O maior ideólogo e articulista do Financial Times, porta-voz
do mercado financeiro, escreveu um longo artigo indicando as sete lições para
corrigir o capitalismo, que ele considera a "ideia mais brilhante da
humanidade": em síntese, corrigir as práticas irregulares, fazer os ricos
pagarem os impostos, distribuir a tributação não para os perdedores, faz
questão de registrar, mas para os "filhos dos perdedores". E termina
com um apelo: "esforcemo-nos para torná-lo melhor". Quem sabe com um
pouquinho maior de esforço, não acabamos logo de enterrá-lo. O artigo é de
Najar Tubino.
Najar Tubino (*)
Essa é uma viagem sobre as conversas, debates, fóruns que
ocorreram no início do ano trágico de 5126, o último ano do calendário maia.
Quando dois outros calendários de povos antigos - chineses e judeus - apontam
para uma coincidência histórica, o número 3. O ano do dragão 4710, na soma dos
números indica 12. O ano de 5772, dos judeus, a soma é 21. Os dois resultam em
3, o número da superfície, como definiu Pitágoras de Samos ( cerca de
580/78-497/6 AC), o homem que traduziu o funcionamento do planeta em números.
Será o ano em que o capitalismo vai tremer nas bases?
Aliás, só não começou, porque o Banco Central Europeu deu um
presente de Natal aos 523 bancos do velho continente, a 1% de juros ao ano, com
três de prazo para pagamento. A dose foi reforçada no apagar das luzes de
fevereiro com mais 530 bilhões de euros, nas mesmas condições. Uma medida com
objetivo de evitar uma quebradeira maior que a do Lehman Brothers, em 2008.
Portanto, essa é a viagem na era de impostura, da falsidade,
das falsas devoções, a era da hipocrisia, a nossa própria era capitalista.
O "Super Mário", como os articulistas do mercado
financeiro apelidaram o italiano Mário Draghi, presidente do Banco Central
Europeu, nos anos 2002-2005 ocupou uma diretoria do Goldman Sachs. Foi ele o
responsável pela muralha de dinheiro, que impediu a falência do sistema
bancário europeu. O Goldman, por sua vez, está em recessão teve que cortar o
salário do chefe, LLoyd Blankfein pela metade - U$S 7 milhões.
Enquanto isso, no mundo emergente, o Brasil começa a
preparação da Rio +20, conferência da ONU, pretende reunir 50 mil pessoas e 150
chefes de estado, na visão dos diplomatas que coordenam a organização. O
orçamento do evento foi aprovado pelo Congresso Nacional no final de 2011: são
R$ 430 milhões, sendo R$ 230 milhões para segurança, 190 milhões para
logística, 30 milhões para aluguel de espaços, como o Riocentro. onde se
concentrarão as discussões. Na cidade do Rock, as estandes das empresas
sustentáveis - bancos, mineradoras, petrolíferas, montadoras, varejistas. No
aterro do Flamengo, o "Território do Futuro", onde os representantes
da sociedade civil encaminharão suas propostas.
PASSARAM 40 ANOS, O
FUTURO VIROU PRESENTE
"Uma Terra Só", foi o lema da primeira conferência
da ONU, em Estocolmo, na Suécia, em 1972. Resumia a preocupação com o futuro do
planeta e as alternativas para resolver a situação. No mesmo ano, um grupo de
empresários, cientistas e técnicos, lançavam os "Limites do
Crescimento", pelo Clube de Roma, anunciando o desastre se os métodos de
crescimento econômico não mudassem em 100 anos. Como todo documento europeu,
tinha uma preocupação com o crescimento da população, diga-se, dos pobres, e da
possibilidade de não haver matéria-prima suficiente para todos.
"Nosso Futuro Comum", foi um outro documento da
ONU, liderado por uma dirigente da Dinamarca, na Comissão Bruntland. Em 1997,
na Rio +5, quando as entidades da sociedade civil colocaram um
"mentirômetro" na porta do hotel no Rio, onde o evento acontecia, o
lema tratava do "futuro que queremos". Um novo mundo de paz,
crescimento justo, fim da miséria, uso de energia limpa, uma economia de baixo
carbono.
Em 2011, a ONU anunciou que dos 24 serviços ambientais que
recebemos gratuitamente do planeta, 60% estão degradados. O Programa do Meio
Ambiente da ONU (PNUMA), anunciou que precisamos de U$S 1,3 trilhão, para
promover a economia de baixo carbono em 10 setores chaves, como indústria,
transporte, energia e agricultura.
