domingo, 13 de novembro de 2011

A Europa, entre o lengalenga e o bunga bunga

A Grécia de Papandréou deu uma contribuição imensa à salvação da Europa ao propor um referendo para julgar a “ajuda” da União Europeia nos termos prussianos que foram “oferecidos”. Era oportunidade única para demonstrar a democracia europeia em todo o seu esplendor. Os bancos franco-germânicos não concordaram. E a Europa, antes magnífica, continua sua nova sina de bundalelê, sem salvação nem à vista nem a prazo. O pior é que a justificativa mais comum para esse estado bunga bunga seria o excesso de bem-estar social europeu – uma forma óbvia de ocultar o mal-estar social do neoliberalismo. Quem vai salvar a Europa não sei. Mas sei, com certeza, que não serão Sarkozy e Merkel. Nem serão recessão e desemprego. Nem será o lengalenga que tomou conta das análises políticas e econômicas. Prefiro ficar com esse ótimo texto de Paul Krugman, “Legends of the Fail”, do último dia 10, que a Folha traduziu hoje.

Lendas do fracasso - Paul Krugman

É assim que o euro termina - não com uma explosão, mas com bunga bunga. Não muito tempo atrás, os líderes europeus insistiam em que a Grécia podia continuar na zona do euro e pagar suas dívidas na íntegra. Agora, com a Itália caindo em um precipício, é difícil imaginar de que modo o euro poderia sobreviver.
Mas qual é o significado do fiasco do euro? Que lições extrair?
Ouço duas alegações, ambas falsas: os problemas da Europa refletem o fracasso dos Estados de bem-estar social como um todo, e a crise europeia confirma a necessidade de austeridade imediata nos EUA.
A primeira alegação está sendo feita por republicanos como Mitt Romney, que acusou Obama de se inspirar nos "socialistas democratas" europeus e disse que "a Europa não está funcionando nem na Europa". A ideia é que os países em crise enfrentam problemas devido ao peso dos gastos governamentais.
Mas os fatos dizem o oposto.
É verdade que toda a Europa oferece benefícios sociais mais generosos - entre os quais serviços universais de saúde - e registra gastos governamentais mais altos que os EUA. Mas os países hoje em crise não oferecem mais bem-estar social do que os que estão se saindo bem.
Na verdade, a correlação indica o oposto. A Suécia, famosa por benefícios generosos, tem ótimo desempenho e é um dos poucos países cujo PIB atual é maior que o de antes da turbulência. E o "gasto social" em todos os países hoje em crise era menor do que na Alemanha.
A crise do euro, portanto, nada diz sobre a sustentabilidade dos Estados de bem-estar social. Mas justifica a necessidade de apertar os cintos numa economia já deprimida? Dizem-nos que os EUA têm de cortar gastos agora ou poderemos terminar como a Grécia. Os fatos também contam história diferente.
Primeiro, o fator determinante para os juros não é a dívida do governo, mas sim se a captação é feita em moeda nacional ou não. O Japão tem dívida bem maior que a italiana, mas os juros sobre os títulos japoneses de longo prazo são de cerca de 1%, ante 6% na Itália. As perspectivas fiscais britânicas parecem piores que as espanholas, mas o Reino Unido pode captar pagando 2% de juros; a Espanha paga quase 6%.
Na prática, ao adotar o euro, Espanha e Itália se reduziram à situação de países do Terceiro Mundo que precisam tomar empréstimos na moeda alheia, com toda a perda de flexibilidade que isso implica.
Por não poderem imprimir mais dinheiro em situações de emergência, os países da zona do euro ficam sujeitos a perturbações em sua captação que não afligem países capazes de tomar empréstimos em suas próprias moedas, como os EUA.
A austeridade, por sua vez, fracassou em todo lugar no qual foi tentada. Nenhum país com dívidas significativas conseguiu cortar gastos a ponto de recuperar o apreço dos mercados. A Irlanda, por exemplo, é o bom menino da Europa: respondeu à crise com medidas ferozes, que levaram o desemprego a mais de 14%. Mas os juros pagos pelos títulos irlandeses ainda superam os 8% - mais altos que os italianos.
Moral da história: devemos ter cuidado com ideólogos que tentam aproveitar a crise europeia para promover suas agendas. Se ouvirmos o que eles dizem, agravaremos ainda mais os nossos problemas.

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