A situação europeia não pode ser compreendida sem considerar
a situação da economia mundial em sua totalidade. Hoje, após a reintegração da
China e a plena incorporação da Índia na economia capitalista mundial, a
densidade das relações de interconexão e a velocidade de interações no mercado
alcançaram um nível jamais visto anteriormente. O que prevalece hoje na arena
mundial é o que Marx chama de “anarquia da produção”. Alguns Estados, os que
ainda têm meios para isso, são cada vez mais os agentes ativos dessa
competição. E único Estado que conserva esses meios na Europa continental é a
Alemanha.
François Chesnais - SinPermiso
A crise financeira europeia é a manifestação, na esfera das
finanças, da situação de semiparalisia na qual se encontra a economia mundial.
Neste momento é sua manifestação mais visível, mas de modo nenhum a única. As
políticas de austeridade aplicadas simultaneamente na maior parte dos países da
União Europeia contribuem para a espiral recessiva mundial, mas não são sua
única causa.
Foram eloquentes as manchetes da nota de perspectiva de
setembro de 2011 da OCDE: “A atividade mundial está perto da estagnação”; “O
comércio mundial se contraiu, os desequilíbrios mundiais persistem”; “No
mercado de trabalho, as melhoras são cada vez menos perceptíveis”; “A confiança
diminuiu”, etc. Após as projeções de Eurostat, em meados de novembro, apontando
uma contração econômica da UE, da qual nem a Alemanha escaparia, a nota da OCDE
de 28 de novembro assinala uma “considerável deterioração” com um crescimento
de 1,6% para o conjunto da OCDE e de 3,4% para o conjunto da economia mundial.
Compreensivelmente, a atenção dos trabalhadores e dos jovens
da Europa está centrada nas consequências do “fim de caminho” e do “salve-se
quem puder” das burguesias europeias. A crise política da UE e da zona euro,
assim como as intermináveis vacilações do BCE acerca do financiamento direto
dos países em maiores dificuldades, são suas manifestações mais visíveis. A
tendência é endurecer as políticas de austeridade e montar uma operação de
“resgate total” da qual não escape nenhum país. No entanto, a situação europeia
não pode ser compreendida independentemente da consideração da situação da
economia mundial em sua totalidade.
A CNUCED começa seu informe assinalando que “o grau de
integração e interdependência econômicas no mundo atual não tem precedentes”
(CNUCED, 2011). Este reconhecimento é um inegável progresso intelectual no qual
muitos analistas e, inclusive, militantes de esquerda, deveriam se inspirar. O
campo da crise é o do “sistema de mudança internacional mais desenvolvido”, do
qual já falava Marx em seus primeiros escritos econômicos (Marx, 1971: 161).
Hoje, após a reintegração da China e a plena incorporação da Índia na economia
capitalista mundial, a densidade das relações de interconexão e a velocidade de
interações no mercado mundial alcançaram um nível jamais visto anteriormente.
Este é o marco no qual devem ser abordadas as questões essenciais: a
superacumulação e a superprodução, os super poderes das instituições
financeiras e a competição intercapitalista.
Não há nenhum “fim da
crise” à vista
Na usual linguagem econômica de inspiração keynesiana, o termo
“saída da crise” indica o momento no qual o investimento e o emprego se
recuperam. Em termos marxistas, é o momento no qual a produção de valor e de
mais valia (tomando e fazendo trabalhar os assalariados e vendendo as
mercadorias a fim de realizar sua apropriação pelo capital) está baseada na
acumulação de novos equipamentos e na criação de novas capacidades de produção.
São muito raras as economias que, como é o caso da China, apesar de estarem
inseridas em relações de interdependência, seguem desfrutando de certa
autonomia, de modo tal que a saída da crise pode ser concebida em nível na
economia do Estado-Nação. Todas as demais estão inseridas em relações de
interdependência que determinam que o fechamento do ciclo do capital
(Dinheiro-Mercadoria-Produto-Mercadoria-Dinheiro) da maior parte das empresas
(de todas as grandes, em todo caso) se realize no estrangeiro. E os maiores
grupos deslocalizam diretamente todo o ciclo de uma parte de suas filiais.