AMNÉSIA À BEIRA MAR
Aproveitei a onda de calor de Porto Alegre, conhecida
atualmente por Forno Alegre, a maior seca em 60 anos, mais a onda de frio na
Europa do leste, e repassei os documentos aprovados e anunciados com suas metas
estabelecidas, nos últimos anos. Principalmente, na Eco-92, considerada a maior
conferência do gênero, e reuniu 120 chefes de estado, 4 mil ONGs e 15 mil
pessoas, no mesmo Rio de Janeiro. Os burocratas que organizam anualmente esses
eventos têm uma preferência clara por cidades à beira mar, como Cáncun, onde
realizaram a conferência climática de 2010, ou Durban, na África do Sul, no ano
passado. Evento que enterrou o Protocolo de Kyoto, desde o anúncio da negativa
de participação da Rússia, Canadá e Japão, na próxima etapa.
Kyoto foi aprovado no Japão com a presença de 170 chefes de
estado, em 1997. Só entrou em vigor em 2005, quando a Rússia resolveu aderir,
dando assim a percentagem final - mais de 50% das emissões de gases estufa -,
necessária à implantação. Porém, a amnésia é um dos ingredientes nos eventos
dessa natureza.
AGENDA 21: 800 PÁGINAS,
40 CAPÍTULOS
Eu não li as 800 páginas de documentos aprovados na Eco 92,
na chamada Agenda 21, com quatro seções e 40 capítulos. ´Li um resumo de 160
páginas do professor José Carlos Barbieri, da Escola de Administração, da
Fundação Getúlio Vargas. O documento foi chamado de "Guia da
Humanidade". E realmente era. A primeira seção abordava as dimensões sociais
do desenvolvimento sustentável, a cooperação internacional, padrão de consumo,
população, saúde. Tem sete capítulos. A seção II tem 14 capítulos, envolve as
dimensões ambientais, a atmosfera, os oceanos, os ecossistemas frágeis, a
biodiversidade. A seção III engloba os grupos sociais envolvidos, mulheres,
jovens, índios, trabalhadores, empresários, ONGs. E a seção IV refere-se aos
meios para implantar os programas e as atividades recomendadas nas seções
anteriores, incluindo recursos financeiros, transferência de tecnologia,
educação.
Diz o professor
Barbieri:
- Cada capítulo apresenta, via de regra, uma introdução ao
problema e as áreas de programas de ação com objetivos, atividades e meios de
implementação, com as estimativas de recursos financeiros necessários".
Os países ricos, que ainda são os mesmos, se comprometeram a
doar 0,7% do PIB, na época o volume da economia mundial estava em torno de U$S
16 trilhões, o que dava uma verba de U$S 112 bilhões ao ano. Mas as estimativas
da Agenda 21 apontavam que seriam necessários em torno de U$S607 bilhões por
ano, durante o período 1993-2000, na implantação da atividades recomendadas, em
vários de seus capítulos.
REINVENTAR A
CIVILIZAÇÃO INDUSTRIAL - EM 1997
Mais uma citação do professor Barbieri:
- Muito do que foi tratado na Agenda 21 e em outros
documentos aprovados na CNUMAD ( a conferência de desenvolvimento sustentável)
não saiu do papel. Muitos chefes de governo apoiaram propostas e acordos
internacionais contrários as suas convicções e compromissos partidários, face
às pressões exercidas pela exposição dos temas na mídia internacional e a
vigilância ruidosa de muitas ONGs, mas pouco fizeram para ratificá-los e
implantá-los em seus países".
Maurice Strong, ex-dirigente do Banco Mundial, foi o
presidente do Conselho da Terra, em 1997:
- Precisamos reinventar a civilização industrial, anunciava
ao público, que produziu riscos para a sobrevivência da espécie humana... a
mais bem sucedida, mas sem controle. Nosso futuro está em nossas mãos, podemos
gerar uma era de boas notícias para a família humana".
Mikail Gorbachev, um líder ainda respeitado dizia: " a
civilização chegou ao seu fim, exauriu suas possibilidades. Temos que chegar a
um consenso sobre novos valores".
