Autor: Luis Nassif
Para entender o jogo da chamada confraria da Selic.
Desde 1999, quando foi instituído o sistema das "metas
inflacionárias", criou-se a chamada "confraria da Selic", um
conjunto de economistas, incrustrados em consultorias e departamentos
econômicos de instituições financeiras, elaborando análises recorrentes sobre
os rumos da taxa de juros e apostando permanentemente na sua elevação.
Não se trata do mercado financeiro como um todo, mas de um
grupo que gira em torno das tesourarias de bancos e de grandes empresas. O
sistema bancário é mais que isso. Existem os grupos que trabalham em área de
crédito, do mercado de capitais, das operações estruturadas, que exigem um
conhecimento mais sofisticado.
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A introdução do sistema de metas inflacionárias consagrou um
tipo de análise que, alguns anos atrás, classifiquei genericamente como de
"cabeça de planilha". Eram planilhas matemáticas, definindo algumas
correlações mecânicas - muitas delas jamais comprovadas - entre taxas de juros
e inflação, câmbio e preço de commodities, taxa Selic e nível de atividade,
mudanças nos ativos internacionais e câmbio.
Enquanto a economia internacional e os mercados bombavam,
subindo sempre, parecia que as planilhas funcionavam. Era um mundo sem
sobressaltos, embora já inoculado pelo vírus que, a partir de 2008, explodiria
em grandes desequilíbrios.
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Nos centros mais sofisticados, a crise de 2008 sepultou esse
tipo da análise-padrão. Mesmo no Brasil, os financeiros das empresas passaram a
prescindir desse tipo de análise pretensamente sofisticada, por perceber sua
vulnerabilidade.
Com isso, gradativamente a análise da Selic tornou-se a peça
menos sofisticada e valorizada o mercado brasileiro.
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Hoje em dia, a Selic tem influência sobre uma parcela pequena
da estrutura de preços da economia – basicamente sobre o setor de bens de
consumo nã-duráveis alimentícios (controlado por gigantes como Gessy Lever,
Nestlé e outros). A remarcação aumenta quando há perspectiva de elevação da
taxa.
Em todos os demais setores – alimentos in natura, bebidas,
bens de consumo durável, aluguel etc – movimentos da Selic são completamente
irrelevantes.
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O problema da inflação está nas estratégias mal elaboradas do
Ministério da Fazenda.
Quando optou por políticas pro-ativas, a Fazenda teria que
obrigatoriamente armar-se dos instrumentos não-monetários de controle de altas
pontuais de preços – especialmente estoques reguladores de alimentos e ações de
convencimento sobre setores oligopolizados.
Em vez disso, limitou-se aos anúncios recorrentes de
desoneração tributária a cada notícia de pressão sobre os preços. Uma tolice!
Desonerações ajudam a recompor ou melhorar margens de empresas, jamais
induzi-las a reduzir preços.
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Ontem, o Diretor de Política Monetária do BC, Carlos Hamilton
de Araújo, insistiu que as taxas de juros são o melhor remédio contra a
inflação. E repetiu a imensa tolice de que superávits fiscais – em uma economia
que patina – são a melhor receita contra a alta de preços. Isso em uma economia
que ainda patina.
Ajudou a jogar gasolina nas expectativas do mercado.
O quadro atual é de inflação cedendo, especialmente com a
menor pressão sobre os preços internacionais de commodities. O desafio maior é
administrar os discursos desencontrados da área econômica.
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