Soninha Francine espetou um palavrão em seu blog, em caixa
alta, ao final do debate desta semana entre Fernando Haddad e José Serra.
O exclamativo vai além do insulto pedestre e por isso --
somente por isso-- merece atenção.
O disparo dirigido ao petista, a quem se referiu como filho
da puta, foi um grito de fracasso de quem sentiu a corda comprimir o costado,
num duelo em que Serra tinha a obrigação de vencer.
Soninha é responsável por aquilo em que se transformou.Mas o
que ela deixou de ser envolve questões mais sérias do que a irrelevância de um
palavrão.
Soninha quer andar de bike; acha que a melhor ciclovia da
praça é aquela desenhada com três pistas à direita formada pelo tridente Serra,
Kassab & Roberto Freire.
Ela costura por aí. Defende que o trio, e tudo o que ele
representa no país, é 'do bem'. Já Haddad mereceria, na sua visão, o adjetivo
que sapecou no primeiro impulso, atenuado depois para 'sujo', com a variação
'imundo', algumas linhas mais adiante.
Para quem deixou o PT em 2007 alegando intolerância ao
pragmatismo feito de alianças amplas, e se propunha a resgatar os ideais pelos
quais ingressara no partido em 2003, é uma contradição nos seus próprios
termos.
Soninhas, Gabeiras e equivalentes emergem no cenário político
de forma recorrente. Chegam associados (nem sempre de verdade) ao precioso
ideário geracional --jovem, idealista & libertário--, que encerra um
esforço sincero de buscar harmonia entre valores, modo de vida e ação política.
É necessário, hoje mais que nunca, que essa lufada se renove
para sacudir a calcificação institucional que enrijece estruturas partidárias e
reduz plataformas de mudança a escoras de permanência sistêmica.
Existe um prazo de validade, porém, para transformar esse
impulso em uma travessia consequente de longo curso, que dê densidade histórica
ao embate contra estruturas que sonegam essa coerência à sociedade.
O prazo de validade de Soninha esgotou.
Aos 44 anos ela não é mais uma colegial. Andar de bike e
falar 'pô, meu' lhe renderam menos de 3% dos votos nas eleições deste ano. Ter
jogado a toalha ao final do debate da Band deu-lhe mais audiência. O problema é
que ela se arremessou junto para uma posteridade sem passado relevante.
Seu maior patrimônio político, a grife 'oi pessoal, eu saí do
PT', terá cada vez menos demanda no mercado de aluguel de trajes usados.
A juventude idealista que talvez não encontre expressão
satisfatória nas estruturas partidárias niveladas pelo ciclo neoliberal merece
vocalizadores melhores.
Sobretudo que preservem a disposição de ir além da polaridade
enviesada que a trajetória de Soninha sugere ser a única possível.
Entre o pragmatismo insatisfatório no qual patinam algumas
alas da esquerda e o conservadorismo beligerante da decadência tucana, existem
caminhos à espera de um ator político que não restrinja sua busca a uma
ciclovia orientada pelo tenebroso espólio da desordem neoliberal.
Carta Maior recomenda vivamente a seus jovens leitores --e
aos demais também-- a leitura do manifesto dos economistas da Unicamp, 'Em
Defesa da Civilização', publicado em sua página neste fim de semana.
Repousa ali a prova consistente de que o leque de escolhas da
juventude pode - deve - ser maior do que o labirinto abafado no qual Soninha
Francine encerrou a sua.
Postado por Saul Leblon
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