Quando eu era criança, pressentia de forma intensa a existência de um grande mistério e de uma grande opressão inerentes à vida e os quais, embora efetivos e onipresentes, os meus poucos anos de vida não permitiam desvendar.
Na adolescência tornou-se claro que o mistério era, evidentemente, o sexo, a existência de um mundo de prazer e entrega apartado do universo aparente do cotidiano.
Quanto à opressão, levei mais tempo para descobrir que se tratava dos efeitos paranóicos instaurados pela ditadura militar, os quais a peça Liberdade, Liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, registrada em disco, reproduz com maestria, captando as sutis mas muito perturbadoras decorrências da opressão para a psicologia coletiva.
Com efeito, eu nasci e cresci sob a pesada atmosfera dos anos de chumbo. Em 1967, com um barrigão e a alguns meses de me trazer ao mundo, minha mãe ficou, nas imediações da Praça da República, espremida detrás de uma porta de ferro de uma loja fechada às pressas, enquanto uma batalha campal entre estudantes e forças repressivas se dava à sua frente, com direito a bombas de gás de um lado e, de outro, bolinhas de gude para derrubar os cavalos.
Neste primeiro de abril de 2011, 47o. aniversário de uma ditadura que afundou o pais numa pasmaceira e num vale-tudo anti-ético encoberto pela censura à imprensa, atrasando em décadas nossa evolução e deixando marcas profundas e deletérias, republico aqui uma história verídica vivenciada pelo meu pai, cujo ódio que sempre nutriu pela ditadura só é superado pelo êxtase com que celebrou a redemocratização e, mais recentemente, a Era Lula.
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