Ainda em 1992, 140 ganhadores do Prêmio Nobel, lançaram um
documento onde afirmavam:
- Com as tecnologias atuais em 30, 40 anos acontecerão
mudanças irreversíveis na biosfera. Até 2015, no ritmo atual, podem desaparecer
entre 1 e 11% das espécies nas florestas tropicais, com taxas de desmatamento
acima de 15 milhões de hectares ano, ou 150 mil km2".
Na Amazônia se desmatou mais de 20 mil km2 por ano, nesta
época. As espécies sumiram, e grande parte das florestas também. Vieram os anos
do neoliberalismo, da globalização do sistema financeiro, das privatizações do
mundo em desenvolvimento, a era Bush, duas invasões de países, com mais de U$S
2 trilhões em gastos na guerra ao terror. A economia gera U$S 45 trilhões de
riquezas, 1 bilhão de pessoas passam fome, dois bilhões não tem água, dois
terços dos americanos estão acima do peso.
INDÚSTRIA DE EMBALAGEM
FATURA U$S 739 BILHÕES
Mais de um bilhão de carros, com cinco novas montadoras se
instalando no Brasil, o quarto mercado mundial de veículos. Os EUA comemoram o
renascimento das montadoras nativas (GM e Chrysler, sob comando da Fiat). Em
2012, a meta é vender 13,9 milhões de carros, quando vendiam 17 milhões em
2007. Não vão alcançar a China, com seus 18 milhões. Qual será a meta da
indústria mundial de veículos: 2 bilhões de carros. Quem sabe 3 bilhões? Como será
São Paulo com 12 milhões de carros, o dobro da frota atual?
Vejamos as estratégias
definidas pela Agenda 21:
- Estimular o uso mais eficiente de energia e recursos,
reduzir os resíduos ao mínimo, estimulando a reciclagem, redução do desperdício
na embalagem de produtos e a introdução de novos produtos ambientalmente
saudáveis. Estabelecer políticas de preços que incorporem os custos ambientais.
Reforço aos valores que apoiam o consumo responsável, através da educação, de
programas de esclarecimento público, publicidade de produtos ambientalmente
saudáveis".
A indústria de embalagens no planeta vai faturar U$S 739
bilhões até 2014, 60% com embalagens para consumo, uma parte, em embalagens de
papel, onde o consumo cresce mais, junto com papel higiênico. A Stora Enso, com
85 fábricas no mundo, no Brasil participa da Veracel, na Bahia, está
transferindo sua sede mundial, na área de negócio de Biomateriais, para um
escritório no Itaim Bibi, capital paulista.
No volume de U$S 447 bilhões de dólares gastos em publicidade
no mundo, talvez, uma mínima percentagem seja destinada aos produtos
"saudáveis".
UM NOVO CHAMARIZ
Hipocrisia ainda é um termo muito polido e educado como
retrato das condições atuais do planeta. Por exemplo: o PNUMA, com sede em
Nairóbi, no Quênia, responsável pelos programas de meio ambiente da ONU, tem um
orçamento em torno de U$S 100 milhões, e 80 países, dos 193 da entidade,
participam. As verbas são doadas por contribuições do Japão e do Reino Unido.
Não tem o poder da Organização Mundial de Saúde para definir leis e
regulamentações sobre qualquer assunto ligado a sua área. Então, qual a nova
ideia para atrair os chefes de estado ao Rio de Janeiro: a criação da agência
internacional do meio ambiente. Ideia que nem o Brasil, o anfitrião, concorda.
Mas dá, vamos dizer, um novo chamariz ao evento.
O tema da Rio+20 é "desenvolvimento sustentável no
contexto da erradicação da pobreza". O debate, entre os diplomatas
brasileiros, e europeus, principalmente, é sobre a orientação das discussões.
Mais para o lado ambiental, como querem os europeus, ou para a "economia
verde", como defendem os brasileiros. Muitos debates estão acontecendo
pelo país.
Entidade como a Confederação Nacional da Indústria, a
Confederação Nacional da Agricultura, o Instituto Ethos, onde participam
grandes empresas, a Associação Brasileira de Agronegócio. Esta última realizou
um debate no Mackwsoud Plaza, em São Paulo com o título "Despertar para a
Rio +20", onde o ex-ministro da Agricultura, além de agricultor e dirigente
da Fiesp, Roberto Rodrigues, opinou que "tem muito medo dessas reuniões
gigantes se transformarem em uma imensa masturbação intelectual". O
presidente da Abag, Luiz Carlos Carvalho disse que o tema do encontro não é o
meio ambiente, mas a sustentabilidade.
