sábado, 31 de março de 2012

José Serra, a âncora


O mais impressionante das prévias do PSDB em São Paulo não foi a vitória apertada de José Serra, embora os magros 52,1% tenham causado muxoxos de analistas políticos que apostavam em um desempenho deslumbrante de quem foi presidenciável duas vezes, governador, prefeito e “o melhor ministro da Saúde” da história do Brasil, como ainda repetem os serristas. E de quem tinha o apoio irrestrito dos caciques partidários: do governador Geraldo Alckmin e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à avassaladora maioria das bancadas de deputados federais e estaduais.
Para os fundadores da legenda, realmente doloroso é constatar mais uma vez que sua verdadeira (ou talvez única) base de apoio social se resuma aos meios de comunicação. E talvez nem este segmento se mostre mais tão entusiasmado. Na terça-feira 27, em editorial, o Estado de S. Paulo não escondeu sua irritação: “O segundo resultado constrangedor (das prévias) foi a própria vitória de Serra (…) tal desfecho foi a proverbial vitória de Pirro, sem tirar nem pôr”.
Dos cerca de 20 mil militantes aptos a votar, pouco mais de 6 mil exerceram o direito no domingo 25. Desse minúsculo grupo, que passou sete meses embalado pela crença em um átimo de democracia e revitalização interna, até tomar o banho frio da “imposição” na disputa do nome do ex-governador, Serra amealhou 3,2 mil votos. Em segundo lugar ficou o secretário estadual de Energia, José Aníbal, com 31,2% do eleitorado. Ricardo Trípoli somou 16,7%.
A etiqueta nesses momentos exige a troca de afagos e discursos de louvor à união partidária. Não foi diferente. O presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra, afirmou que o partido saía “fortalecido” das prévias. Aníbal e Trípoli prometeram empenho total na campanha à prefeitura, apesar da derrota para um oponente a favor do qual a burocracia interna manipulou as prévias – e a despeito da visão de mundo que os separa irremediavelmente. Antes das urnas abertas, não se via tanta cordialidade. Correligionários dos candidatos derrotados espalhavam a história de que militantes tucanos com cargos em subprefeituras da capital teriam sido coagidos a votar no ex-governador, sob a ameaça de perder seus empregos. Como em pleitos interioranos, não faltaram o transporte gratuito e o vale-alimentação para estimular a “militância”.
Serra exaltou as prévias e anunciou a pretensão de buscar alianças entre o que chamou de “esquerdas democráticas”. Citava em especial três legendas: PDT, PCdoB e PSB. Desses, talvez o mais propenso a embarcar na candidatura tucana seja o PDT. No Vermelho, seu site oficial, o PCdoB rechaçou a possibilidade.
Os comunistas têm tido desavenças crescentes com o PT: reclamam da “voracidade” e da “arrogância” da legenda. Ressentem-se, em especial, do fato de os petistas resistirem em apoiar a deputada federal Manuela D’Ávila na disputa pela prefeitura de Porto Alegre. Na terça-feira 27, a primeira pesquisa pública de intenções de voto mostrou um empate técnico entre D’Ávila e o atual prefeito da capital gaúcha, José Fortunati, do PDT. A parlamentar tem 31,3% ante 33,5% do pedetista. Adão Villaverde, do PT, aparece em terceiro, com 10%. O petista, vê-se, terá peso no desenrolar da eleição. Mesmo assim, as divergências nacionais não parecem suficientes para comprometer uma provável aliança em São Paulo.
O PSB integra o governo Alckmin, sua principal liderança paulista, Márcio França, defende uma coalizão com os tucanos, mas o presidente nacional da agremiação, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, disse não haver possibilidade de apoio a Serra. Na segunda-feira 26, durante um encontro com Lula, do qual participaram também o presidente do PT, Rui Falcão, e o prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, Campos reafirmou a intenção de formalizar uma aliança com Fernando Haddad.
Segundo fontes petistas, Lula teria se irritado com o fato de Campos forçar mudanças no acerto. Antes da entrada de Serra na disputa, o governador pernambucano teria prometido apoio incondicional a Haddad. Agora, a conversa seria outra. Incomodado com a indecisão petista em várias cidades, o PSB cobra respostas rápidas. Em Belo Horizonte, por exemplo, o PT topou apoiar a reeleição de Márcio Lacerda desde que o PSDB não integre a aliança formal. O problema é que Lacerda se elegeu em 2008, apoiado por tucanos e petistas após o célebre acordo entre Aécio Neves e Fernando Pimentel. O PT reluta ainda em apoiar Jonas Donizette em Campinas (a tendência é o partido lançar Marcio Pochmann, atual presidente do Ipea) e ainda não definiu seu candidato no Recife.
Campos tem, em contrapartida, postergado uma definição a respeito de São Paulo. Na mesma semana do encontro com Lula, em passagem por Brasília, o governador de Pernambuco listou entre as alternativas do PSB o lançamento de candidatura própria em São Paulo. Como argumenta um experiente observador do ambiente eleitoral brasileiro, o momento é de cada um valorizar seu passe. Todos os partidos alegam ter nomes “competitivos”. O tempo de vida desse discurso é curto: até maio ou junho, os campos da disputa estarão definidos.
Com 30% de intenções de voto, Serra acena a esmo, mas sabe ter poucas chances de atrair outros partidos além dos velhos aliados PPS e DEM e do PSD do prefeito Gilberto Kassab, que lhe devota lealdade absoluta. Terminadas as prévias tucanas, voltou a circular o nome do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, hoje no PSD, para vice do ex-governador. Meirelles chegou a ser cogitado para a mesma posição na chapa de Haddad, quando Kassab negociava com o PT. O ex-banqueiro não deve agregar novos votos à chapa encabeçada pelo PSDB, mas será essencial para atrair financiadores da campanha.
Haddad, por seu lado, continua preso à areia movediça. Está estagnado nos 3% das intenções de voto e não consegue criar nenhum fato que o impulsione. Para piorar, o PT perdeu o tempo de tevê a que teria direito no primeiro semestre. O partido foi punido pelo Tribunal Superior Eleitoral, por campanha antecipada a favor de Dilma Rousseff em 2010. O horário gratuito seria uma boa chance de apresentar um candidato ainda desconhecido pela maioria da população. Sua esperança é a recuperação de Lula, seu maior cabo eleitoral. Na quarta 28, o Hospital Sírio-Libanês anunciou o desaparecimento dos tumores na garganta do ex-presidente, que no mesmo dia postou uma mensagem em seu portal na internet para anunciar o desejo de voltar em breve à ação política.
Já Gabriel Chalita, do PMDB, com 7% nas pesquisas, aproveita o tempo para reforçar seus contatos com empresários, grupos religiosos e a classe média tradicional. Chalita e Haddad selaram um pacto de não agressão no primeiro turno e o peemedebista concentra suas críticas em Serra, a quem chama de “vingativo” e atribui a intenção de novamente abandonar a prefeitura no meio do mandato, desta vez a favor de sua eterna obsessão: alcançar a Presidência da República em 2014.

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