Do "Conversa Afiada"
"O eleitor sabe do que precisa. O moralista que duvidar
que atire nele a primeira pedra.Da excelente “Rosa dos Ventos” de Mauricio Dias na Carta Capital:
“A manipulação da
“ética”
"As pesquisas e as eleições mostram que a sociedade sabe
dos principais problemas do Brasil e não segue o uso político da moralidade.Lula ganhou a eleição presidencial em 2002. Tinha uma aprovação pessoal grande e a avaliação do governo dele em nível elevado. A oposição não sabia como se opor àquele governo que não naufragou de imediato como ela esperava e torcia. Frustrou-se.
O governo fez o dever de casa. Foi comedido, comportado,
conservador. Sacrificou o crescimento econômico pelo superávit primário. Embora
tivesse base de apoio no Congresso, capaz de permitir ousadias, conteve-se. O
programa Bolsa Família criado em 2003, é uma exceção que confirma a regra.
Em 2005, no entanto, explodiu a denúncia do “mensalão” e
despertou na oposição o velho sentimento moralista da extinta UDN. Era a
bandeira que faltava para guiar as insatisfações e retomar o poder para os
tucanos. Delenda Lula.
Entrou em ação a “banda de música” udenista e com ela o uso
político, ou manipulação, do tema corrupção ampliado pelas trombetas da mídia.
A ética foi escancaradamente banalizada e alcançou até mesmo a tradicional
distribuição de cargos da máquina pública. Antes aceita, passou a ser
condenada. Chegou-se à criminalização da política. Alguns índices de abstenção,
o primeiro turno das eleições municipais de 2010, ainda em curso, refletem
isso.
Apesar disso a propaganda do combate à corrupção não deu
certo. Em 2006, Lula foi reeleito e, em 2010, elegeu Dilma. Um ás que tirou da
manga.
O que falhou no golpe da oposição? Basicamente, faltou
combinar com o eleitor. Chegou-se a achar que o povão, o eleitor pobre, não
tinha ética. O povo, porém, como apregoa conhecido refrão, não é bobo. Tinha,
na verdade, a informação essencial transmitida pelos benefícios de uma
administração que resgatava milhões de marginalizados para incluí-los no
processo econômico. A coisa não para aí. Tem mais.
Recentemente, Márcia Cavalari, diretora executiva do Ibope,
concluiu um levantamento sobre mudança na agenda dos “principais problemas
brasileiros”, segundo o eleitor (Tabela). Os dados são tirados, essencialmente,
das pesquisas daquele instituto. Em 11 anos, de 1989 a 2010, houve alterações
significativas nessa agenda.
Observados os percentuais do levantamento e, claro,
principalmente os resultados das urnas nesse período, fica bem visível que o
eleitor, embora condene, não vê a corrupção como principal adversário. No
período pesquisado, o combate a esse crime baixou do 5º para o 6º lugar no
elenco dos problemas a partir de queda de cinco pontos percentuais na escala
das indicações.
Curiosidade à margem do tema: caiu radicalmente a preocupação
com a inflação, diminui significativamente a preocupação com a habitação e
desapareceu a referência à dívida externa. Contrariamente, porém, surgiram as
drogas com percentual elevado na lista de apreensões dos brasileiros.
Essa preocupação secundária com o combate à corrupção mostra
que os eleitores entregam o voto para candidatos preocupados com a inflação –
FHC valeu-se disso, em 2002, para ganhar a eleição montado no Plano Real – com
a Saúde, com a Educação, a Segurança Pública e o Desemprego. Por fim, porém não
menos importante, a Distribuição de Renda, que elegeu e reelegeu Lula e, em
seguida, elegeu Dilma.
O eleitor sabe do que precisa. O moralista que duvidar que
atire nele a primeira pedra.”
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