Por Márcio Pochmann
Da implantação da
República, em 1889, até a Constituição Federal, em 1988, o avanço da escola
pública no Brasil não foi contínuo, pois esteve marcado pelo fardo da
escravidão e pelos traços de uma sociedade patrimonialista. Assim, em quase cem
anos de República, a educação permaneceu prisioneira das condições de produção
e reprodução do subdesenvolvimento nacional.
Até a década de 1940,
por exemplo, as possibilidades de inclusão dos filhos de negros na escola
pública eram quase nulas, tanto assim que a parcela significativa dos
analfabetos do país do início do século XXI possui mais de 55 anos de idade e
não são brancos. Ao mesmo tempo, a apropriação patrimonialista do Estado por
estritos segmentos sociais transformou a boa escola pública em quase
exclusividade de reprodução de uma elite branca, sem conceder possibilidades
para a universalização do acesso a toda população.
Com a aprovação da
Constituição Federal após a transição da ditadura militar (1964 – 1985) para o
atual regime democrático, a educação pública ganhou relevância. Mas isso se deu
associado à necessária garantia de recursos orçamentários, o que permitiu
rapidamente ao país alcançar a universalização do acesso ao ensino fundamental.
Neste novo contexto
constitucional de estruturação do Estado de bem-estar social no Brasil,
assistiu-se ao avanço da cobertura social para praticamente todos os segmentos
vulneráveis da população, como crianças e adolescentes (Estatuto da Criança e
Adolescente – ECA), idosos e portadores de necessidades especiais
(reconfiguração do sistema de aposentarias e pensão), pobres (programas de
transferências de renda, como o Bolsa Família), desempregados (seguro
desemprego), entre outros. Com isso, os indicadores sociais passaram a apontar
melhoras inegáveis, não obstante os enormes constrangimentos impostos pelo
predomínio das políticas neoliberais desde o final da década de 1980.
Os avanços sociais não
foram, contudo, plenos. O segmento juvenil, por exemplo, permaneceu à margem,
sendo somente mais tardiamente objeto de maior intervenção de políticas
públicas. Mesmo assim, de forma parcial e incompleta, a começar pelo programa
Agente Jovem do final dos anos 1990, passando pelo fracasso do programa
Primeiro Emprego do início da década de 2000, até chegar ao mais estruturado
programa governamental Pró-Jovem.
Tendo em vista o enorme
desafio atual de conceder maior atenção à problemática da inclusão juvenil no
Brasil, torna-se fundamental a temática educacional, especialmente aquela
atinente às condicionalidades que afetam a trajetória das condições de vida do
segmento social de 16 aos 24 anos de idade. Inicialmente, percebe-se que, dos
29,3 milhões de jovens na faixa de 16 a 24 anos de idade, somente 32,4%
mantinham-se afastados do mercado de trabalho no ano de 2008. Deste universo de
9,5 milhões de jovens inativos, 59% somente estudavam, enquanto 41% não
estudavam, não trabalhavam e nem procuravam trabalho (3,9 milhões).
A maior parte dos
jovens de 16 a 24 anos encontrava-se ativa no interior do mercado de trabalho
(19,7 milhões), sendo 16,7 milhões ocupados e 3 milhões na condição
desempregados (15,2%). Dos que trabalhavam, somente 31,7% estudavam (5,3
milhões), indicando que a maior parte que se encontra ocupado não consegue estudar
(11,4 milhões). No caso dos desempregados, 40% frequentavam escola (1,2 milhão)
e 60% não estudavam (1,8 milhão).
Resumidamente,
constata-se que, da população de 16 a 24 anos de idade, somente 11,8 milhões
(40,2%) estudavam em 2008. Deste universo, 47,5% (5,6 milhões) não trabalhavam
nem procuravam trabalho (inativos), 44,9% (5,3 milhões) estavam ocupados e
10,2% (1,2 milhão), desempregados. Em relação aos jovens que não frequentavam
escola (17,5 milhões), 65,1% trabalhavam (11,4 milhões), 22,2% não trabalhavam
e nem procuravam trabalho (3,9 milhões) e 10,3% estavam desempregados (1,8
milhão). Para os 29,3 milhões de jovens na faixa de 16 a 24 anos de idade, a
renda média familiar per capita era de R$ 512,70 ao mês em 2008.
Mas para os jovens
inativos que só estudavam, a renda média familiar per capita era de R$ 633,20
ao mês (23,5% superior à renda média). Já para os jovens inativos que não
estudavam, a renda média familiar per capita era de somente R$ 309,60 ao mês em
2008 (39,6% inferior à renda média). No caso dos jovens ocupados que estudavam
a renda média familiar per capita era de R$ 648,70 ao mês em 2008 (26,5%
superior à renda média). Os jovens ocupados que não estudavam registraram renda
média familiar per capita era de R$ 492,20 ao mês em 2008 (4% inferior à renda
média).
Por fim, entre os
jovens desempregados que estudavam a renda média familiar per capita era de R$
486,80 ao mês em 2008 (5,1% inferior à renda média), enquanto para os jovens
desempregados que não estudavam a renda média familiar per capita era de R$
320,20 ao mês em 2008 (37,6% inferior à renda média). Neste quadro, parece não
haver dúvidas que a trajetória educacional do segmento de 16 a 24 anos de idade
encontra-se diretamente vinculada ao nível de renda.
Quanto menor a renda
per capita familiar, maior a dificuldade de continuar ativo na educação. Não
obstante os avanços necessários em termos de universalização do acesso
educacional relativo ao ensino médio e superior, bem como a elevação da
qualidade do ensino, há o tema estruturante da desigualdade de renda. Sem
resolver isso, os discursos em favor da educação podem continuar sendo apenas
retórica, sem efetividade para a totalidade dos jovens brasileiros.
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