Prefeito de São Paulo vai realizando gestão hiperativa; em
menos de três semanas no cargo, resgatou diálogo com pobres e classe média,
embargou uma obra rica, suspendeu contratos suspeitos, atacou as enchetes,
articulou-se com cidade vizinhas e abriu a delicada discussão sobre a
renegociação das dívidas municipais; além disso, recebeu seu maior aliado e
deixou-se fotografar ao lado dele; para alguns, essa lealdade é imperdoável
– Qual é a novidade?
Antes de completar três semanas de governo, o novo prefeito
de São Paulo criou praticamente um fato administrativo por dia. Fernando Haddad
iniciou sua gestão estabelecendo quase duas dezenas de providências práticas
para amenizar os efeitos das chuvas sobre São Paulo. Em seguida, sem medo de
caras feias, encarou pessoalmente os invasores de prédios abandonados no centro
da capital, não para fazer concessões fáceis, mas para reafirmar sua proposta
de construir de 55 mil casas populares até o final da gestão. Diante da classe
média, enfrentou um auditório com duzentos integrantes da Rede Nossa São Paulo,
sendo questionando e respondendo. Em ambos os casos, resgatou algo perdido na
poeira do tempo na administração municipal, o diálogo. Com mão pesada, por outro
lado, mandou embargar a construção de um prédio de luxo feito fora das regras
legais na região mais nobre da cidade, o Ibirapuera. Uma herança do ex-todo
poderoso Hussain Aref Saab, por longa data diretor do Departamento de Aprovação
de Edificações. A respeito das áreas mais pobres, o prefeito já avisou que
ordenará remoções, a serem feitas até mesmo pela Polícia Militar, de casebres
instalados em áreas de risco de cheias de rios ou desmoronamentos. Com a
caneta, determinou a revisão de cinco grandes contratos em vigência desde a
gestão passada, suspeitos de irregularidades como superfaturamento. A partir da
força do cargo, abriu na macropolítica, com o governo federal, a discussão
sobre a renegociação das dívidas municipais com a União, tocando num assunto delicado
para a presidente Dilma Roussef e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mas do
interesse direto e imediato de São Paulo.
Dois dias atrás, Haddad recebeu na sede municipal seu maior
aliado e permitiu que se tirassem fotos do encontro – para a mídia tradicional,
essa foi, sem dúvida, a grande novidade.
Pela recepção a Lula, Haddad foi chamado, nesta sexta-feira
18, de "pau mandado" pela certamente principal colunista política do
jornal Folha de S. Paulo, Eliane Cantanhêde. Em editorial, o concorrente O
Estado de S. Paulo descreveu a cena do ex-presidente sentado à mesa de reuniões
do gabinete do prefeito para chegar, com outras palavras, à mesma conclusão da
"inversão de papéis": "Fernando Haddad - eis o "pequeno
detalhe" - está à disposição de Lula desde quando este o pinçou do
Ministério da Educação e do celibato eleitoral para devolver ao PT o governo da
maior cidade brasileira, perdido em 2004". Na véspera, O Globo, do Rio de
Janeiro, destacou em sua primeira página que estava sendo aplicada em São
Paulo, a partir da reunião entre Lula, Haddad e dez secretários municipais
"a teoria do poste".
Nota-se pela listagem de seus primeiros atos como prefeito
que Haddad fará uma administração hiperativa. Ele tem almoçado em seu próprio
gabinete, vai cumprindo uma jornada diária de trabalho superior a 12 horas,
despacha com entre três e quatro secretários simultaneamente, para que as áreas
afins a um determinado problema ajam em coordenação e, conforme prometeu em
campanha, procura ser transparente.
Para a mídia tradicional, esse prefeito real praticamente não
existe. A partir de uma fotografia, ele é o "pau mandado" e segue
sendo apenas "um poste".
Por outro ângulo, bem diverso do enfocado pelos jornais de
papel, o que Haddad fez ao, na prática, estender a Lula o tapete vermelho da
Prefeitura, não foi nada além que deveria ter sido absolutamente esperado por
todos. Alguma vez Haddad encobriu o fato de que Lula é, sim, seu maior mentor e
foi seu principal cabo eleitoral? Houve momento em que o prefeito deixou de
expressar admiração pelo ex-presidente, com quem gosta de lembrar ter
trabalhado por cinco anos diretamente? A quem Haddad procurou, logo em seguida
à vitória, para agradecer pelo apoio, se não Lula no Instituto Lula, no bairro
do Ipiranga?
Ao 247, na quinta-feira 17, quando já se mostravam as
primeiras repercussões midiáticas das cenas de Lula em seu gabinete, o prefeito
expressou surpresa. "Não reparei no que eles (os jornais) disseram, mas os
jornais podem falar o que quiserem", disse. "O que foi mesmo?",
perguntou ele, para abrir um leve sorriso ao saber da "teoria do
poste" resgatada por O Globo. "Ora, se eu não posso receber na
Prefeitura uma referência da política brasileira como o ex-presidente Lula,
posso fazer o que?", rebateu, com ironia. O prefeito, além de não se
preocupar com as maledicências, não vê, até agora, qualquer problema no que
fez. Exatamente porque não há mesmo problema nenhum.
Como se viu, porém, a mídia tradicional gostou da fotografia
produzida na reunião de uma hora com o ex-presidente. O que esse setor da
sociedade na verdade não gosta é da lealdade política de Haddad para com Lula.
Uma lealdade do mesmo tipo da que une a presidente Dilma Rousseff a seu
antecessor. Eles fazem parte do mesmo campo político, dependem uns dos outros e
não escondem de ninguém suas ligações. Qual é a novidade?
A crítica que procura impingir em Haddad o estigma do
"pau mandado" poderia ter sucesso caso o prefeito não estivesse,
efetivamente, cumprindo o papel para o qual foi eleito. O elenco das primeiras
movimentações dele no cargo, porém, joga esse estigma por terra. Haddad é mesmo
um, digamos, lulista. Não esconde. Mas igualmente já vai se revelando um
prefeito dedicado e de posições firmes. O que alguns já não querem mostrar.
Marco Damiani _247
Posted by Paulo
Cavalcanti
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