CRÉDITO PARA RESERVA
LEGAL COM EUCALIPTO
Já a presidente da Associação Nacional da Indústria de Papel
e Celulose, Elizabeth Carvalhães, defendeu a recuperação das áreas degradadas e
a concessão de crédito para os produtores, além de um código florestal moderno.
Reserva legal para eles é plantio de eucalipto, é a monocultura industrial, que
insistem em chamar de floresta. Tem mais: ainda pretendem colocar as
"florestas" como sumidouro de carbono, porque sugam 1 bilhão de
toneladas de CO2. Se fosse descrever o esquema industrial com seus aditivos
químicos, o principal deles o cloro, usado no branqueamento da celulose e do
papel, com seus derivados como a dioxina, ia faltar espaço.
O Instituto Ethos definiu nove diretrizes e três metas para a
Rio+20: economia verde, redução das desigualdades e combate à corrupção. As
diretrizes são todas cópias da Agenda 21. Aliás, esta é a questão, Talvez fosse
muito mais sustentável distribuir aos participantes uma cópia das 800 páginas,
já definidas e não implantadas, 20 anos atrás.
PROGRAMADOS PARA
QUEBRAR
Mas a vida segue. E a economia também. O capitalismo reinante
ainda é o da obsolescência programada, conforme o caderno especial do jornal
Valor Econômico, publicado no final de janeiro. Obsoleto, que está em desuso,
saiu da moda, ou como deve ser aplicado o termo atualmente- programado para
quebrar. É assim que funciona a indústria do século XXI. O período para troca
de geladeira e lavadora de roupas era de 10 anos. Agora é de 5,6 anos.
Em 2009, foram lançados 163 modelos de televisores de tela
plana. Em 2011, foram 256. A oferta dos tipos de celulares: de 116 para 175. De
computadores de mesa - de 476 para 835. Em 2005, a LG tinha quatro modelos de
fornos de micro-ondas, hoje, são 120. A outra coreana, a Samsung tinha 10 passou
para 200. A explicação da indústria é a seguinte: a taxa da obsolescência
encurta à medida que a inovação tecnológica acelerou e o processo de produção
ficou mais barato.
O cálculo da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza
Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) é que o lixo cresce a um ritmo maior do
que a população, 6,9% em 2010. No Brasil a produção de lixo alcança 60 milhões
de toneladas ano, sendo 60% destinado a aterros sanitários e 40% aos lixões.
50 BILHÕES DE APARELHOS
CONECTADOS
A quebra programada de produtos foi uma estratégia da
indústria lançada após a segunda guerra mundial. Faltavam consumidores, então,
o negócio era fazer os mesmos, comprarem novamente, novos produtos. Vamos dar
uma reforçada com os números dos produtos eletrônicos adorados pelos modernos
consumidores das metrópoles, das cidades pequenas, vilarejos. Em 2012, serão
vendidos 103 milhões de tablets, a última maravilha da era digital. As vendas
de pcs, computadores de mesa, deverá crescer 4,5%, para cerca de 370 milhões de
unidades. E a Intel lançou na feira de Las Vegas, a maior de eletrônicos, o
ultrabook (registrou o nome), para concorrer com smartphone e tablet - é um
laptop mais fino, mais rápido, mais sensual, mais...
Serão vendidos, segundo a empresa de pesquisa Gartner INC.,
657 milhões de smartphones em 2012. Já existem 800 milhões ativos. Computadores
são 1,5 bilhão e logo chegaremos aos 2 bilhões. Segundo a multinacional de
equipamento Ericsson, existem 7 bilhões de dispositivos conectados no mundo,
isso inclui, telefones, computadores, eletrodomésticos, carros lâmpadas,
sapato, vou sugerir - vaso sanitário -. Em 2020, serão 50 bilhões.
- A seu modo, informa a empresa, cada um desses itens
precisará de componentes que permitam a eles se conectarem a redes, exibir informações
ou até mesmo processar alguns dados".
