O que pode haver de mais vexatório ou constrangedor do que uma criança, diante das câmeras, ser forçada a recordar cenas terríveis até que as lágrimas escorram pelo seu rosto?
Por: Laurindo Lalo Leal Filho
Pouco menos de 24 horas depois do massacre de Realengo, na manhã de sexta-feira, 8 de abril, a apresentadora do programa matinal da Rede Globo, Ana Maria Braga, levava ao estúdio e colocava no ar uma das meninas sobreviventes da tragédia. Seu primeiro comentário foi sobre a aparência da garota, diferente daquela que vira no dia anterior, durante a cobertura dos crimes.
Além de produzida especialmente para o programa, a menina teve de reviver os momentos dramáticos passados em sala de aula e contar que faziam uma prova de Ciências na hora do atentado. Sem nenhuma sensibilidade, Ana Maria Braga perguntou: “Vocês acabaram a prova?” Seria cômico se não estivéssemos falando de uma tragédia sem precedentes no Brasil.
Como em casos anteriores, o da menina Isabela Nardoni e o da jovem Eloá, por exemplo, a TV transformou o que já era trágico em um show de horrores. Dessa vez, dado o número de vítimas, o espetáculo ganhou dimensões ainda maiores. Os telespectadores ficam presos a ele movidos por sentimentos ambivalentes: o medo de passar pela mesma situação e o alívio por não terem sofrido o mesmo drama. As emissoras, por sua vez, sabem como explorar essa tensão para manter os olhos do público fixos na tela.
Mas a responsabilidade não é só dos canais de TV, ávidos por segurar a audiência através do medo. É também das autoridades públicas. Em vez de exibidas como animais exóticos nesses programas, as crianças deveriam estar recebendo, naquele momento, apoio de psicólogos e assistentes sociais do Estado, protegidas do assédio de câmeras e microfones – o que vale também para seus familiares.
Nenhum comentário:
Postar um comentário