A isso se deve o alcance do atoleiro registrado desde o
último G20. A mais de quatro anos do começo da crise (agosto 2007) e três desde
as convulsões provocadas pela quebra do banco Lehmann (setembro 2008), o
conjunto da situação está marcado pela incapacidade, ao menos momentaneamente,
do “capital” – os governos, os bancos centrais, o FMI e os grupos privados de
centralização e poder do capital coletivamente considerados – para encontrar
meios que permitam criar uma dinâmica como a indicada em nível da economia
mundial ou, pelo menos, em muitos grandes setores da mesma. A crise da zona
euro e seus impactos sobre um sistema financeiro opaco e vulnerável são uma
expressão disso.
Mas essa incapacidade não implica passividade política. O que
ocorre simplesmente é que a ação da burguesia está cada vez mais movida
exclusivamente pela vontade de preservar a dominação de classe em toda sua
crueza. E faz isso de maneira imediata e direta sobre os trabalhadores da
Europa. Os centros de decisão capitalista buscam ativamente soluções capazes de
proteger os bancos e evitar o imenso choque financeiro que significaria a
moratória de Itália ou Espanha, fazendo cair mais do que nunca o peso da crise
sobre as classes populares. Um testemunho disso foi o desembarque (com poucos
dias de intervalo) na cúpula dos governos grego e italiano, de agentes do
capital financeiro que foram designados diretamente por este, “ignorando os
procedimentos democráticos”. Outro testemunho é a dança de rumores sobre
projetos de “governança” autoritária que estão sendo discutidos na zona euro.
Isso tem implicações políticas ainda mais graves para os trabalhadores, porque
vem acompanhado pelo reforço do caráter pró-cíclico das políticas de
austeridade e privatização que contribui para a nova recessão em marcha.
Os incessantes chamados que, do outro lado do Atlântico
Norte, fazem Barack Obama e o Secretário do Tesouro, Tim Geithner, para que os
dirigentes europeus apresentem uma rápida resposta à crise do euro traduzem o
fato de que o “motor americano”, como dizem os jornalistas, está “avariado”.
Desde 1998 (rebote da crise asiática), o funcionamento macroeconômico
estadunidense foi construído quase inteiramente na base do endividamento das
famílias, das pequenas e médias empresas e das comunidades locais.
Este “regime de crescimento” está muito arraigado: reforçou
com tanta força o jogo dos mecanismos de distribuição desigual de renda que os
dirigentes não têm outra perspectiva a qual se agarrar que o momento – distante
– em que as pessoas possam (ou estejam, na verdade, obrigadas a) endividar-se
novamente. As diferenças “irreconciliáveis” entre democratas e republicanos
estão ligadas a duas questões interconectadas: qual seria a melhor maneira de
desendividar o Estado Federal desde essa perspectiva e se pode, ou mesmo deve,
endividar-se ainda mais para alcançar esse objetivo.
A incapacidade de conceber qualquer outro “regime de
crescimento” reflete a quase intocável força econômica e política da oligarquia
político-financeira que constitui esse 1%. O movimento Ocupa Wall Street é um
primeiro sinal do enfraquecimento desta dominação, mas até que não ocorra um
terremoto mundial que inclua os Estados Unidos, a política econômica
norteamericana seguirá reduzida às injeções de dinheiro do Banco Central (FED),
ou seja, a fazer funcionar a máquina de fabricar cédulas, sem que ninguém saiba
até quando isso pode durar.
A China e a Índia podem ajudar, como fizeram em 2009, a
limitar a contração da produção e do comércio. Em particular a China seguirá –
mas com mais dificuldade que antes – ajudando a enfrentar a contração mundial.
Com a plena integração da Índia e da China na economia se produziu um salto
qualitativo na dimensão do exército industrial de reserva a disposição do
capitalismo mundial em seu conjunto. Adicionalmente, deve-se recordar que na
China se encontram alguns dos mais importantes focos de superacumulação e de
superprodução. Fala-se muito do efeito tesoura entre a grande baixa do PIB dos
países capitalistas industriais “velhos” e a ascensão dos “grandes emergentes”,
e a crise também acelerou a finalização do período de hegemonia mundial dos
Estados Unidos (hegemonia econômica, financeira e monetária, desde os anos
1930, hegemonia militar não compartilhada a partir de 1992). No entanto, a
China não está de nenhum modo em condições de tomar o lugar dos Estados Unidos
como potência hegemônica.
