrático do que rugir por uma suposta ameaça às intituições que, além de proteger eventuais culpados por desvios, ameaça uma crise institucional, terreno onde medra o golpismo contra as próprias instituições e a democracia.
Este, sim, devemos perguntar a quem interessa, e não é difícil saber que é aos que não atingem o poder pelos caminhos da vontade popular.
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