autor: Luis Nassif
No final dos anos 90 escrevi um conjunto de colunas na Folha,
sobre os desvios e abusos da cobertura jornalística.
Na Abril, Roberto Civita xerocou e enviou para diretores de
redação de diversas publicaçòes. No Estadão, Ruy Mesquita encaminhou cópias
para o diretor de Redação Aluizio Maranhão. Na RBS ocorreu o mesmo processo. Na
Folha, além do espaço que me davam, havia a figura do ombudsman e do Painel do
Leitor permitindo algum contraponto.
Por trás desse interesse, a preocupação com um projeto de lei
de um deputado federal de São José do Rio Preto – e, se não me engano, de
Ibrahim abi-Ackel – definindo de forma mais rigorosa punições contra abusos de
mídia.
O projeto arrefeceu e, com ele, arrefeceu a intenção da mídia
de praticar um jornalismo mais responsável.
De lá para cá, o jornalismo investigativo foi piorando e
enveredando por caminhos que, muitas vezes, ultrapassaram os limites da
legalidade. Especialmente depois dos episódios Veja-Opportunity e
Veja-Cachoeira.
Criou-se um círculo vicioso do qual a própria mídia se tornou
prisioneira.
Nos últimos anos, o padrão de jornalismo investigativo no
país foi dominado ou por vazamentos de autoridades (MPF, PF, TCU etc), o que é
legítimo, ou pelo relacionamento mais promíscuo com criminosos e lobistas –
casos do “consultor que acabara de sair da cadeia, invasão do hotel de José
Dirceu, as capas da Veja sobre maluquices (como propinas de R$ 200 mil sendo
levadas ao Planalto em envelopes), grampos obtidos de maneira criminosa etc.
Esse movimento acabou gerando uma competição degradante, que
vitimou até profissionais sérios da mídia. Porque criou-se uma competição com a
escandalização desenfreada da Veja que acabou pressionando profissionais sérios
a seguirem modelos de atuação de diversos inescrupulosos que invadiram a
profissão.
O indiciamento de Policarpo Jr não significa sua condenação
nem a da revista. Vai-se abrir um inquérito onde todas as partes serão ouvidas
e todos poderão se defender. Mas – importante – permitirá uma freada de
arrumação para a própria mídia e uma discussão séria, em um ambiente neutro,
sobre os limites da cobertura jornalística.
A competição espúria
Ainda no final dos anos 90, escrevi um artigo sobre o fim do
projeto Folha – como tal, entendida aquela simplificação de tratar todo
funcionário público como preguiçoso, todo usineiro como caloteiro, todo
banqueiro como ganancioso, todo movimento social como baderneiro.
Chegou-se a montar um seminário interno, na própria Folha,
para analisar a nova etapa, inclusive frente às novas mídia que cresciam. No
fim, preponderou a visão medrosa: e se pararmos com nosso modelo atual e o
Globo (que começava a crescer) ocupar o espaço? Minha resposta é que seria ótimo,
porque era um espaço sem futuro.
Mas abrir mão de uma
posição que deu a liderança, até aquele momento, por um novo estilo, exige
coragem e determinação. E os veículos de mídia são extremamente conservadores e
refratários a mudanças, com medo de perder a clientela, mesmo que declinante.
O indiciamento de Policarpo será a pausa para esse momento de
reflexão da própria mídia. O caso será analisado pelo Ministério Público
Federal e pela Justiça – poderes teoricamente neutros. A discussão abrirá
espaço para uma revisão dos métodos atuais e para um revigoramento da liberdade
de imprensa, porque, daqui para frente, calçada em princípios legitimadores,
não nesse vale-tudo atual.
Nenhum procurador, de ofício, tomará a iniciativa de agir.
Nenhum Ministro de tribunal ousará, porque iniciativas individuais são
alvejadas com ataques pessoais que intimidam qualquer um. Daí a importância de
uma ação institucional, que se inicie no Congresso, passe pelo MPF e pelos
tribunais. Até para comprovar que não existem intocáveis no país.
Se a CPMI recuar, perder-se-á uma oportunidade única de
melhorar o ambiente jornalístico e legitimar a ação da mídia.
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