A novidade da grande
questão política do período
Este artigo trata de repassar a origem e a natureza das
crises capitalistas que se tornaram particularmente notórias com a crise atual
e situar esta na “história de longo prazo”. A crise em curso estourou ao
término de uma fase muito longa (mais de cinquenta anos) de acumulação quase
ininterrupta: a única fase desta duração em toda a história do capitalismo.
Precisamente, a crise pode durar muitos anos, até uma década, porque tem como
substrato uma superacumulação de capacidades de produção especialmente elevada
e, como aberração, uma acumulação de capital fictício em um valor também sem
precedente.
Por outro lado, a situação muito difícil dos trabalhadores em
qualquer parte do mundo – por diferenciada que ela seja de continente para
continente e, inclusive de país para país, devido a suas trajetórias históricas
anteriores – resulta da posição de força obtida pelo capital graças à
mundialização do exército industrial de reserva com a extensão da liberação dos
intercâmbios e do investimento direto na China.
Se em um horizonte temporal previsível não há “saída da
crise” para o capital, de maneira complementar e antagônica, o futuro dos
trabalhadores e dos jovens depende, em grande medida, senão inteiramente, da
capacidade para abrir espaços e criar “tempos de respiração” políticos
próprios, a partir de dinâmicas que hoje só eles podem mobilizar. Estamos em
uma situação mundial na qual o decisivo passou a ser a capacidade destes
movimentos – nascidos sem aviso – se organizarem de tal modo que conservem uma
dinâmica de “autoalimentação”, inclusive em situações nas quais não existam, no
curto prazo, desenlaces políticos claros ou definidos.
Na Tunísia, Grécia ou Egito, mas também nos Estados Unidos,
os movimentos OWS (Ocupa Wall Street), em especial no contexto nacional da
principal potência capitalista do mundo e de um espaço geográfico continental,
o melhor que os militantes podem fazer é ajudar a que os atores dos movimentos com
essa potencialidade afrontem os diversos e numerosos obstáculos contra os quais
se chocam e defendam a ideia de que, em última instância, as questões sociais
decisivas são “quem controla a produção social, com que objetivo, segundo que
prioridades e como pode ser construído politicamente esse controle social”.
Possivelmente seja este o sentido dos processos e consignas “de transição” hoje
em dia. Alguns poderão dizer que sempre foi assim. Mas, dito nos termos acima,
para grande quantidade de militantes constitui uma formulação em grande medida
– se não completamente – nova.
A valorização “sem fim
e sem limites” do capital como motor da acumulação
Antes de retomar a crise iniciada em 2007, é preciso
explicitar os meios da acumulação capitalista. Detenhamo-nos por um instante na
teoria da acumulação no longo prazo. O objetivo é ajudar, partindo de uma
compreensão precisa dos estímulos do movimento de acumulação capitalista, para
facilitar a explicitação da natureza das crises e situar cada grande crise na história
social e política mundial. Como escreveu Paul Mattick, ao comentar uma
indicação de Engels, “nenhuma crise real pode ser entendida se não for situada
no contexto mais amplo de desenvolvimento social global” (Mattick, 1977:39). A
magnitude e os traços específicos das grandes crises são a resultante dos meios
aos quais o capital (em um sentido que inclui os governos dos países
capitalistas mais importantes) recorreu no período precedente para “superar
esses limites imanentes” antes de ver “que voltam a se levantar esses mesmos
limites, ainda com maior força” (Marx, 1973: III, 248).
As crises estouram no momento em que o capital fica novamente
“enredado” em suas contradições, enfrentando as barreiras que ele mesmo cria.
Quanto mais importantes tenham sido os meios utilizados para superar seus
limites, mais prolongado será o tempo em que esses meios de superação atingirão
seu objetivo, e mais poderão diferir sua revelação. Além disso, mais importante
será a crise e mais difícil a busca de novos meios para “superar esses limites
imanentes”. Deste modo, a história invade a teoria da crise.
Cada geração lê e relê Marx. E o faz tanto para seguir a
evolução histórica como também para dar conta da experiência de dificuldades
teóricas com as quais tropeçou. Durante muitas décadas predominou a
problemática do desenvolvimento das forças produtivas em suas distintas
variantes, com as reminiscências das teorias do progresso que a mesma ainda
podia arrastar.
