A decisão sobre o futuro do antigo “maior do mundo” começa
este mês. De um lado, o governo anunciou ter adiado a publicação do edital de
concessão, mas a avaliação do movimento O Maraca é Nosso, integrante do Comitê
Popular da Copa, é de que os planos oficiais sejam frear a crescente
mobilização em torno da discussão sobre o futuro do local. Projeto prevê
realização do plebiscito para definição do futuro do Maracanã.
Rodrigo Otávio
Rio de Janeiro - “Treino saltos ornamentais no Júlio Delamare
desde 2000. Estou visando as Olimpíadas de 2016, mas para isso eu preciso
treinar, e agora querem demolir o estádio. Eu quero a minha piscina para
treinar!”, disse Mônica Amaral, atleta da seleção brasileira júnior de Saltos
Ornamentais, medalha de prata no campeonato Sul-Americano do Chile em 2011,
neste sábado (1), no Rio de Janeiro, durante passeata contra a privatização do
estádio do Maracanã e as demolições do parque aquático Julio Delamare, do
estádio de atletismo Célio de Barros, da escola municipal Friedenreich e do
prédio do antigo Museu do Índio que o governo do Estado pretende fazer no
contexto das obras do complexo do Maracanã para a Copa 2014.
O protesto reuniu cerca de mil pessoas, que saíram da praça
Saens Peña e percorreram as ruas da Tijuca em direção ao Maracanã conclamando a
população a pressionar o poder público para a realização de um plebiscito que
decida se o estádio deve ser entregue à administração privada ou permanecer nas
mãos do Estado após o término das obras.
Ao chegarem ao complexo esportivo, os manifestantes se
depararam com o usual cenário. No Célio de Barros, alunos de escolas do ensino
básico participavam de provas de atletismo, com mais da metade das
arquibancadas tomada por familiares e entusiastas; no Júlio Delamare,
competição do Troféu Brasil de saltos ornamentais, com a participação de Mônica
Amaral.
No Maracanãzinho, o contraponto. Seguranças engravatados
abrindo caminhos para carros de luxo escanteavam o esporte e promoviam o show
business. A apresentadora Xuxa gravava ali o especial de Natal da TV Globo. A
reportagem de Carta Maior tentou saber, sem sucesso, quanto a emissora de
televisão pagou ao Estado pelo aluguel do local em um sábado, dia mundialmente
dedicado à prática de competições esportivas.
Nos planos do governo do Estado, mais estacionamentos e lojas
com as demolições e a transformação do Maracanãzinho em arena multiuso. Na
outra ponta da transação, as empresas do senhor Eike Batista aparecem como as
principais favoritas a administrarem o (ex) complexo esportivo, principalmente
após fazerem o estudo de viabilidade da concessão ao custo de R$ 2,3 milhões,
pagos pelo poder público.
De acordo com o Comitê Popular da Copa e das Olimpíadas, as
contas do negócio são escandalosas. Após investir cerca de R$ 1,5 bilhão em
diferentes reformas do Maracanã desde 1999, o governo do Estado passaria o
estádio à administração privada por 35 anos, recebendo R$ 7 milhões anuais. Por
sua vez, Eike Batista investiria cerca de R$ 400 milhões caso a licitação seja
aprovada, e deve faturar pelo menos R$ 2,5 bi ao longo dos 35 anos.
O jogo
A decisão sobre o futuro do antigo “maior do mundo” começa
este mês. De um lado, o governo anunciou ter adiado a publicação do edital de
concessão, mas a avaliação do movimento O Maraca é Nosso, integrante do Comitê
Popular da Copa, é de que os planos oficiais sejam frear a crescente
mobilização em torno da discussão sobre o futuro do local. “Achamos que na
próxima semana mesmo eles vão publicar o edital. Mas isso não esmorece a luta;
ao contrário, fortalece. A partir da publicação do edital ainda temos muito
campo de pressão popular para um recuo do governo”, disse Gustavo Mehl,
integrante do Maraca é Nosso, em frente à estatua do Bellini, tradicional ponte
de encontro de torcedores antes do início de jogos no estádio.
Na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj)
foi publicado na quinta-feira (29) projeto de Resolução que determina a
realização do plebiscito para a definição do futuro do Maracanã. Apesar da
maioria governista, o projeto foi assinado por 33 deputados, e depois de passar
pela comissão de Constituição e Justiça deve ir a plenário, quando terá que
receber 36 votos dos 70 deputados da casa para se tornar uma obrigação do
governo e o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) marcar a data do plebiscito,
independente do edital de licitação ter sido publicado ou não.
Presente à passeata, o deputado estadual Marcelo Freixo
(Psol) aposta na mobilização popular, mas lembra o poder de coerção do governo
Sergio Cabral sobre os deputados da Alerj para enterrar a possibilidade de
plebiscito. Um dos expedientes mais utilizados pela bancada governista é a
falta de quórum em dia de votações importantes para que uma definição fique
sendo adiada até a proposta sair de pauta. “Só depende da casa colocar em
votação. A hora que quiser coloca, só falta é vontade política. Eles têm
maioria, se não tiver pressão popular, manifestações como essa daqui hoje, não
tem jeito”, disse Freixo.
Museu do Índio
Enquanto estuda a tática a ser utilizada no plenário da
Alerj, o rolo compressor do governo Sergio Cabral avança no entorno do estádio.
Após o Estado formalizar por R$ 60 milhões a compra do terreno onde está
localizado o prédio do antigo Museu do Índio, que ultimamente pertencia à
Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a presidenta do Tribunal Regional
Federal da 2ª Região (TRF-2), desembargadora federal Maria Helena Cisne, cassou
duas liminares que impediam a demolição do prédio que funcionou como museu de
1910 até 1978 e a retirada dos índios que residem na hoje Aldeia Maracanã.
Escola Friedenrich
Já na escola municipal Friedenrich, batizada em homenagem ao
ex-jogador de futebol Arthur Friedenrich (1892-1969), o estilo botinudo do
governo estadual e municipal terá que enfrentar o Ministério Público estadual.
O órgão entrou com ação civil pública contra a demolição do prédio da escola,
que fica entre o Maracanãzinho e a rampa de acesso ao Maracanã. Segundo a ação,
o Estado e o Município não podem impedir, inviabilizar ou limitar o direito à
educação no atual prédio.
A ação se baseou em inquérito público iniciado em 2009,
quando autoridades municipais e estaduais afirmaram que contratos assinados
para a elaboração de projetos e execução das obras para a Copa 2014 não previam
intervenções na escola. A ação prevê multa de R$ 5 mil diários caso o governo
desrespeite os termos.
Sérgio Cabral também não gosta de ter que demoliar uma escola ou um museu, mas é necessário!
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