Queridos amigos e queridas amigas,
Ao longo da vida, enfrentei duras batalhas.
Primeiro, como líder sindical, durante a ditadura militar,
lutando pelos direitos dos trabalhadores e pela conquista da democracia.
Depois, como líder partidário, para fazer chegar ao poder,
pelo voto democrático, um projeto político que fizesse o país retomar o
crescimento econômico, gerar empregos, promover a inclusão e reduzir a
desigualdade social. O que, felizmente, fomos capazes de realizar nos oito anos
em que presidi o meu país.
Quando soube que havia sido agraciado com o importante Prêmio
Internacional da Catalunha, em abril deste ano, tinha acabado de enfrentar a
mais desafiadora de todas as batalhas, a luta pela minha própria vida.
Eu tinha concluído o tratamento contra um câncer de laringe
que fora diagnosticado seis meses antes.
Venci, mas demorei muitos meses para me recuperar dos efeitos
colaterais da quimioterapia e da radioterapia.
Agora, já recuperado e pronto para novos embates, venho
receber e agradecer de todo o coração a generosidade da Catalunha.
Dessa Catalunha democrática e progressista, que desde a sua
heroica resistência ao fascismo, nos anos 30 do século passado, é um símbolo
internacional da luta pela liberdade e justiça social.
Minhas senhoras e meus senhores,
É com grande emoção que chego a Barcelona para receber esse
prêmio, do qual me orgulho duplamente.
Eu me orgulho porque, como presidente do Brasil, busquei um
caminho que unisse crescimento econômico e distribuição de renda. Naquele
momento, grande parte do mundo considerava como verdades os dogmas do chamado
Consenso de Washington, que davam garantias ao capital especulativo e relegavam
a segundo plano o bem-estar dos seres humanos. Adotamos outro modelo de
desenvolvimento, privilegiando a economia real. Esse novo paradigma mudou para
melhor a situação do meu país e, sobretudo, as condições de vida da população
brasileira.
O Brasil não se projetou no cenário internacional somente
porque se tornou a sexta maior economia do mundo, com a perspectiva de
tornar-se a quinta nos próximos anos.
O Brasil é reconhecido principalmente porque é hoje uma nação
mais justa. Porque tirou da extrema pobreza 28 milhões de brasileiros e
promoveu a ascensão de quase 40 milhões de pobres à classe média.
Também me orgulho por receber o mesmo prêmio que foi
conferido, em 2006, ao brasileiro-catalão Dom Pedro Casaldáliga, em
reconhecimento à luta por ele travada em defesa da dignidade do povo pobre da
Amazônia brasileira.
A bíblia diz que todos os homens foram feitos à imagem e
semelhança de Deus.
Dom Pedro levou esse ensinamento ao limite e sempre viu a
face de Deus no rosto de cada um dos desprotegidos daquela região do Araguaia,
onde se fixou, e a qual dedicou a sua vida.
Casaldáliga levou ao meu país a força espiritual da
Catalunha. Nosso bispo, forjado na tradição libertária catalã, é uma referência
moral e política para todos os democratas brasileiros.
Além do mais, como o excelente poeta que é, ele encarna no
Brasil, o talento notório dessa terra que nos deu Gaudí, Miró e inúmeros outros
magníficos artistas.
Amigos e amigas,
Recebo essa homenagem em nome de todo o povo brasileiro, que
foi o grande responsável pelas conquistas do meu país nos últimos dez anos.
Nos oito anos do meu governo, e nos dois da querida
presidenta Dilma Rousseff, demostramos que o acesso do pobre aos direitos de
cidadania, e ao consumo, é capaz de estimular toda a economia.
O Brasil não distribuiu renda porque cresceu, mas cresceu
porque distribuiu renda.
Em 2003, quando assumimos o governo, lançamos o Programa Fome
Zero, com o objetivo de alimentar os que não tinham o que comer. Em outubro
daquele ano, lançamos o Programa Bolsa Família, já orientado para garantir uma
renda mínima mensal aos brasileiros mais pobres.
Vocês, que vivem num continente em que esses problemas foram
em grande parte superados há décadas, podem se espantar, mas a garantia de uma
renda mínima aos pobres brasileiros revolucionou a economia do meu país.
Os benefícios do Bolsa Família, dados através de um cartao
magnetico, impulsionaram fortemente o
nosso mercado interno.
O consumo da população pobre fez prosperar o comércio; o
setor de serviços passou a ser uma fonte de renda para aquela população que
vivia à margem da sociedade de consumo.
A política de transferência de renda, a ampliação do crédito,
a elevação do salário mínimo, entre outras medidas, aumentaram o poder de
compra das classes populares e possibilitaram a ascensão social de grandes
parcelas da população.
Todos os setores da economia se beneficiaram: alimentos,
vestuário, eletrodomésticos, automóveis e construção civil. Foram criados, em
10 anos, 18 milhões de empregos formais.
Foi esse aumento do poder de compra dos brasileiros pobres
que deu ao meu país condições de enfrentar as crises financeiras de 2008 e
2009.
Mais investimentos públicos e privados geraram mais emprego e
mais renda.
Estes foram os antídotos que nós usamos contra a crise
financeira que abalava o mundo, na contramão dos países que exigiam das nações
credoras uma política restritiva, que resultava em menos oportunidades, menos
renda e no sacrifício de parcelas já desprotegidas da população.
Caros amigos,
Existem várias formas de fazer política. Até dois anos atrás,
fiz política através de processos eleitorais democráticos. Foram os votos dos
meus conterrâneos que me deram legitimidade para defender, nos fóruns
internacionais, uma ordem internacional mais equilibrada e justa.
Encerrados dois mandatos eletivos de presidente, continuo a
fazer política porque tenho uma crença profunda na humanidade. Na capacidade
dos homens de lutar pela justiça.
Meu papel político, agora, é pregar que o desenvolvimento de
um país deve representar a prosperidade de todos os seus cidadãos.
E é pregar que o desenvolvimento global, da mesma forma, deve
ser o resultado do progresso de todos os continentes e de todos os países.
Este é o momento da inclusão dos pobres na economia dos seus
países, e dos países pobres na economia mundial.
E gostaria de dedicar esse prêmio, que tanto me emociona, a
todas as pessoas que acreditam e lutam por um mundo menos desigual.
Muito obrigado.
do Instituto Lula
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