Wellton Máximo - Repórter da Agência Brasil
Brasília – Enquanto a crise econômica internacional fez a
política social em diversos países regredir, o Brasil soube manter as melhorias
para as camadas mais pobres da população e, ao mesmo tempo, preservar a
estabilidade macroeconômica. A avaliação é da diretora do Banco Mundial (Bird)
para o Brasil, Deborah Wetzel. Ela reconhece que o país ainda tem muitos
desafios a superar, mas está mais avançado do que a maioria das nações
emergentes e da América Latina no combate à pobreza e na redistribuição de
renda.
No cargo desde abril do ano passado, Deborah Wetzel
administra um orçamento de US$ 3 bilhões por ano para o país, dos quais metade
está aplicada na Região Nordeste. Em entrevista à Agência Brasil, ela diz que
considera o Brasil um grande exportador de políticas de proteção social, de
segurança pública e de desenvolvimento sustentável. Em relação à sua gestão, a
diretora destaca que pretende dar continuidade à ampliação do foco de atuação
do Banco Mundial.
Em vez de se concentrar no financiamento a empreendimentos de
infraestrutura, a instituição, nos últimos anos, tem passado cada vez mais a
apoiar projetos sociais vinculados a metas e à gestão de resultados. A
capacitação de gestores públicos, o atendimento a usuários de drogas, o aumento
da produtividade agrícola e o combate à violência contra a mulher estão entre
os projetos atualmente financiados no Brasil. Algumas dessas ações serão
mostradas ao presidente do Bird, Jim Yong Kim, que chega amanhã (4) ao Brasil
para uma visita de três dias.
Leia abaixo a
entrevista com Deborah Wetzel:
Agência Brasil – Como a senhora definiria sua gestão? Quais
são os principais projetos financiados atualmente pelo Banco Mundial no Brasil?
Deborah Wetzel – Nosso programa está alinhado com as metas e
o objetivo do governo na redução da pobreza e da desigualdade. Temos US$ 3
bilhões de empréstimos por ano no Brasil, dos quais 80% estão investidos em
parcerias com estados. O acesso à educação e à saúde, a inclusão social de
mulheres e pobres, a mobilidade urbana e o apoio aos programas Luz para Todos e
Brasil sem Miséria são alguns dos principais projetos financiados hoje. Ainda
existem ações tradicionais, ligadas a investimentos em infraestrutura, mas o
banco tem financiado, cada vez mais, projetos vinculados a resultados, em que
as parcelas dos empréstimos são liberadas à medida que as metas sejam
alcançadas.
ABr – Como o banco define os projetos a serem financiados?
Que avanços já podem ser sentidos?
Deborah Wetzel – Olhamos as necessidades do Brasil e
definimos onde aplicar os recursos. Proteção social, educação, saúde e combate
aos efeitos das mudanças climáticas atualmente são nossas prioridades. Os
avanços do Brasil são impressionantes. Desde 2010, o país cumpriu a Meta do
Milênio [conjunto de ações propostas pelas Nações Unidas para serem alcançadas
até 2015] referente à redução da pobreza. O Brasil está mais avançado do que a
maioria da América Latina e dos países emergentes na distribuição de renda e
nas políticas sociais.
O Brasil é um grande exportador de ideias. Experiências como
o Bolsa Família, as UPPs [unidades de Polícia Pacificadora], o desenvolvimento
sustentável em comunidades extrativistas e a melhoria da produtividade agrícola
despertaram o interesse do mundo e dão voz ao país nas conferências
internacionais. Enquanto muitos países regrediram [nas políticas sociais] com a
crise econômica mundial, o Brasil manteve as conquistas sociais, ao mesmo tempo
em que conseguiu preservar a estabilidade macroeconômica. Para crescer, é
preciso tanto inclusão social como estabilidade. O Brasil está conciliando as
duas coisas. Sem contar que o Brasil está conseguindo crescer cuidando do meio
ambiente. O desmatamento está no nível mais baixo das últimas décadas.
ABr – Apesar dos avanços na distribuição de renda, o país
ainda deixa a desejar na qualidade da educação, da saúde pública e está longe
de fornecer saneamento para toda a população. O que precisa ser feito para
progredir nessas áreas?
Deborah Wetzel – De fato, o Brasil ainda tem muito a avançar
nessas áreas, mas os avanços podem ser observados. Em relação à educação, o
país fornece acesso à escola para praticamente todas as crianças. Claro que a
qualidade do ensino precisa ser trabalhada, mas o número de crianças em escolas
integrais está aumentando, e as notas no Pisa [Programa Internacional de
Avaliação de Alunos] e no Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica]
estão melhorando a cada ano.
Em relação à saúde, os investimentos nas UPAs [unidades de
Pronto-Atendimento] e no Programa Saúde da Família [de atendimento domiciliar]
estão tendo resultados bem impressionantes e desafogando os hospitais. O Banco
Mundial está trabalhando para melhorar o acesso aos medicamentos e ao
treinamento de profissionais. No saneamento, realmente o Brasil está mais
atrasado, mas os investimentos estão sendo feitos, e o país progride aos
poucos. Financiamos muitos projetos nessa área no Norte e no Nordeste. Aliás, o
Nordeste concentra 50% dos recursos investidos pelo banco hoje no país.
ABr – Uma das críticas ao Bolsa Família é que o programa não
fornece uma porta de saída. Boa parte dos beneficiários não consegue se inserir
no mercado de trabalho e, segundo os críticos, passa a depender eternamente do
governo. Como superar esse ciclo?
Deborah Wetzel – Esse tipo de questionamento é normal neste
momento do programa, que completa dez anos. Ao mesmo tempo em que o governo
fornece proteção social, precisa incluir essas pessoas na produção. Só que os
críticos esquecem que os resultados levam muito tempo para aparecer. É um
trabalho de gerações, até porque envolve mudança de comportamento e melhoria na
qualificação profissional. Os filhos dos beneficiários vão à escola integral
três vezes mais hoje do que antes do Bolsa Família e estarão muito mais
preparados para entrar no mercado de trabalho.
Mesmo assim, o Brasil sem Miséria tem componentes para dar
esse tipo de oportunidade para a geração atual, como programas de microcrédito.
Sem falar que o Bolsa Família eleva o consumo e os investimentos nas áreas mais
pobres. O programa tem retornos crescentes no longo prazo, mas os resultados no
curto prazo também são expressivos.
ABr – Outro problema social que explodiu nos últimos anos foi
o consumo de drogas nos centros urbanos. O Banco Mundial também está atento a
essa questão?
Deborah Wetzel – Apoiamos projetos de ajuda a viciados em
três cidades: no Rio de Janeiro, em São Paulo e no Recife. Os projetos oferecem
atendimento médico, psicológico e, no caso do Recife, encaminham os pacientes
para casas de apoio. Essa é uma das áreas novas de atuação do Banco Mundial. As
drogas são um exemplo de como os problemas sociais são ligados e exigem
respostas transversais. Precisamos trabalhar dos dois lados, dando tratamento e
oportunidade econômica.
ABr – O que a senhora espera da visita do presidente do Banco
Mundial ao Brasil?
Deborah Wetzel – Quero mostrar os sucessos das ações
brasileiras de combate à pobreza e de enfrentamento aos mais diversos problemas
sociais. O Brasil é um país descentralizado, com experiências de gestão que
envolvem vários setores do governo e da sociedade. O Banco Mundial fez muito
com o Brasil, mas também aprendeu muito com o país.
Edição: Juliana Andrade
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