por Luiz
Carlos Azenha
Na
semana seguinte às eleições municipais em que Fernando Haddad derrotou José
Serra em São Paulo, episódios estranhos começaram a acontecer em torno do
premiado repórter Amaury Ribeiro Jr., autor do livro Privataria Tucana,
o best seller que vendeu 150 mil cópias.
Primeiro,
ele foi procurado por telefone por um homem de Guarulhos que prometeu
documentos relativos à Operação Parasita, da polícia paulista, que investigou
empresas que cometiam fraudes na área da saúde. Foi marcada uma reunião,
mas a fonte se negou a entrar no local de trabalho de Amaury. Quando se
encontraram pessoalmente, do lado de fora, a história mudou: o homem ofereceu a
Amaury a venda de material secreto que teria como origem o despachante Dirceu
Garcia.
No
inquérito da Polícia Federal que apura a quebra de sigilo de dirigentes do
PSDB, aberto durante a campanha eleitoral de 2010, Dirceu é a única testemunha
que acusa Amaury de ter participado da violação. “Novamente, estão querendo
armar contra mim”, diz Amaury. “Mas desta vez a trama foi toda gravada por
câmera de segurança”.
Em
seguida, outra situação nebulosa, desta vez supostamente para atingir a Editora
Geração Editorial, que publicou o Privataria Tucana. Um
“ganso” da polícia paulista marcou encontro com o diretor de comunicação,
William Novaes, com o objetivo de entregar um dossiê que incriminaria vários
políticos tucanos, entre eles o ex-senador Tasso Jereissati.
O
encontro, do qual Amaury também participou, foi gravado por câmeras ocultas.
Amaury acredita que o objetivo era entregar à editora material falso que
pudesse ser usado para desqualificar seu livro. Diante da recusa, a mesma
suposta “fonte”, que responde a vários processos por estelionato, ligou para a
editora dias depois dizendo que Amaury corria risco de vida.
“Acredito
que eles pretendiam me acusar de obstruir o processo em andamento, o que
poderia até resultar em minha prisão”, avalia o repórter.
Na
mesma semana, narra Amaury, o ex-sub-procurador da República, hoje advogado
José Roberto Santoro, que
segundo a revista Veja tem ligações com o tucano José Serra, procurou a
direção do jornal O Tempo, de Minas Gerais, para intermediar um
encontro com a direção do jornal Hoje em Dia, onde Amaury mantém
coluna semanal.
O
objetivo, segundo o repórter, seria reclamar de uma nota publicada na coluna de
Amaury relativa a uma mineradora de Minas e ao ex-governador do Espírito Santo,
Paulo Hartung. Mas, de acordo com Amaury, no encontro Santoro não reclamou
objetivamente do conteúdo da coluna. “Ele ficou falando mal de mim, tentando
levar à minha demissão e quando foi advertido pelos diretores do jornal
aumentou ainda mais o tom de voz, como se estivesse numa crise histérica”, diz
o repórter. A coluna continua a ser publicada.
Qual
seria a explicação para esta sequência de eventos?
Amaury
sustenta: “Está ocorrendo um verdadeiro complô, articulado provavelmente por
tucanos, com apoio de setores da Polícia Federal e do Ministério Público
Federal. O objetivo é derrubar primeiro o Lula e depois atingir a presidenta
Dilma”.
Aqui,
é importante lembrar que, na campanha de 2010, Amaury foi acusado pela mídia de
integrar um grupo de inteligência a serviço da campanha de Dilma Rousseff,
aquele que teria violado o sigilo fiscal de tucanos. O repórter nega: “Estão
querendo requentar um assunto velho, que sumiu das páginas dos jornais logo
depois das eleições de 2010. Pelo jeito vai voltar já pensando em 2014. Talvez
estejam pensando em me usar para chegar na Dilma”.
Amaury
estranha que o processo sobre a violação do sigilo de tucanos tenha voltado a
andar uma semana depois das eleições de 2012, quando foram chamados para depor
o jornalista Luiz Lanzetta e o secretário particular do diretor de redação
do Correio Braziliense e do Estado de Minas,
Josemar Gimenez.