BLACKBERRY VIROU
CRACKBERRY
A Intel domina 80% de chips para computadores no mundo, e
teve receita de U$S 43 bilhões, em 2010. O aparelho da Rim, empresa canadense,
conhecido por Blackberry ganhou um apelido no mercado de executivos, logo ele,
que era o brinquedinho favorito dos executivos abonados:
"crackberry". Recentemente a Volkswagen, que pretende ultrapassar a
Toyota na produção de carros no mercado global, produzindo mais de 8 milhões de
unidades, lançou um comunicado, depois de acordo com os sindicatos, onde os
funcionários só podem receber telefonemas de trabalho ou email, 30 minutos
antes e após o expediente. O presidente executivo da Volks, Martin Winterkorn
parabenizou os trabalhadores ao completarem 38 turnos extras e por terem
produzido 50 mil veículos adicionais, no final de 2011.
Emergentes aquecidos representam 67% do crescimento da
economia mundial, segundo o Goldman Sachs, e somarão 59% de todo o PIB global
em 2030. Seus cidadãos botaram o pé na estrada, entupiram aeroportos e baixaram
em Nova York com toda a força; a cidade recebeu 50 milhões de turistas, 655 mil
brasileiros, que só estão atrás de ingleses e franceses, em gastos.
Os brasileiros vão às compras no exterior, gastaram U$S 21
bilhões, enquanto os estrangeiros não gastaram 7 bilhões nas belezas
tupiniquins. Contando o juro das prestações e dos cartões de crédito gastos
internamente, a montanha cresce muito. Segundo o professor Yoshiaki Nakano, da
Escola de Economia de SP, da Fundação Getúlio Vargas, os brasileiros pagam por
ano R$130 bilhões em juros. O cara compra um veículo, paga dois, uma máquina de
lavar, também, uma televisão de tela plana, também.
UMA FALHA TÃO GRAVE NO
MERCADO
É por isso, que dois economistas de mercado, fãs de
carteirinha, como assinalou Eduardo Giannetti da Fonseca, professor do Insper,
e André Lara Resende, um dos criadores do Real, abriram o verbo. Primeiro
Giannetti, em entrevista ao Valor:
- Eu, que sou fã da economia de preços e de mercado, hoje,
percebo que ela padece de uma cegueira absurda, que é o modelo como usamos os
recursos ambientais. O sistema de preços é completamente omisso em relação ao
custo ambiental de nossas escolhas de produção e consumo. Não sinaliza a
gravidade de que estamos fazendo com, o espaço biológico de que nossa vida
depende".
Outro trecho:
- O sistema de preços vai ter de mudar. Ele padece de uma
falha tão ou mais grave no longo prazo do que o planejamento central. Nunca
imaginei que diria isso na vida. É muito sério e está em tudo. Nunca se
imaginou que o sistema de preços e a economia competitiva de mercado, capaz de
gerar riqueza, tivesse uma falha tão grave".
Giannetti cita um exemplo sobre o aparelho de ar-condicionado
nos Estados Unidos. Em 1960, 80% dos condomínios não tinham ar condicionado, o
equipamento era caro e o custo de energia elevado. Hoje, 84% dos condomínios
têm o aparelho. Entre 1993-2005 a eficiência energética do ar-condicionado
aumentou 20%, enquanto o consumo médio por aparelho aumentou 35%. Ficou tão barato
que os donos deixam o aparelho ligado.
- A China, entre 1997 e 2007, triplicou o número de
aparelhos. Vai crescer 10 vezes o uso de ar-condicionado entre 2005-2030. Com o
compressor cada vez mais barato e a eficiência maior, o consumo de energia vai
aumentar. Essa conta não fecha. Tecnologia não é a resposta".
ECONOMIA MUNDIAL SERÁ
OBRIGADA A PARAR DE CRESCER
No final de 2011 a China fechou uma outra conta: 690 milhões
de cidadãos do país estão morando em cidades, contra 656 milhões continuam no
campo. Em 1979, 81% dos chineses moravam na zona rural. No mundo, dos 7
bilhões, 51% moram na zona urbana.
André Lara Resende escreveu um longo artigo para o Valor - Os
novos limites do possível - , onde trata do mesmo tema, um pouco mais
profundamente. Citando o ex-ativista do Greenpeace, agora professor de
sustentabilidade da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, Paul Gilding,
lançou recentemente um livro sobre o destino do modelo econômico atual.
