Augusto Campos ao lado direito de Lula durante
assembleia dos bancários na Casa de Portugal, em 1980 (em pé, o dirigente
Luizinho Azevedo)
Retomada do Sindicato, no final dos anos 1970, foi resultado
da união de diversos bancários que lutaram para romper com modelo e estrutura
sindical vigente e impulsionar categoria para obter novas conquistas.
São Paulo - O ano é 1979. Os bancários organizavam a primeira
greve da categoria, após a chamada “retomada” do Sindicato. Reunidos no pátio
do Colégio São Bento, os trabalhadores definiram pelo início da greve para o
dia seguinte. O movimento começou forte, mas a repressão policial e dos bancos
também. “Houve confronto tão intenso que os padres não quiseram mais alugar o
espaço para nós. Na Casa de Portugal também não podia ser, os portugueses não
queriam mais a gente lá, pois tinha cada vez mais pessoas nas assembleias e o
espaço ficava pequeno, apertado. Passamos a procurar lugar próprio e compramos
um terreno, no qual funcionava um estacionamento, na Rua Tabatinguera. Foi ali
que fizemos a Quadra, inaugurada em evento marcante para mim. Ver naquele
lugar, nosso, figuras históricas como Lula e Luiz Carlos Prestes debatendo com
a categoria foi especial.”
A recordação é do presidente do Sindicato à época, Augusto
Campos. Atualmente residindo em Santos, litoral sul, Augusto é enfático ao
declarar que o movimento pela “retomada” não se configurava em oposição à
entidade, mas ao modelo sindical vigente.
Por que vocês decidiram organizar movimento de oposição à
diretoria do Sindicato?
Houve uma ruptura muito forte no movimento sindical bancário
a partir de 1964, com o golpe militar. Até então a entidade era conduzida pelos
integrantes do antigo PTB e do PC. Após o golpe, os partidos passaram para a
clandestinidade, perdendo-se muito da organização. No início dos anos 1970
começamos a nos reunir a partir do movimento estudantil e dentro dos bancos
públicos, como o Banco do Brasil e o Banespa, para que a entidade tomasse outro
rumo. Assim, não fizemos oposição ao Sindicato, mas ao modelo vigente, ao
imposto sindical, à interferência da Justiça do Trabalho.
Como a categoria recebeu o surgimento de uma oposição
bancária?
Era evidente a categoria querer nova forma de condução em
suas lutas. A eleição de 1975 foi tão disputada que ficou claro para nós ser
possível vencer. Crescemos muito desde então, tanto é que a eleição que
ocorreria em 1978 foi adiada para o ano seguinte pela Delegacia Regional do
Trabalho (DRT) a pedido da então diretoria. Na carta à DRT, o presidente à
época chegou a escrever que se a eleição ocorresse naquele ano, os
‘barbudinhos’ iriam tomar conta do Sindicato e a coisa ficaria fora de
controle. A DRT atendeu ao apelo, mas vencemos.
Mas mesmo antes de estar na direção do Sindicato, vocês
contavam com o respaldo da categoria e organizaram a greve de 1978?
É verdade. Conseguimos ganhar a assembleia de 1978 e a greve
estourou. Adotamos a tática dos metalúrgicos do ABC: ‘Braços cruzados, máquinas
paradas’, em que o operário permanecia na fábrica, sem ligar equipamentos.
Demos a mesma orientação aos bancários, mas não foi possível ter êxito, a
realidade era diferente dos metalúrgicos, pois além das chefias tinha os
clientes. E o bancário não aguentou tanta pressão.
Como foram as primeiras negociações com os representantes dos
bancos?
Inauguramos nova forma de negociar. Até então, antes mesmo de
se começar as reuniões com os bancos, já havia a possibilidade de a diretoria
do Sindicato entrar com o pedido de dissídio coletivo, que nada mais é do que
solicitar que a Justiça interviesse nas negociações. Ao final, as decisões, na
maioria das vezes, eram desfavoráveis aos trabalhadores. Em uma das nossas
primeiras negociações dissemos: agora não tem mais dissídio. Vamos resolver tudo
na mesa de negociação e na correlação de forças. Se fizermos campanha fraca,
assinaremos o acordo do tamanho do movimento. Mas se a mobilização for forte,
vocês também terão de aceitar a situação e assinar o acordo. Chega da
interferência da Justiça. E a partir daquele momento houve a necessidade de o
Sindicato se organizar mais nos locais de trabalho e esclarecer os
trabalhadores para que entrassem na campanha salarial.
Como foi possível mobilizar os trabalhadores?