Lanzetta
trabalhou na campanha de Dilma e foi acusado de ser o chefe do suposto núcleo
de inteligência. Quanto a Josemar, Amaury trabalhou em O Estado de
Minas, onde deu sequência à apuração dos fatos que resultaram no livro Privataria
Tucana. O repórter enfatiza sempre que baseou o livro em documentos
públicos obtidos em juntas comerciais e cartórios, na CPI do Banestado e
no Exterior.
Aqui,
pausa para uma bomba: segundo Amaury, o presidente do PSDB, Sergio Guerra,
entrou na Justiça de Brasília com uma ação em que pede a retirada de circulação
do livro, alegando que o Privataria Tucanacausa danos morais a
caciques do partido. O pedido foi feito durante a campanha de 2012 mas até hoje
a Justiça não se pronunciou.
“Com
certeza, o livro provocou muitos estragos nas eleições. Com certeza continuará
provocando. O curioso é que eles nunca respondem especificamente às acusações
ou documentos mostrados no livro”, diz Amaury.
Ele
também estranha que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que
recebeu dezenas de livros pelos Correios, de leitores indignados com o
conteúdo, não tenha aberto um procedimento para apurar as denúncias.
Amaury entregou parte dos documentos utilizados no Privataria
à Polícia Federal, que até hoje não abriu inquérito.
Além
disso, apesar de o deputado federal e ex-delegado da PF Protógenes Queiroz
(PCdoB-SP) ter conseguido o número de assinaturas necessárias à abertura da CPI
da Privataria, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), parece ter sentado
sobre o assunto.
NOVO
LIVRO
Desde
o lançamento do Privataria Tucana, Amaury fala em escrever a
sequência. O livro já tem nome:Privataria 2, o Grande Complô.
Viomundo:
Amaury, do que tratará o livro?
Amaury:
Vou mostrar como funciona o núcleo de inteligência do PSDB, que domina até hoje
setores da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Eles se movimentam
para desarticular o ex-presidente Lula e futuramente a presidenta Dilma. Quero
mostrar porque o PT não reage. No caso da CPI do Cachoeira, tinha a faca e o
queijo na mão para investigar melhor a relação entre o bicheiro e a
revista Veja.
Viomundo:
Você tem explicação para o recuo do relator Odair Cunha (PT-MG)?
Amaury:
O PT parece abafar todos os casos. Suspeito que é por um motivo simples. Herdou
e deu continuidade a esquemas dos tucanos. No caso do Odair Cunha, devemos
lembrar que o ex-sócio dele, que é da região de Boa Esperança, em Minas Gerais,
se tornou diretor de Furnas e controla verbas e cargos. Será que tem o rabo
preso e os tucanos descobriram?
Viomundo:
E a CPI da Privataria, agora sai?
Amaury:
Acho que não sai. Tudo indica que o PT tenha herdado o esquema promíscuo
que os tucanos tinham com as empresas de telecomunicações. Diante da nova
denúncia do Marcos Valério, que diz que a Brasil Telecom teria doado 7 milhões
de reais ao PT, o partido vai ficar totalmente desmoralizado se a CPI não for
aberta. Se não for aberta, vai ficar bem claro que eles temem que as
investigações atinjam o próprio PT.
Viomundo:
O líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto, chegou a convidar o ex-presidente FHC
para falar sobre a lista de Furnas. Mas foi desautorizado pelo líder do PT no
Senado, Walter Pinheiro. Afinal, essa lista de Furnas é falsa, como afirmam os
tucanos?
Amaury:
O laudo da perícia da Polícia Federal diz que é verdadeira. A lista mostra
doações de campanha feitas por um esquema montado em Furnas para vários
caciques do PSDB, dentre os quais Aécio Neves, Geraldo Alckmin e José
Serra. O caso foi denunciado na Justiça federal do Rio de Janeiro pela
procuradora Andrea Bayão Ferreira, que em seu relatório diz não ter dúvidas da
existência do esquema, que era abastecido por empresas fornecedoras de Furnas.
Mas a Justiça Federal transferiu o caso para a Justiça estadual do Rio de
Janeiro, apesar de Furnas ser uma estatal federal. É outro caso no qual o
procurador Gurgel não tomou qualquer providência. Será que ele faria o mesmo se
fosse um esquema petista?
