Leandro Fortes – Carta
Capital
A violência do CQC contra o deputado José Genoíno alcançou,
essa semana, um grau de bestialidade que não pode ser dimensionado à luz do
humorismo, muito menos no campo do jornalismo. Isso porque o programa apresentado
por Marcelo Tas, no comando de uma mesa onde se perfilam três patetas da
tristeza a estrebuchar moralismos infantis, não é uma coisa nem outra.
Não existem repórteres-mirins, como não existem
médicos-mirins, advogados-mirins e engenheiros-mirins.
Existem, sim, cretinos adultos
Não é um programa de humor, porque as risadas que
eventualmente desperta nos telespectadores não vem do conforto e da alegria da
alma, mas dos demônios que cada um esconde em si, do esgoto de bílis negra por
onde fluem preconceitos, ódios de classe e sentimentos incompatíveis com o
conceito de vida social compartilhada.
Não é jornalismo,
porque a missão do jornalista é decodificar o drama humano com nobreza e
respeito ao próximo. É da nobre missão do jornalismo equilibrar os fatos de tal
maneira que o cidadão comum possa interpretá-los por si só, sem a contaminação
perversa da demência alheia, no caso do CQC, manipulada a partir dos interesses
de quem vê na execração da política uma forma cínica de garantir audiência.
A utilização de uma criança para esse fim, com a aquiescência
do próprio pai, revela o grau de insanidade que esse expediente encerra. O que
se viu ali não foi apenas a atuação de um farsante travestido de jornalista a
fazer graça com a desgraça alheia, mas a perpetuação de um crime contra a
dignidade humana, um atentado aos direitos humanos que nos coloca, a todos,
reféns de um processo de degradação social liderado por idiotas com um
microfone na mão.
A inclusão de um
“repórter-mirim” é, talvez, o elemento mais emblemático dessa circunstância,
revelador do desrespeito ao ofício do jornalismo, embora seja um expediente
comum na imprensa brasileira. Por razões de nicho e de mercado, diversos
veículos de comunicação brasileiros têm lançado, ao longo do tempo, mão dessa
baboseira imprestável, como se fosse possível a uma criança ser repórter, ainda
que por brincadeira.
Jornalismo é uma profissão de uma vida toda, a começar da
formação acadêmica, a ser percorrida com dificuldade e perseverança. Dar um
microfone a uma criança, ou usá-la como instrumento pérfido de manipulação,
como fez o CQC com José Genoíno, não faz dela um repórter – e, provavelmente,
não irá ajudá-la a construir um bom caráter. É um crime e espero, sinceramente,
que alguma medida judicial seja tomada a respeito.
Não existem repórteres-mirins, como não existem
médicos-mirins, advogados-mirins e engenheiros-mirins.
Existem, sim, cretinos adultos.
E, a estes, dedico o meu desprezo e a minha repulsa, como
cidadão e como jornalista.
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