Mesmo distante, tenho acompanhado atentamente o noticiário
sobre o processo judicial que ganhou o apelido de “mensalão”. E o que me tem chamado a atenção é o
comportamento dos ministros do nosso Supremo Tribunal Federal. Esse fato me levou a comparar o comportamento
dos nossos com seus similares estadunidenses, e essa comparação me causou um
profundo desconforto como brasileiro.
Desconforto que começa pela maneira como são chamados os
homens que compõem as duas cortes supremas. Nos Estados Unidos, eles são
juizes, no Brasil, não se sabe por que, eles viram ministros.
Enquanto a Suprema Corte estadunidense conta com nove juízes
para uma população aproximada de 300 milhões de pessoas, no Brasil são onze
para uma população de 200 milhões. Confesso que não sei qual o critério que
estipulou o número de juízes. Mas desconfio.
Nos Estados Unidos, como no Brasil, juízes da Suprema Corte
são escolhidos pelo presidente da República e, como qualquer ser humano, têm
suas simpatias políticas, que entretanto
não se sobrepõem ao interesse público.
Dos atuais nove juízes da Suprema Corte dos EUA, cinco foram
nomeados por presidentes republicanos: dois por Ronald Reagan, dois por George
Bush e um por Bush pai. Os outros
quatro, foram nomeados por presidentes democratas: dois por Bill Clinton e dois
por Barack Obama. Em tese, são cinco
conservadores contra quatro liberais.
Em junho último, entretanto, o presidente da Suprema
Corte, John Roberts, de perfil
extremamente conservador, fechou com os quatro progressistas e desempatou em
favor da constitucionalidade do plano de saúde do presidente Obama, o polêmico
Obamacare. Um resultado surpreendente
que, evidentemente, desagradou aos
republicanos mas foi absorvido dentro da Corte sem traumas ou ressentimentos.
Não houve choro nem ranger de dentes e ninguém na mídia ou
entre seus pares teve a coragem de criticar o voto decisivo do presidente
conservador daquela Corte. Também não se
viu nenhum deles dando entrevista para a TV. São extremamente discretos os juízes
da Suprema Corte dos EUA.
Lamentavelmente, esse não é comportamento que temos
testemunhado, nos últimos anos, em nosso
tribunal maior brasileiro, que está mais
para um circo de vaidades do que para um grupo de juristas de reconhecido saber
jurídico e reputação ilibada. Parece que nenhum nem outro desses atributos são
levados a sério.
No caso do chamado “mensalão”, até que provem o contrário,
nossa Corte suprema se deixou levar pela pressão midiática e interesses
político-partidários. Teve tempo suficiente para julgar os acusados mas não o
fez. De repente, não mais que de
repente, o Supremo foi tomado por uma louca vontade de trabalhar e decidiu dar
um fim ao processo do “mensalão”, mas
desde que ele terminasse exatamente nos dois meses que antecederam as eleições
municipais. Estranha coincidência, não
fosse o papel desempenhado pela mídia conservadora e os setores mais
retrógrados na nossa sociedade. Essa
pressa em julgar os acusados, quase todos pertencentes ao mesmo partido
político, foi vista assim pelo juiz
aposentado João Baptista Herkenhoff, ilustre colaborador deste DR:
O atropelamento das eleições municipais pelo debate do
mensalão parece-me um desserviço à Democracia, pelos motivos que tentaremos
alinhar neste artigo. Em 11 de abril de 2006 o Procurador Geral da República
apresentou denúncia perante o Supremo Tribunal Federal envolvendo figuras
expressivas da República num caso de corrupção que se tornou conhecido como
mensalão. Em 28 de agosto de 2007 o STF aceitou a denúncia. Em 7 de julho de
2011 o Procurador Geral apresentou as alegações finais do caso e pediu a
condenação de trinta e seis acusados. O trajeto processual, até aqui descrito,
teve a duração de cinco anos dois meses e vinte e seis dias. Ou seja: não houve
nenhuma pressa para que o caso tivesse andamento. A partir de agosto ultimo, o que era lentidão
despreocupada passa a ser celeridade aflita. Às vésperas das eleições
municipais o Supremo, perante os refletores da televisão, transforma o
julgamento em espetáculo.
Triste espetáculo, aliás, onde ministros trocam graves
acusações entre si. Hiptonizados pela mídia, eles são capazes de tudo, até da máxima ofensa pessoal e
profissional, quando um deles afirma
publicamente que determinado colega só foi nomeado para o STF “porque era primo do presidente”.
Ou quando um ministro é
capaz de gritar para o colega, em plena sessão transmitida ao vivo pela
TV, que “V. Exa. está destruindo a
credibilidade da Justiça” e mais adiante
“V. Exa. não está falando com
seus capangas de Mato Grosso” ( Veja o
vídeo )
Esses são alguns dos homens que representam a instância
máxima da Justiça brasileira. Homens que
são escolhidos, teoricamente entre os mais capazes, para distribuir justiça a quem dela
precisa. Mas como confiar nesses homens
que deveriam ser o exemplo maior de caráter, honestidade e credibilidade,
depois de tudo que o país está testemunhando no julgamento do tal “mensalão”? .
E pensar que o nosso Supremo já teve juristas da envergadura
de Nelson Hungria, Orozimbo Nonato,
Hermes Lima, Evandro Lins e Silva, para citar apenas alguns.
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