por Alipio Freire, em Brasil de Fato
Segundo Jean-Paul Sartre, não é o torturador que faz a tortura, mas a prática da tortura que faz o torturador. Concordando, afirmamos: não é o fascista que faz o fascismo. São as práticas fascistas que fazem os fascistas.
Outrora temíamos a volta do fascismo. Hoje, vivemos às vésperas da lei de Gerson ser erigida (oficialmente) em capítulo primeiro das constituições de “estados democráticos”, e da impunidade das elites e dos agentes do seu Estado ser transformada em jurisprudência. Oficiosamente, o Mundo já parece funcionar assim.
A naturalização dos massacres dos mais pobres por agentes do Estado ou milícias privadas; a convivência promíscua com a corrupção; a flexibilização do conceito de tortura e definição de “circunstâncias” em que ela pode/deve ser utilizada; os poderes das Repúblicas controlados e exercidos pelos dossiês (chantagens); a delação premiada como estatuto legal; o medo e o pânico como alavancas da paz social; mecanismos de controle dos indivíduos em nome da sua segurança pessoal, como câmeras e gravadores espalhados por toda parte, muitas vezes com o apelo cínico e patético: “sorria, você está sendo filmado” (e muitos sorriem); a valorização das pessoas pelo que são capazes de consumir; a vida pública e a vida privada mercantilizadas como espetáculo; a substituição do conceito de autodeterminação dos povos pelo de “soberania relativa”, implicando invasões, guerras e destruições de povos em nome da democracia e da paz internacional; o acobertamento das disputas de mercados e de classes, por “guerras religiosas”; o moralismo cada vez mais torto e hipócrita a serviço de escândalos capazes de vender jornais, revistas, programas de tv, rádio, etc.; o silêncio da grande maioria dos que mais sabem; enfim, a banalização do mal.
A lista é infinita.
Ou seja, as práticas fascistas estão instaladas no dia a dia.
Agora, só falta um pouco mais de prática intensiva desses valores para que os quadros do fascismo emirjam viçosos e despojados de qualquer conveniência.
E eles estão se formando: na direita e na esquerda.
Alipio Freire, jornalista e escritor, integra o Conselho Editorial do Brasil de Fato e da Editora Expressão Popular.
Nenhum comentário:
Postar um comentário