Lara Resende destacou a
tese do professor inglês:
- A economia mundial será obrigada a parar de crescer. Como
não houve uma transição antecipada, como não nos preparamos para uma economia
estacionária, seremos obrigados a enfrentar uma parada brusca, profundamente
traumática. O momento da tomada de consciência do fim do crescimento e da
necessidade de uma profunda reorganização da economia não está longe. Questão
de, no máximo, mais uma década. Diante da falha do sistema de preços e da
incapacidade de tomarmos medidas preventivas, chegamos ao limite sistêmico. As
múltiplas dimensões desse limite estão todas interligadas. Ao romper-se uma
delas o processo se acelera e aumenta a probabilidade de que outros também
venham a ser rompidos".
Para completar o
raciocínio, segue Lara Resende:
- Atingimos o limite físico do planeta. Para evitar uma
catástrofe de grandes proporções seremos obrigados a tomar medidas de
emergência, extremamente duras, com o estabelecimento de cotas. Seremos
obrigados a reconhecer o que, apesar das evidências, nos recusamos a ver: não
há como viabilizar 7 bilhões de pessoas, com o padrão de consumo e as
aspirações do mundo contemporâneo, nos limites físicos da Terra. O crescimento
baseado na expansão do consumo de bens materiais está no seu capítulo final. A
eventual parada súbita da economia chinesa seria a pá de cal na esperança de
uma saída harmoniosa, para o impasse em que a economia mundial se
encontra".
Resumindo: o crescimento pode não ser mais a opção de saída
para a crise. Lara Resende ainda alerta que não está se discutindo nem uma
abordagem nova sobre o tema: "o mecanismo psicológico de autoengano, da
negação dos fatos, segue inabalável".
LIVRAR O CAPITALISMO DO
LADO SOMBRIO
Não se pode chamar nem Gannetti nem Resende, já trabalhou
como banqueiro, de ecologistas ou ambientalistas. É por estas e outras, que o
debate sobre o rumo do capitalismo entrou em vários fóruns. Em Davos, a elite
econômica chegou pessimista, mas se animou com os 489 bilhões de euros do BCE,
"uma inundação de liquidez", como comentaram.
O executivo chefe da empresa de consumo Unilevar, concorrente
da P&G, com faturamento de 46 bilhões de euros, Paul Polman, disse que o
capitalismo e o livre mercado devem ser mais sensíveis a questões sociais:
"é inaceitável que 200 milhões de pessoas estejam desempregadas". A
Revista Time e a BBC, de Londres, animaram acirrados debates sobre a fórmula de
"corrigir o capitalismo".
David Rubenstein, um dos fundadores do Carlyle Goup, um dos
maiores administradores de fundos do planeta, que embolsou 400 milhões de
dólares em salários e bônus, junto com dois de seus sócios no final do ano
passado, estava preocupado:
- O capitalismo é o melhor sistema para o mundo, é preciso
melhorar as leis e regulamentações para que o sistema seja justo. Temos que
investir em inovação e educação.".
Angel Gurria, secretário geral da OCDE, organização que reúne
os países ricos, disse que "precisamos livrar o capitalismo do seu lado
mais sombrio". Qual deles? Na Europa o índice de desemprego da Espanha é
de 22,9%, sendo que as pessoas com até 25 anos 48,7% estão desempregadas. Na
Grécia o índice é de 19,2%, na Irlanda de 14,5%. Enfim, a média europeia é de
10,4%.
NOVO CAPITALISMO:
CONECTADO E TRANSGÊNICO
José Manuel Barroso, presidente da Comissão Europeia,
declarou: "não podemos aceitar que 25% dos jovens da Europa estejam
desempregados".
Mas o melhor da festa em Davos, o requintado retiro dos
abastados nos Alpes suíços, estava destinado aos representantes
norte-americanos. A deputada democrata Nita Lowey, de N. York foi incisiva:
- Os Estados Unidos estão determinados a manter sua força
militar e ser o poder predominante no século XXI". E o republicano
(senador) Bob Corker completou:
- Os americanos não estão psicologicamente preparados para
ter um papel secundário nos assuntos globais".
Como o dono da bola num jogo de futebol, americanos e
europeus estão dizendo o seguinte - a bola é minha, só eu ganho. Sem
concorrência. Senão, acaba o jogo. No caso do maior aparato militar do planeta,
isso pode ter um significado tenebroso.
