Por: Alana Gandra, da
Agência Brasil
Rio de Janeiro – O
Brasil vai atravessar, nos próximos três ou quatro anos, uma grande mudança na
área financeira, disse o economista Ernani Teixeira Torres Filho, do Instituto
de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ).
“A queda da taxa de juros é só a cereja do
bolo que faltava para o mercado mudar e tornar o Brasil mais parecido com o
resto do mundo”, disse Torres Filho, ex-superintendente da Área de Pesquisa
Econômica do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Ele
participou do seminário O Brasil e o Mundo em 2022, evento comemorativo aos 60
anos do BNDES.
Torres Filho acredita
que as empresas e bancos vão começar a mudar e, nesse cenário, o BNDES também
vai se transformar. “Ele [o BNDES] não vai crescer como um banco de crédito da
mesma forma, porque o país vai em direção a utilizar créditos securitizados
[títulos do Tesouro Nacional, emitidos em decorrência de recebimento e
renegociação de dívidas da União assumidas por força de lei]. As empresas vão
começar a lançar mais títulos”.
Com isso, o mercado de
títulos no Brasil, que ainda é reduzido e controlado por bancos, na opinião do
professor da UFRJ, tende a crescer e o BNDES acompanhará essa transição. A
tendência é que o BNDES se firme cada vez mais como um banco de fomento de
longo prazo.
A ideia é que o BNDES
seja um banco de longo prazo, mas com flexibilidade. ”Ele tem que ser um banco
capaz de ocupar espaços ou de responder à necessidade da economia a cada
momento. Se o mercado privado se retrai e não dá crédito curto, eu acho que o
BNDES entra, dá crédito curto, e sai”. Torres Filho acredita que assim que o
mercado privado se aproximar do financiamento de mais longo prazo, o BNDES dará
crédito ainda mais longo.
O professor da UFRJ
advertiu que em uma concorrência aberta, dificilmente o BNDES terá capacidade
de concorrer de igual para igual com o mercado privado, porque não tem as
contas dos clientes nem todos os produtos financeiros que a rede privada
oferece. “Ele [BNDES] tem uma especificidade. A flexibilidade de um banco que
tem 20% do sistema de crédito na mão não é pouca coisa”, acredita.
Torres Filho reiterou
que para cumprir o seu papel de banco de fomento, o BNDES precisa ser flexível.
Para ele, os 60 anos do BNDES, completados este ano, mostram que a trajetória
da instituição foi clara nessa direção.
Crise
europeia
Em sua participação no
seminário, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, disse acreditar que os
dirigentes europeus tendem a encontrar uma solução rápida para a atual crise
econômica que se abate sobre aquele continente. “Eu acredito que as lideranças
políticas europeias, sempre que a perspectiva de um desastre venha a se aproximar,
terminarão acelerando determinadas soluções”.
Em entrevista após
abrir o evento comemorativo dos 60 anos do BNDES, Coutinho avaliou que a
solução para a crise externa, no curto prazo, viria por meio de uma união
bancária e um papel mais amplo e firme do Banco Central Europeu no mercado de
títulos, apoiando também, de forma direta, o fundo de estabilização.
“A solução existe. Ela é possível”. Segundo
Coutinho, a dificuldade é mais de cunho político e interna. No entender do
presidente do BNDES, o problema na Europa não é se a Grécia vai sair ou não da
zona do euro mas se as grandes economias o farão, como a Espanha e a Itália. “É
muito difícil supor que uma ruptura da Espanha ou da Itália possa ser absorvida
pelo sistema bancário, mesmo pelo sistema bancário alemão. Este cenário seria
ainda de alta volatilidade e muita incerteza nos próximos tempos”, disse.
Panorama
nacional
Ele afiançou, por outro
lado, que apesar da crise europeia, a economia brasileira tem condições de
crescer, “se seguir uma estratégia de reforço da sua capacidade própria de
investimento, aumentar a sua poupança doméstica, usar mais o seu mercado
interno, principalmente a fronteira de investimentos necessários em
infraestrutura para aumentar a capacidade competitiva da economia”.
O presidente do BNDES
concordou com o economista norte-americano Barry Eichengreen, segundo o qual o
Brasil tem condições de se tornar uma plataforma mundial, mas, para isso,
necessita investir em educação. Coutinho destacou que o país vem progredindo nessa
área, mas que precisa fazer mais. “Precisamos avançar fortemente em educação,
em produtividade no sistema empresarial brasileiro. Temos uma agenda muito
desafiadora. Mas o Brasil tem condições de partida mais favoráveis para
enfrentar um período muito difícil no cenário internacional”, ressaltou.
“Então, nós temos que tirar proveito dessas condições”, completou.
Em relação à taxa de
investimento, ele lembrou que o Brasil estava conseguindo elevar a taxa em
direção a 20% do Produto Interno Bruto (PIB), após oscilar durante muito tempo
em torno de 15% a 16%. “Não fosse a grande crise de 2008 para 2009, nós iríamos
ultrapassar 20%. A crise derrubou. Nós fizemos o caminho de volta. Subimos a
taxa. Tivemos um pequeno revés agora, no começo deste ano, porque a crise
externa se agravou. Mas nós vamos fazer o caminho de volta. A taxa de
investimento sobre o PIB no Brasil vai subir. Nós temos todas as condições de
impulsionar isso”, disse.
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