Em que pese a importância das redes sociais e da internet
para o debate sobre as virtudes e defeitos dos meios de comunicação, nas
universidades a crítica definha
Por: Lalo Leal, para Revista do Brasil
Jornais, revistas, o rádio e a televisão tratam de quase tudo
sem restrição. Apenas um assunto é tabu: eles mesmos. Se hoje a internet tem
papel relevante nesse debate sobre a mídia, na academia houve retrocesso. O
programa Globo Universidade, das Organizações Globo, tem parcela importante de
responsabilidade nessa mudança. Surgiu com o objetivo de neutralizar aquela que
era uma das poucas áreas em que se realizava uma análise crítica sistemática
dos meios de comunicação. Passou a financiar laboratórios de pesquisa e eventos
científicos, e, com isso, um objeto de investigação, no caso a própria Globo,
tornou-se patrocinador do investigador, retirando da pesquisa a necessária
isenção. Fez na comunicação o que a indústria farmacêutica faz com a medicina,
bancando viagens e congressos médicos para propagandear remédios.
O resultado prático pode ser visto no número crescente de
trabalhos acadêmicos sobre o uso de novas tecnologias associadas à TV e as
formas de aplicação de seus resultados pelo mercado. Enfatizam cada vez mais o
papel do receptor como elemento capaz de selecionar, a seu critério, os
conteúdos que lhe interessam. Fazem, dessa forma, o jogo dos controladores dos
meios, retirando deles a responsabilidade por aquilo que é veiculado. Fica tudo
nas costas do pobre receptor. Esquecem o fenômeno da concentração dos meios que
reduz o mundo a uma pauta única, com pouca diferenciação entre os veículos.
Dizem em linguagem empolada o que empresários de TV costumam
expressar de modo simples: “O melhor controle é o controle remoto”. Como se ao
mudar de canal fosse possível ver algo muito diferente.
Cresce também o número de empresas de comunicação que
oferecem cursos até em universidades públicas, retirando dessas instituições o
espaço do debate e da crítica. Saem dos cursos de comunicação jovens adestrados
para o mercado, capazes de se tornar bons profissionais. No entanto, a débil
formação geral recebida os impedirá de pôr os conhecimentos obtidos a serviço
da cidadania e da transformação social.
O papel político desempenhado pelos meios de comunicação e a
análise criteriosa dos conteúdos emitidos ficam em segundo plano, tanto na
pesquisa como no ensino. Foi-se o tempo em que, logo dos primeiros anos do
curso, praticava-se a comunicação comparada, com exercícios capazes de identificar
as linhas político-editoriais adotadas pelos diferentes veículos. Caso fosse
aplicada hoje, mostraria, com certeza, a uniformidade das pautas, com jornais e
telejornais reduzindo os acontecimentos a meia dúzia de fatos capazes de
“render matéria”. Mas poderia, em alguns momentos excepcionais, realçar
diferenças significativas, imperceptíveis aos olhos do receptor comum.
Como no caso ocorrido logo após a condenação de José Dirceu
pelo STF. Ao sair de uma reunião, o líder do PT na Câmara dos Deputados, Jilmar
Tatto, foi abordado por vários repórteres. Queriam saber sua opinião sobre o
veredicto do Supremo. Claro que ele deu apenas uma resposta, mas para quem viu
os telejornais da Rede TV e da Globo foram respostas diferentes. Na primeira
Tatto dizia: “A Corte tem autonomia soberana e pagamos alto preço por isso. E
só espero que essa jurisprudência usada pelo STF continue e que tenha o mesmo
tratamento com os acusados do PSDB”. Na Globo a frase sobre o “mensalão tucano”
desapareceu.
Em casa o telespectador, mesmo vendo os dois jornais,
dificilmente perceberia a diferença entre ambos, dada a sequência rápida das
imagens. Mas para a universidade seria um excelente mote de pesquisa cujos
resultados teriam uma importância sociopolítica muito maior do que longos
discursos sobre transmídias e receptores.
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