Leonardo Sakamoto
“Se morreram, é porque são bandidos”, disse um comandante. “Todos são suspeitos até que se prove o contrário”, afirmou outro. “Foi igual a dar tiro em pato no parque de diversões”, resumiu um policial civil. “Quem não reagiu está vivo”, explicou um governador. Estamos em guerra contra o crime, contra o tráfico de drogas, contra tudo que vá de encontro ao nosso estilo de vida. Ninguém explicou, contudo, que quando – paradoxalmente - se deflagra uma guerra contra a violência, vamos deixando para trás os valores que nos fazem humanos a cada batalha. Nesse processo, os fins acabam por justificar os meios e nos furtamos de questionar as autoridades sobre as aberrações que ordenam ou cometem. No fim, o Estado acaba por se igualar a aquilo que queria combater.
“Se morreram, é porque são bandidos”, disse um comandante. “Todos são suspeitos até que se prove o contrário”, afirmou outro. “Foi igual a dar tiro em pato no parque de diversões”, resumiu um policial civil. “Quem não reagiu está vivo”, explicou um governador. Estamos em guerra contra o crime, contra o tráfico de drogas, contra tudo que vá de encontro ao nosso estilo de vida. Ninguém explicou, contudo, que quando – paradoxalmente - se deflagra uma guerra contra a violência, vamos deixando para trás os valores que nos fazem humanos a cada batalha. Nesse processo, os fins acabam por justificar os meios e nos furtamos de questionar as autoridades sobre as aberrações que ordenam ou cometem. No fim, o Estado acaba por se igualar a aquilo que queria combater.
Na invasão norte-americana do Iraque, popularizou-se a figura
do jornalista “embutido”, que segue as forças armadas, veste o mesmo uniforme e
vê e registra apenas o que o governo quer que seja visto e registrado. Na
prática, faz as vezes de relações públicas da força de ocupação e, portanto, a
anti-reportagem. Com algumas adaptações, parece que a figura do
“jornalista-salame” se repete por aqui em ações policiais em comunidades
pobres, por exemplo, na cobertura da implantação de algumas Unidades de Polícia
Pacificadora (UPP), no Rio de Janeiro. Com a diferença que, na invasão
iraquiana, a ideia do “nós” contra “eles” soava menos contraditória.
De tempos em tempos, a violência relacionada ao tráfico de
drogas retorna com força ao noticiário, normalmente no momento em que ela desce
o morro ou foge da periferia das grandes cidades. Ou para servir de
justificativa a operações de ocupação e remoção de favelas, em que não se
esconde um claro viés de “limpeza” social. Afinal de contas, a mira dos agentes
de segurança deve ser tão afiada quanto a sua língua. Pois acertar um tiro na
nuca de um suspeito no meio de um confronto armado demanda muita destreza. Ou
covardia – nesse caso com o tiro sendo dado pelo representante do Estado de
forma sumária, com a pessoa já rendida e de costas. Eu combato, eu julgo, eu
executo.
Enquanto isso, o
jornalista-salame faz silêncio ou justifica o injustificável. Por ignorância,
má fé, incompetência, falta de tempo, cumprir ordens ou para não melindrar os
“homens de bem” da cidade.
Isso quando não mantemos o silêncio quando um jornalista
sofre por não se embutir. Como já escrevi aqui, o coronel Paulo Telhada incitou
seguidores no Facebook contra o repórter André Caramante, da Folha de S.Paulo,
por conta da reportagem “Ex-chefe da Rota vira político e prega a violência no
Facebook”. O Sindicato dos Jornalistas de São Paulo chegou a encaminhar a
autoridades um documento solicitando proteção para o jornalista. As postagens
na rede social levaram o Ministério Público a pedir a impugnação de sua
candidatura, mas nada foi decidido ainda. E, enquanto isso, Caramante vive um
exílio forçado.
A imensa maioria dos corpos contabilizados nessa batalha
sempre é de jovens, pardos, negros, pobres, que se matam na conquista de
territórios para venda de drogas ou pelas leis do tráfico. Os mais ricos sentem
a violência, mas o que chega neles não é nem de perto o que os mais pobres são
obrigados a viver no dia-a-dia. Atacar a estrutura do tráfico e sua sustentação
econômica é uma saída. Porém, será inócua se não houver mudanças estruturais
que garantam dignidade para os moradores e outras opções de vida para os jovens
que saem em um busca de um lugar no mundo todos os anos.
Para tanto, faz-se necessária uma cobertura mais crítica e
contundente do poder público em suas ações de combate à criminalidade,
mostrando como o problema vem se resolvendo de forma estrutural e se as camadas
mais pobres da população vêm sendo respeitadas. Pois se acreditarmos que as
coisas vão bem porque tem mais “bandido” morrendo, quando percebermos que
estávamos enterrando a própria sociedade já será tarde demais.
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