'A Privataria Tucana', de Amaury Ribeiro Jr.
A demissão de dois profissionais da revista de História da
Biblioteca Nacional semanas após a publicação de uma resenha favorável ao livro
“A Privataria Tucana”, do jornalista Amaury Ribeiro Jr – fato que despertou a
ira de parlamentares do PSDB, alvo de denúncias na obra – colocou o veículo no
centro de uma polêmica sobre uma suposta intervenção do partido no caso. A
demissão foi apontada na imprensa na coluna do jornalista Elio Gaspari, na
Folha de S. Paulo, da quarta-feira 28.
Publicado em 24 de janeiro, o texto do jornalista Celso de
Castro Barbosa foi alvo críticas de tucanos, que liderados pelo presidente do PSDB,
Sérgio Guerra (PE), ameaçaram processar a publicação, editada pela Sociedade de
Amigos da Biblioteca Nacional (Sabin) e que da Biblioteca Nacional recebe
apenas material de pesquisa e iconografia.
Como resultado, a revista retirou a resenha do ar. “Fui
censurado e injuriado”, diz o jornalista em entrevista a CartaCapital.
Barbosa destaca que a remoção do texto ocorreu apenas “após o
chilique do PSDB” em 1º de fevereiro, nove dias depois da publicação em
destaque na primeira página do site da revista. O motivo seria uma nota
divulgada em um jornal carioca, segundo a qual a cúpula do partido estava
“possessa” com a revista, tida pela legenda como do governo.
A evidente pressão externa fez com que o jornalista recebesse
um chamado do editor-chefe da publicação, Luciano Figueiredo, naquele mesmo
dia. “Ele [Figueiredo] disse concordar com quase tudo que havia escrito, mas o
Gustavo Franco [ex-presidente do Banco Central no governo FHC] leu, não gostou
e resolveu mobilizar a cúpula tucana.”
Para conter o movimento, relata, o editor-chefe se
comprometeu a escrever uma nota assumindo a culpa pela publicação do texto. “Eu
disse: ‘Culpa de que? Ninguém tem culpa de nada. É uma resenha de um livro.’”
No dia seguinte o diário O Globo destacou a história e um
pronunciamento da Sabin a dizer que os textos da revista são analisados pelos
editores, mas aquela resenha não havia sido editada. “Subentende-se que
publiquei por minha conta”, ironiza Barbosa.
Por outro lado, em matéria publicada na terça-feira 27 no
site do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, dois editores da revista,
Vivi Fernandes de Lima e Felipe Sáles, desmentem a Sabin e confirmam ter
editado a resenha antes da publicação no site.
Críticas a Serra
O texto de Barbosa destaca a vivacidade do jornalismo
investigativo no livro e sugere que José Serra esteja “morto”. O ex-governador
de São Paulo também é citado como a figura com a “imagem mais chamuscada” pelas
denúncias, além de questionar a origem de seu patrimônio.
Inconformado com a resenha, Guerra chegou a enviar cartas de
protesto à ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e a Figueiredo. Outros tucanos
alegaram que a publicação era pública, trazia os nomes da presidenta Dilma
Rousseff, e de Hollanda no expediente e recebia verba da Petrobrás. Logo,
deveria se manter isentada de questões políticas.
Mas Barbosa destaca que a dona da revista é a Sabin. “Uma
entidade privada, composta inclusive por bancos.”
O patrocínio, defende, não seria impedimento para a
manifestação de opiniões no veículo. “Não está escrito na Constituição que em
revista patrocinada pela Petrobras a manifestação contra eventuais adversários
do governo é proibida.”
A revista, por outro lado, preferiu divulgar nota pedindo
desculpas aos ofendidos pelo texto, além de alegar não defender “posições
político- partidárias”.
Em meio ao ocorrido, Barbosa afirma ter sido ameaçado com um
processo por Guerra e, após a pressão dos tucanos, seus editores avaliaram que
seria menor que trabalhasse em casa.
Devido à situação, o jornalista revela ter questionado o
posicionamento de Figueiredo em um email aberto à redação, no qual perguntava
sobre a nota que o editor-chefe escreveria em seu apoio. “Ele escreveu uma nota
mentirosa e deu para o presidente da Sabin assinar. Depois, em 29 de fevereiro,
me demitiu.”
Sobre a reação tucana, Barbosa acredita que o partido poderia
ter agido de outra forma. “Vivemos em um país livre e a Constituição me garante
o direito à opinião.”
O jornalista se refere a declarações de parlamentares do
PSDB, que o chamaram de “servidor público a favor do aparelhamento do Estado”.
“Se há algum erro no tom, é deles [tucanos], não meu. Sequer tinha carteira
assinada e cumpria jornada sem direito trabalhista.”
Um dos motivos pelo qual Barbosa processa a revista. “Na
ação, também peço indenização por danos morais e uma retratação pela nota
mentirosa.”
Procurada, a Sabin informou, via nota assinada pelo
presidente da instituição, Jean-Louis Lacerda Soares, que “não interfere no
conteúdo editorial da revista”, pois a “atribuição relacionada ao conteúdo é do
Conselho Editorial”.
A sociedade nega ter sofrido interferência externa nas
demissões e diz que o jornalista Celso de Castro Barbosa foi demitido pelo
então editor Luciano Figueiredo, por sua vez, dispensado “exclusivamente por
razões administrativas.”
A reportagem de CartaCapital também contatou Luciano
Figueiredo por meio da assessoria de imprensa da Universidade Federal
Fluminense, instituição na qual leciona, e foi informada de que o historiador
não poderia dar entrevistas.
Outra tentativa foi realizada por email, mas não houve
resposta do professor até o fechamento desta reportagem.
O PSDB divulgou, nesta sexta-feira 30, nota na qual afirma
que a “a própria Revista de História da Biblioteca Nacional constatou ter
cometido um erro ao publicar o artigo” e “lamenta o retorno do assunto”,
ressaltando que “não teve nenhum tipo de interferência na demissão dos
profissionais.”
Na nota, Guerra afirma que o partido tem o direito de ir
contra a resenha e também à Justiça. Ele nega interferência no caso.
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