Tínhamos dificuldade muito grande de envolver as pessoas na
campanha. Para dividir a categoria, os bancos aplicavam o reajuste pelo salário
mínimo, que atingia funcionários mais novos, e davam reajustes maiores nos
anuênios para contemplar os mais antigos de empresa. Para quebrar essa lógica
passamos a reivindicar percentual acima do salário mínimo e tínhamos como
argumento os indicadores do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e
Estudos Socioeconômicos) que, após ter recuperado seu papel de importância
junto ao movimento sindical, muito graças ao Lula e ao Olívio Dutra – liderança
bancária no Rio Grande do Sul –, conseguiu provar que a inflação oficial do
então ministro Delfim Neto estava bem abaixo da realidade que o trabalhador
encontrava no supermercado. Então, reivindicar reajuste de 10% acima do salário
mínimo mais R$ 100, por exemplo, favorecia salários mais baixos, mas também
contemplava os mais altos. Isso trouxe muita gente para a campanha salarial e
para as assembleias. E partimos para a greve em 1979. Naquele ano jogaram tudo
contra nós, houve confronto com a polícia, tropa de choque na rua, as pessoas
jogavam máquina de escrever dos prédios em cima dos policiais. Parecia que iria
acabar o mundo, a Rua Boa Vista parecia praça de guerra.
E qual a importância da Folha Bancária diária na organização
dos trabalhadores?
A experiência da Folha Bancária diária foi extraída ao
participarmos de campanha eleitoral em Belo Horizonte. Lá eles chegavam em uma
concentração e colocavam 30 jornais. Se esgotava, colocavam 50 e assim faziam
até ter a quantidade ideal. Adotamos o mesmo aqui e deu certo. Nossa intenção
não era entregar o jornal nas mãos das pessoas, mas que elas retirassem nos
locais, em cavaletes de madeira colocados nas proximidades das agências. Antes
de começarmos a edição diária, reunimos várias denúncias de bancários durante
algumas semanas e preparávamos material para umas dez edições. Assim, a Folha
Bancária passou a ser diária e chegamos a ter uma tiragem de 25 mil exemplares.
Virou referência para a categoria.
Como foi durante a intervenção no Sindicato em 1983?
Praticamente no mesmo momento em que há a intervenção no
Sindicato tem a fundação da CUT e a convocação de greve geral. Em nome de
tentar impedir essa greve geral eles fizeram a intervenção e cassaram a diretoria
do Sindicato. Na véspera da greve geral, a polícia entrou na sede do Sindicato,
que ficava no 17º andar na Rua São Bento, 365, e levou todo mundo para a
Polícia Federal, onde ficamos todos encarcerados em um porão. Depois fomos
soltos e continuamos nossa luta de organização da categoria e contra a
intervenção. Nessa resistência editamos a Folha Bancária Livre e fizemos muita
coisa para conseguir recursos: rifas, eventos, muita gente colocou dinheiro do
próprio bolso para auxiliar. Mas o que ajudou a superar aquele momento foi o
empenho de um grupo de diretores e funcionários do Sindicato. A intervenção
caiu de “podre”, pois não tinha mais como ficar na entidade por muito tempo,
até porque a própria ditadura definhava.
Em sua gestão houve a primeira paralisação na matriz do
Bradesco (Cidade de Deus, em Osasco). Isso também motivou a intervenção?
O Bradesco fazia uma manobra que irritava todo mundo. Quando
chegava 25 de janeiro, aniversário da cidade de São Paulo, os funcionários da
capital trabalhavam porque a matriz, em Osasco, funcionava. Quando chegava o
feriado de Osasco, 13 de junho, os empregados de lá trabalhavam porque São
Paulo estava funcionando. Levamos a questão à Delegacia Regional do Trabalho e
nada foi feito. Decidimos acabar com isso e no feriado de Osasco de 1983 fomos
para a matriz. Colocamos cadeado nos portões, caminhões de som na entrada e
seguramos muita gente, inclusive o Amador Aguiar, presidente do Bradesco. Acho
que essa paralisação também pesou na intervenção, pois mostrou que não havia
mais limites para nós. Dali para parar Itaú e os outros bancos era um salto.
Então vieram com tudo para cima da gente.
Quais momentos você considera marcantes no Sindicato?
Quando rompemos o esquema das negociações com os banqueiros,
colocando um basta ao dissídio. Isso colocou um norte à diretoria para
organizar a categoria, se reunir com empregados por banco, realizar assembleia.
E posteriormente a criação do PT e da CUT. Acho que fizemos bastante coisa.
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