Ex-deputado que deixou o PSDB para se eleger prefeito de
Curitiba com apoio do PT diz que o Brasil tem a cultura da adesão ao poder
Há sete anos, o então deputado tucano Gustavo Fruet era o
pesadelo do PT. Como sub-relator da CPI dos Correios, debruçou-se sobre a
movimentação financeira das empresas de Marcos Valério e puxou o fio da meada
do esquema do mensalão. No auge das investigações, o parlamentar chegou a
acusar Lula de crime de responsabilidade e votou pela cassação de José Dirceu.
Fruet não imaginava que sua vida mudaria tanto. Em 2011, trocou o PSDB pelo PDT
e, em 2012, foi eleito prefeito de Curitiba numa coligação com os petistas, que
abraçaram constrangidos sua candidatura. Nem Lula nem Dilma Rousseff pisaram em
seu palanque, tarefa assumida pela ministra Gleisi Hoffmann em troca do apoio
pedetista para sua provável candidatura ao governo estadual, em 2014. Como era
de se esperar, Fruet foi criticado pela aliança com o PT, mas não se arrepende.
Hoje, ele diz que a condenação dos réus do mensalão é positiva para o Brasil e
afirma que o julgamento do Supremo Tribunal Federal tem caráter educativo. “O
PT da Gleise adotou uma postura diferente do PT do José Dirceu”, disse Fruet,
em entrevista à ISTOÉ. “Esse PT não vai brigar com o Supremo, não vai brigar
com os fatos.”
Istoé - A presidenta Dilma Rousseff o recebeu há poucos dias
no Palácio do Planalto. Sobre o que conversaram?
GUSTAVO FRUET -
Falamos muito sobre gestão, especialmente transporte, segurança, saúde e
educação. Ela enfatizou que muitas vezes há recursos disponíveis, mas nem
sempre as prefeituras apresentam bons projetos. Então, sugeriu que eu capriche
na equipe. Disse que foi bom eu começar pela prefeitura e que tenho grande
futuro pela frente.
Istoé - Futuro no PDT ou no PT? Não entramos nesse detalhe.
Até contei um pouco do cenário partidário no Estado, mas a conversa ficou
focada na gestão. A intenção dela foi me incentivar.
Istoé - Como o sr. classificaria sua campanha para a
prefeitura?
Foi uma campanha de superação. Aprendi várias coisas, como a
distância enorme que existe entre a política local e a nacional. Fiquei em
Curitiba 18 meses sem retornar a Brasília. Foi uma reeducação. É um erro
associar o resultado municipal com a campanha presidencial. Se a gente fica
muito voltado para a política nacional, quando volta para a local é chocante.
Istoé - O que é mais chocante?
Não há a mínima identidade ideológica e doutrinária entre os
partidos. Vivi em Curitiba um exemplo prático. Quando cheguei aqui, descobri
que o PSDB local não tinha qualquer comprometimento com o projeto nacional,
queria apenas estar com o governo a qualquer preço.
Istoé - Sua ida para o PDT também foi interpretada como
oportunista.
Eu não tinha muita opção e precisava criar uma alternativa.
Esse grupo que dava suporte ao PSDB controlava todos os partidos. Numa das
últimas conversas que tive aqui, o João Claudio Derosso, que controlava a
legenda com mão de ferro, me disse que se eu saísse só teria o PDT ou o PT.
Como eu tinha um histórico de aliança com o Osmar Dias (senador do Paraná por
dois mandatos consecutivos), optei pelo PDT. Não foi uma decisão meramente
pragmática, pois há identidade.
Istoé - E como se deu a construção da aliança com o PT?
O PT passou primeiro por um processo de disputa interna. O
grupo da Gleisi Hoffmann e do Paulo Bernardo ganhou a convenção para fazer a
coligação, mas perdeu na indicação da candidata à vice-prefeita. Quem ganhou
foi o grupo oposto dentro do PT, o que legitimou a coligação.
Istoé - Há sete anos, quando o sr. estava no PSDB, essa
parceria era inimaginável.
Digo que cada um é guardião de sua história e de suas
convicções. Eu preservei todo o trabalho que fiz no Congresso. Essa aliança era
programática e local. Prova disso é que não tive a presença do ex-presidente
Lula nem da presidenta Dilma no meu palanque.
Istoé - O sr. acredita que o ex-presidente Lula guarda mágoa
da época da CPI?
O Lula é muito pragmático, mas é fato que ele só gravou para
a campanha da vice-prefeita e para os candidatos a vereador do PT. É evidente
que aquele processo do mensalão deixou sequelas, mas acho que mágoa, não. Nunca
ataquei deliberadamente, nunca xinguei.
Istoé - Arrepende-se de ter enfrentado o PT e Lula na
ocasião?
Não. Acho que tive uma atitude consequente, o momento exigiu
isso. E mesmo hoje mantenho minha postura.
Istoé - O julgamento do mensalão chegou à fase final. Está
satisfeito com a condenação do núcleo político?