Hoje, o Marx que, como militante-investigador, deve ser lido é
o que ajuda a compreender o que significa a tomada do poder pelas finanças, o
dinheiro em toda sua brutalidade, aquilo sobre o qual ele escreveu nos
Manuscritos de 1857-58 dizendo que “o capital (...) enquanto representante da
forma universal da riqueza – o dinheiro – constitui o impulso desenfreado e
desmedido de passar por cima de suas próprias barreiras” (Ibid.: 276). Ou
também o que sustenta em O Capital, a saber que “a circulação do dinheiro como
capital carrega em si mesmo seu fim, pois a valorização do valor só se dá
dentro deste processo constantemente renovado. O movimento do capital é,
portanto, incessante” (Ibid.: I, 108). Ao longo do século XX, muito mais que no
momento em que foi estudado por Marx, o capital evidenciou um profundo nível de
indiferença quando ao uso social das mercadorias produzidas ou a finalidade dos
investimentos.
Há trinta anos, a “riqueza abstrata” tomou cada vez mais a
forma de massas de capital-dinheiro em busca de valorização colocadas nas mãos
de instituições – grandes bancos, companhias de seguros, fundos de pensão e
Hedge Funds – cujo “trabalho” é o de valorizar seus bens de maneira puramente
financeira, sem sair da esfera dos mercados de títulos e de ativos fictícios
“derivados” de títulos, sem passar pela produção. Enquanto as ações e os
títulos da dívida – pública, das empresas ou das famílias – só são “vales”,
direitos de se apropriar de uma parte do valor e da mais valia, concentrações
imensas de dinheiro se voltam ao “ciclo curto Dinheiro-Dinheiro” que representa
a suprema expressão do que Marx chamou de fetichismo do dinheiro. Expressa
mediante formas cada vez mais abstratas, fictícias, “nocionais” (termo
utilizado pelos economistas das finanças) de dinheiro, a indiferença ante as
consequências da valorização sem fim e sem limites do capital impregna a
economia e a política, inclusive em “tempos de paz”.
Os traços principais do capital a juro, que foram destacados
por Marx – manter-se “à margem do processo de produção” e apresentar “o juro
como o verdadeiro fruto do capital, como o originário, e com o lucro
transfigurado agora como lucro de empresário, como simples acessório e
aditamento adicionado no processo de reprodução” (Ibid.: III, 373) – hoje
colocam os dirigentes capitalistas defrontados com a toda a sociedade, com o
conjunto da sociedade. O que ocorre em nível da distribuição (o 1% frente ao
99%, segundo diz a consigna dos militantes do OWS) é só a expressão mais
facilmente perceptível de processos muito mais profundos. Na cúpula dos grandes
grupos financeiros – tanto nos chamados “com predomínio industrial” como nos
demais – existe uma fusão quase completa entre o “capital-propriedade” e o
“capital-função”, que Marx identificou, opondo-os parcialmente. A “era dos
gerentes” deu lugar a outra na qual há uma identidade de visão quase completa
entre os acionistas e os dirigentes.
Para um capital no qual as finanças estão no comando, a busca
“desenfreada e desmedida” da valorização deve ser conduzida muito mais
impecavelmente se o sistema está em crise. Os “vales” sobre a produção em forma
de dividendos ou juros estão ameaçados e alcançam montantes que, desde os anos
1920, nunca tinham sido tão elevados. É por isso que, seja se trate dos
trabalhadores que o capital emprega apesar da situação de superprodução, ou dos
recursos básicos que vão ficando raros ou mesmo da posição a se adotar frente
às mudanças climáticas e suas previsíveis consequências, o reflexo predominante
no capital tomado de conjunto é intensificar as exploração das “duas fontes
originais de toda riqueza”: a terra e o homem (Ibid.: I, 424) e isso,
ilimitadamente, até o esgotamento, sejam quais forem as consequências.
Não posso estender-me aqui na análise das questões ecológicas
e sua interação com o movimento da acumulação e suas contradições, mas cabe
assinalar que, com a crise, estas interações se tornam ainda mais estreitas,
como mostra o último informe da Agência Internacional de Energia (Reverchon).