Viomundo:
E essa história do mensalão tucano, anda?
Amaury:
Mais uma vez houve tratamento diferenciado ao PSDB. No caso do mensalão
tucano, houve desmembramento das investigações, encaminhadas à Justiça de
Minas. No STF só serão julgados os reús com foro privilegiado. Vai ficar mais
difícil montar o quebra-cabeças que facilitaria a condenação, como foi o caso
do mensalão petista. As teorias do Gurgel não teriam vingado se tivesse havido
desmembramento também no mensalão petista. No caso dos tucanos, houve.
Viomundo:
Lula nunca falou sobre a Operação Porto Seguro, aquela que desvendou um esquema
de tráfico de influência nas agências reguladoras e que teria a participação de
Rosemary Nogueira. A mídia explorou o que define como “relações íntimas”
entre o ex-presidente Lula e Rosemary. O que te pareceu o caso?
Amaury:
São denúncias sérias, que devem ser apuradas. Mas outra vez a imprensa, a
Polícia Federal e o Ministério Público dão tratamento desigual a petistas e
tucanos. Devemos lembrar que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
acreditava ter tido um filho com uma jornalista da Globo e a imprensa não só
calou a respeito durante quase duas décadas como ajudou a abafar o caso. Uma
concessionária pública, a Globo, transferiu a mãe do menino para a Espanha.
Conheço bem essa história. Nunca toquei no assunto por se tratar da vida
pessoal. Mas diante do cinismo da imprensa estou pensando em incluir no livro
algumas revelações sobre como era o esquema para sustentar mãe e filho na
Europa. É jornalistacamente relevante por se tratar de dinheiro de caixa dois,
de financiamento de campanha. Tenho uma testemunha que sabe de tudo.
Viomundo:
Você não poupa nem a PF, que vem trabalhando como nunca?
Amaury:
O governo é petista, mas há um núcleo tucano na PF, tanto que a presidente da
República só ficou sabendo da Operação Porto Seguro depois que ela foi
deflagrada. O ministro da Justiça apareceu na TV com aquela cara de bobo, ficou
vendido. Vale lembrar que o início das investigações se deu pelas mãos do
serviço de inteligência do PSDB, que cooptou testemunhas para levar o caso
adiante. Meu livro vai contar os detalhes de como isso aconteceu. Vai também
desnudar as relações promíscuas entre integrantes do Ministério Público e da
Polícia Federal com o alto tucanato. Como vou sustentar, é mesmo um grande
complô.
Viomundo:
Mas se a Rosemary foi exonerada no dia seguinte à operação da PF, Dilma não
sabia de nada antecipadamente? Há especulação de que ela deixou andar
justamente para eliminar um núcleo de corrupção que herdou do governo Lula…
Amaury:
Essa é a grande pergunta, até hoje não foi respondida. Pretendo responder no
livro.
Viomundo:
Já que estamos no campo das especulações, e a boataria sobre a saída de Dilma
do PT para o PDT?
Amaury:
Seria um suicídio político. No PDT há uma briga de vida e morte entre a família
Brizola e o ex-ministro Carlos Lupi. Só faria sentido ela sair do PT se o Lula
fosse candidato em 2014, o que o atual quadro político não indica.
Viomundo:
E essas gravações que você fez, do pessoal que tentou armar contra você, vão
entrar no livro?
Amaury:
Com certeza, mas antes vou entregar todo o material à Polícia Federal e à
Justiça. Quero deixar claríssimo que eles escolhem os casos para investigar e
punir. Como eles até agora não tomaram providências, pretendo entrar com representações
na PF e no Ministério Público pedindo a apuração das denúncias contidas
no Privataria Tucana. Quero ver eles sentarem em cima do assunto.
Pelo jeito só vai me restar fazer denúncias fora do Brasil por meio da
ICIJ, International Consortium of
Investigative Journalists, entidade que tem sede nos Estados Unidos e
representação em dezenas de paises. Fui o primeiro repórter brasileiro a
integrar a entidade e estou pensando em acioná-la se as autoridades brasileiras
não tomarem providências.
Nenhum comentário:
Postar um comentário