Acho que falar em satisfação é tripudiar com um fato
delicado. O núcleo político foi condenado e com penas altas, o que é um mérito
para o Brasil. Vale dizer que o Supremo reconheceu a validade das provas
levantadas pela CPI e isso demonstra a correção de nosso trabalho. Estabelece
um padrão que vai gerar efeito redobrado de prevenção O julgamento tem caráter
educativo.
Istoé - Petistas passaram a atacar o STF, tachando o
julgamento de rito sumário. Concorda?
É a única saída deles. Com a condenação do STF, eles não têm
a quem recorrer. E isso muda também a discussão sobre o foro privilegiado. Esse
ataque ao Supremo não é uma coisa do PT como um todo. O grupo da Gleisi adotou
outra postura.
Istoé - Quer dizer que
o PT da Gleisi é diferente do PT do Dirceu?
O PT da Gleisi adotou
uma postura diferente, inclusive em relação a esse episódio. Esse PT não vai
brigar com o Supremo, não vai brigar com os fatos. De alguma maneira, avaliou
que precisa absorver isso e pensar para a frente.
Istoé - Sua aliança com a Gleisi significa apoio à
candidatura dela para o governo do Estado em 2014?
Esse é um processo natural. Apesar de o PT ter sido derrotado
em várias cidades do Paraná, é preciso lidar com essa nova correlação de
forças. Então, esse é o caminho. No entanto, acho um erro querer projetar o
cenário eleitoral de 2014. É precipitado.
Istoé - A ausência de Lula e Dilma no palanque o prejudicou?
Como disse, foi uma eleição local, sem a presença de figuras
nacionais. A exceção foi a ministra Gleisi, que é do Paraná, e do senador
Cristovam Buarque e da Marina Silva, que veio na última semana, quando eu ainda
estava atrás nas pesquisas. Essa campanha derrubou vários mitos.
Istoé - Quais?
Tamanho da coligação e tempo de tevê não garantem a vitória.
Ter mais dinheiro também não. E até as pesquisas de intenção de voto podem não
refletir a realidade. No primeiro turno, faltavam recursos, eu tinha menos
tempo de televisão que o prefeito e aparecia atrás nas pesquisas. Mesmo assim
ganhei.
Istoé - Quando o sr. esteve com Lula em junho, conversaram
sobre o julgamento do mensalão?
Sim. Ele não entendia como o José Dirceu poderia ser
condenado se o Roberto Jefferson falava que não tinha provas. Eu dei minha
versão, lembrei que Dirceu também foi cassado por votos de pessoas de dentro do
governo e havia uma disputa interna.
Istoé - O temor de ser vinculado à corrupção que combate fez
com que evitasse a presença do ex-ministro do Trabalho Carlos Lupi, presidente
do PDT, em sua campanha?
Não escondi o Lupi. Ele veio para cá, foi objetivo, fez uma
doação de R$ 100 mil do PDT e se colocou à disposição. Ele disse que não queria
atrapalhar a eleição.
Istoé - O sr. tomou precauções para evitar o caixa 2 na
campanha?
Tomei cuidado redobrado. Reuni a equipe e disse ‘só eu
arrecado, só eu autorizo despesa’. É um negócio muito sério. Às vezes, pode ser
uma coisa pequena de alguém pedir doação em nome do candidato, mas lá na frente
pode dar problema.
Istoé - Numa campanha municipal é mais fácil controlar o
caixa?
Sem dúvida. Você tem no máximo 30 financiadores. Mas também
não é fácil, pois muita gente quer ajudar sem aparecer. Houve um caso de um
supermercado que doou R$ 300 mil para o prefeito Luciano Ducci (atual prefeito
de Curitiba). Daí as campanhas adversárias passaram a acusá-lo de receber
benefícios da prefeitura. Ele acabou doando mais R$ 50 mil para cada um dos
demais candidatos. As pessoas ficam com medo da exposição. A saída é fazer a
doação p
Istoé - O sr. esteve no PSDB por sete anos. Como avalia a
situação do partido e da oposição hoje após derrota de José Serra em São Paulo?
Todos os partidos precisam de renovação, mas não é fácil
fazer isso. O PSDB nacional sempre foi solidário comigo, mas aqui eles não
quiseram brigar com o governador. É muito difícil oxigenar a organização
partidária. O PSDB tem bons quadros, mas vive em brigas internas. É refém dessa
lógica e não encontrou mecanismos para resolver isso. Ser oposição no Brasil
também não é nada fácil. No País, há uma cultura de adesão ao poder.
Istoé - Por sua experiência na oposição, qual o caminho para
ela voltar a ser governo?
Não sei se no curto prazo, mas tem que ter projeto. Se não
tiver clareza, não tem sucesso. É um erro a oposição imaginar que vai ganhar só
no desgaste do governo. O eleitor deu sinal agora de que está em busca de
alternativas. Mas isso não se constrói numa campanha. As lideranças de alguns
partidos têm que estar na rua já. Não digo fazendo passeata, mas tomando
posição. Tem que ter clareza. tomar lado, ter bandeira, discurso definido,
lideranças definidas. O PSDB deveria ter agido antes, não deixar para definir
só no ano eleitoral. E é um erro ficar apostando na tragédia do governo.
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