Centralização e
concentração do capital e intensificação da competição intercapitalista
A ideia associada à expressão “os senhores do mundo”, a de
uma sociedade planetária do tipo de Metrópolis, de Fritz Lang, acaba de ser
reforçada pela difusão de um estudo estatístico muito importante sobre as
interconexões financeiras entre os maiores bancos e empresas transnacionais,
publicado pelo Instituto Federal Suíço de Tecnologia, de Zurich (Vitali et.
al.). Seria preciso um artigo inteiro para examinar a metodologia dos dados de
base e as conclusões deste ambicioso estudo, cujos resultados têm importantes implicações,
mas devem ser cruzados com outros fatos.
Qual o sentido de classificar cinco grupos financeiros
franceses (Axa no quarto lugar e Société Générale no posto vinte e quatro)
entre os cinquenta primeiros grupos mundiais com base no número de seus laços
(caracterizados como “de controle”) com outros bancos e empresas? Como
reconciliar essa informação com a exigência de socorrer esses mesmos grupos? A
densidade de interconexões financeiras não traduz sobretudo o fluxo de
operações financeiras nas quais os grupos em questão são intermediários? E os
numerosos laços não teriam o estatuto de nós do sistema e não o de
centralizadores do valor e da mais valia?
Em todo caso, a publicidade dada ao estudo exige fazer dois
tipos de observações teóricas que são, ao mesmo tempo, indispensáveis para
compreender a situação mundial. Os processos de liberalização e privatização
fortaleceram muitíssimo os mecanismos de centralização e de concentração do
capital, tanto em nível nacional, como de maneira transnacional. São processos
que alcançaram tanto o Sul como o Norte. Em determinados setores dos países
chamados “emergentes” – a banca e os serviços financeiros, a agroindústria, a
mineração e os metais básicos – vimos a centralização e a concentração do
capital e sua expansão para os países vizinhos.
No Brasil e na Argentina, por exemplo, a formação de
poderosas “oligarquias” modernas andou de mãos dadas com fortes processos
endógenos de acumulação financeirizada e a valorização de “vantagens
comparativas” conformes às necessidades de matérias primas desta acumulação
mundial na qual a China passou a ser o pivô. Especialmente no Brasil se
formaram oligopólios que rivalizam com seus pares norteamericanos ou
australianos na extração e transformação de metais e na agroindústria. Devido à
mundialização, as interconexões entre os bancos e entre bancos e empresas
comprometidas com a produção industrial e os serviços, passaram a ser mais
fortemente transnacionais do que em qualquer outro momento. O campo de ação do
que Lenin chamava de “entrelaçamento” é a economia mundial. Não é por isso que
o capital é monolítico. O entrelaçamento não apaga a competição entre os
oligopólios que, por ocasião da crise, recuperam traços nacionais e
comportamentos pouco cooperativos.
O que prevalece hoje na arena mundial é o que Marx chama de
“anarquia da produção”, cujo motor é a competição, mesmo que o monopólio e o
oligopólio sejam a forma absolutamente dominante dos “múltiplos capitais” que
conjuga o capital considerado como totalidade. Os Estados, ou mais exatamente,
alguns Estados, os que ainda têm meios para isso, são cada vez mais os agentes
ativos dessa competição. O único Estado que conserva esses meios na Europa
continental é a Alemanha. Não ocorre o mesmo na França, onde a burguesia se tornou
novamente financeira e rentista, deixando que ocorresse um processo de
desindustrialização, encerrando-se na opção da energia nuclear e que vê agora
seus “campeões nacionais” caírem um após o outro. Por isso, as dúvidas a
respeito da presença dos bancos franceses entre os cinquenta “senhores do
mundo”.
A outra grande observação referente à
centralização-concentração do capital nos devolve ao nosso fio condutor. A
razão pela qual as leis coercitivas da competição desfazem as tendências que
vão no sentido do acordo entre os oligopólios mundiais é que o capital, por
mais centralizado que seja, não tem o poder de se libertar de suas contradições
constitutivas, assim como não pode bloquear o momento no qual volta a se
encontrar com seus “limites imanentes” (CONTINUA)
(*) François Chesnais
é professor emérito na Universidade de Paris 13 – Villetaneuse. Destacado
marxista, integra o conselho científico da Attac-França. É autor de “La
mondialisation du capital” e coordenador de “La finance mondialisée, racines sociales
et politiques, configuration, conséquences”. Email: chesnais@free.fr
Tradução de Marco Aurélio Weissheimer, a partir da versão em
espanhol publicada em Sin Permiso.
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