Resistentes à queda dos juros ao consumidor, bancos privados
têm resultados mais fracos; aumenta pressão por aumento da Taxa Selic
Por: Maurício Thuswohl, da Rede Brasil Atual
A divulgação do balanço de 2012 do Banco do Brasil na
quinta-feira (21) revelou não somente o lucro recorde de R$ 12,2 bilhões
observado pela instituição, mas também o sucesso de duas apostas feitas por sua
direção: a redução dos juros dos empréstimos ao consumidor e a ampliação da
carteira de crédito a partir do atendimento a uma nova gama de clientes
surgidos graças ao sucesso das políticas de inclusão social levadas a cabo no
país na última década. O sucesso das políticas adotadas pelo BB – e por outros
bancos públicos como a Caixa Econômica Federal – se traduzem em números que
chamam a atenção também pelo contraste com os resultados obtidos pelos bancos
privados. Estes resistiram à queda dos juros ao consumidor e agora, segundo
economistas, pagam o preço por essa opção.
No ano passado, a concessão de crédito dos bancos públicos –
BB e Caixa à frente – cresceu 31,2%. Já nos bancos privados, em que pese o
forte aumento da demanda em todo o país – o crescimento foi de apenas 7,1%. A
comparação da receita de crédito também coloca os bancos públicos (aumento de
11%) em vantagem sobre os bancos privados (aumento de 4,5%). Por sua vez, a
expansão das despesas com provisão para devedores duvidosos foi de 14,7% nos
bancos públicos, enquanto os privados tiveram que desembolsar 27%.
Outro dado relevante é o sucesso obtido pelos bancos públicos
no ano passado no que diz respeito à administração de suas taxas de
inadimplência relativas a atrasos acima de 90 dias. No BB, esse indicador em
2012 foi 2,05% menor do que o registrado em 2011. Já nos três maiores bancos
privados (Itaú-Unibanco, Bradesco e Santander), a inadimplência no ano passado
ficou, em média, 4,5% maior do que no período anterior.
O sucesso de uma política de crédito que apostou na confiança
nos novos consumidores que conquistaram renda e chegaram ao mercado de trabalho
traz à lembrança palavras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante
suas duas vitoriosas campanhas presidenciais. Por diversas vezes, em comícios
por todo o país, Lula afirmou que “o pobre, quando lhe dão meios para isso, não
deixa de pagar a sua prestação e de honrar seus compromissos”.
Os baixos indicadores de inadimplência propiciaram à carteira
de crédito do Banco do Brasil um crescimento de 24,3% em 2012. O lucro de R$
12,2 bilhões representa uma alta de 0,7% em relação ao ano passado. Somados, os
lucros dos dois bancos públicos (BB e CEF) no ano passado chegam a R$ 18,3
bilhões, o que representa uma alta de 5,6%. Já nos três maiores bancos
privados, houve um recuo de 5,3%, com o lucro passando de R$ 29,2 bilhões para
R$ 27,7 bilhões.
Nova realidade
Para o economista Luiz Carlos Prado, da UFRJ e do Centro
Celso Furtado, a expansão dos empréstimos explica “o desempenho melhor” dos
bancos públicos: “O lucro, tanto do Banco do Brasil como da Caixa Econômica
Federal, deve-se à expansão das suas operações para o público em geral, o que
mostra que é um bom negócio para os bancos ampliar a sua linha de crédito”,
diz.
Prado ressalta a importância que tiveram as políticas de
expansão do crédito para combater os efeitos da crise global: “Essa política de
ampliação por parte dos bancos públicos, que começou a se manifestar desde a
crise de 2008, mostrou-se não apenas acertada em termos de política
macroeconômica, mas também conveniente sob o ponto de vista do retorno dos
investimentos dessas empresas. Isso mostra que esse é um caminho que é melhor
para o país e para os consumidores, além de, aparentemente, ser um bom negócio
sob o ponto de vista meramente microeconômico e privado”.
Economista da Unicamp, André Biancarelli diz que os bancos
privados terão de se adaptar à nova realidade do mercado: “O que está
acontecendo na economia brasileira nos últimos anos – não só no setor bancário
como em vários outros – é um processo de aprendizado, de conviver com uma taxa
de remuneração mais baixa. Isso tem a ver com a queda, espera-se que
permanente, da taxa de juros básicos da economia”, diz.
“O pano de fundo de
vários processos da economia brasileira é esse: a remuneração, que para várias
atividades era muito alta e garantida, agora está mudando. E, aparentemente, os
bancos públicos estão conseguindo conviver e se adaptar melhor a essa mudança e
até tirar proveito dela, com a concessão de empréstimos com taxa de remuneração
mais baixa”, completa Biancarelli.
Para o professor da Unicamp, o bom resultado dos bancos
públicos é ainda mais digno de nota na medida em que a queda da taxa de juros
básica da economia tende em geral a provocar a piora nos balanços dos bancos:
“Mas, pelo jeito, os bancos públicos conseguiram se adaptar bem a ela. Mais do
que isso, o governo usou claramente os bancos públicos como uma forma de
pressionar, por meio da concorrência, a queda das taxas para os consumidores.
Tem a ver com a ampliação de volume de crédito, mesmo que a taxa de juros seja
menor”.
Inflação
Enquanto alguns setores do mercado financeiro se queixam de
um suposto aumento da pressão inflacionária e pressionam o Banco Central a
aumentar a Taxa Selic, o governo resiste a essa alternativa, embora admita
estudar a possibilidade de aumentar ligeiramente os juros na próxima reunião do
Comitê de Política Monetária (Copom), prevista para abril. O presidente do BC,
Alexandre Tombini, tem afirmado que a ideia é manter os juros básicos no
patamar de 7,25% por um longo período: “Mas, se necessário, ajustes poderão ser
feitos. O fato de a Selic oscilar em patamares mais baixos do que no passado
não significa que os ciclos monetários foram abolidos”, disse.
Para Luiz Carlos Prado, não há nenhuma indicação de que haja
retomada da pressão inflacionária: “Você tem uma inflação um pouco acima da
meta do ano passado, em um ano em que houve uma desvalorização muito grande do
real – o que era desejável em vista da sobrevalorização da moeda –, mas não há
nenhuma pressão. A economia continua crescendo pouco. No meio de uma crise
econômica mundial, subir a taxa de juros não faz o menor sentido econômico. Não
há nenhuma indicação de risco inflacionário de curto e médio prazo no Brasil”,
diz.
André Biancarelli afirma duvidar que o aumento da Taxa Selic
seja mesmo necessário: “Não sei se a taxa de juros vai ter de subir mesmo. Acho
que é possível agüentar o tranco de uma inflação mais alta com outros
instrumentos ou esperar que ela tenda a cair sem aumentar a taxa de juros. O
aumento dos juros certamente seria ruim para o processo de retomada da economia
brasileira, que está muito tímido ainda”, diz.
O economista diz que, mesmo que se tenha que subir a taxa de
juros, essa subida será muito pequena: “Digamos que, se subir de 7,25% para 8%
ou até mesmo para 8,25%, ainda assim será uma taxa básica de juros em patamares
bem baixos para os padrões brasileiros nos últimos anos. Então, eu acho que
essa subida que se cogita agora é conjuntural. A queda da remuneração praticada
pelos bancos públicos, por outro lado, tende a ser mais permanente”.
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