Chegamos ao novo capitalismo. Depois da quebradeira ou das
explosões dos ricos. Como funcionará o novo sistema? Conectado, logicamente. E
também transgênico, conforme a previsão da indústria química, que também é a
dona das empresas de sementes. Elas plantam 160 milhões de hectares, 30 milhões
no Brasil, que é o país que mais investe em transgênicos do mundo em
desenvolvimento, onde os índices não param de crescer. A indústria já tem quase
40% do mercado de sementes, que gira U$S 37 bilhões - o dado de 2011 é 13
bilhões. Ela vende uma semente transgênica e um veneno definido, só a planta é
imune.
MARK, DO FACEBOOK: A
MINHA AÇÃO VALE 10
Vai ser conectado porque são as empresas que mais crescem. O
lucro da Apple foi de U$S 25 bilhões, no ano passado. A Google tem U$S 40
bilhões em caixa. O Facebook, do jovem Mark Zuckerberg vai lançar ações na
bolsa e pretende captar U$S 5 bilhões. A empresa faturou 3,7 bilhões de
dólares, mas a especulação diz que vale U$S 100 bilhões. O Goldman Sachs, na
dúvida, investiu U$S 1 bilhão antes de começar a corrida. O mesmo fez o
príncipe Alwaleed Bin Talal, saudita, sobrinho do rei Abdulah, investiu U$S 300
milhões no Twitter. Zuckerberg, como novo capitalista, frugal, de jeans,
camiseta e tênis, continua com práticas antigas, usada pelo usineiro Rubens
Ometto, quando registrou a Cosan Limited, nas Ilhas Bermudas: as ações dele
valiam 10 vezes mais do que as vendidas em bolsa. Dessa forma, com 10% do
capital ele tinha o controle da empresa. Não é que o rapaz fez a mesma coisa. E
ainda vai ser o presidente executivo e do conselho de administração, medida que
não passaria nas regras do novo mercado da Bovespa. A diferença com Ometto é o
tamanho do salário - o usineiro ganha R$ 13 milhões como presidente do conselho
da Raízes (Cosan mais Schell), e Zuckerberg apenas U$S 1,49 milhão por ano.
Se os preços forem internalizados, ou seja, cobrados os
custos reais, envolvendo poluição, destruição de ecossistemas, tratamento dos
empregados ou colaboradores, como queiram, a Apple vai fechar as portas. Numa
pesquisa interna recente, constatou que 62% dos fornecedores tem algum tipo de
prática ilegal, principalmente no quesito relações com trabalhadores.
NA ERA DIGITAL,
ESCRAVOS MONTAM APARELHOS
Não é por menos. Quase 50% do mercado de produtos eletrônicos
terceirizados, inclui, iphone, ipad, Xbox360, da Microsoft, e outros tipos de
consoles de jogos são fabricados pela Foxconn, de Taiwan. A empresa é
controlada por Terry Gou, de 61 anos, recém casado pela segunda vez, com uma
bailarina 20 anos mais moça. Em agosto do ano passado, Gou deu uma festa no
maior complexo industrial da corporação em Shenzen, na China. Se misturou a
multidão de trabalhadores que dançavam "break", dança de rua
americana. Depois anunciou que no futuro suas fábricas terão um milhão de robôs
nas linhas de montagem.
A Foxconn tem um milhão de empregados, alguns se suicidaram
em 2011 (l4 ou l8, conforme a fonte). Ele mandou instalar redes de arame para
cercar os edifícios-dormitórios, onde até 300 mil pessoas vivem.
Um trabalhador da Foxconn, que faturou U$S 80 bilhões em
2011, trabalha 12 horas por dia de segunda à sábado, e ganha pouco mais de 200
dólares por mês - antes dos suicídios eram 1.190. Sem a mão de obra escrava da
China o capitalismo acaba no outro dia.
O maior ideólogo e articulista do Financial Times, porta-voz
do mercado financeiro, também entrou na defesa do capitalismo. Escreve um longo
artigo indicando as sete lições para corrigir o capitalismo, que ele considera
a ideia mais brilhante da humanidade: em síntese, corrigir as práticas
irregulares, fazer os ricos pagarem os impostos, distribuir a tributação não
para os perdedores, faz questão de registrar, mas para os filhos dos perdedores
- o problema já é genético. E termina com um apelo: "esforcemo-nos para
torná-lo melhor". Quem sabe com um pouquinho maior de esforço, não
acabamos logo de enterrá-lo. Esqueci de acrescentar a data, completa dos maias
: 21 de 12 de 2012, na soma 11. Número da ruptura ou o início de novos tempos.
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